O Globo
Isso explica a mortandade indiscriminada das
seis primeiras semanas da guerra: mais de 15 mil palestinos mortos, quase
metade do total de 33 mil vítimas computadas até agora
Até pouco tempo atrás o jornalismo
independente da revista on-line +972, com sede em Tel Aviv, era pouco conhecido
fora das fronteiras do Oriente Médio. Publicada em língua inglesa desde sua
fundação, em 2010, ela tem direção e corpo editorial composto de israelenses e
palestinos. Seu nome esdrúxulo deriva do código de telefonia usado tanto para
Israel como para a Cisjordânia ocupada. No espectro ideológico que estraçalha a
profissão, a +972 pode ser definida como francamente de esquerda. É
respeitadíssima junto a entidades internacionais de jornalismo investigativo e
inversamente incômoda para o governo de extrema direita de Benjamin Netanyahu.
Sobretudo em tempos de guerra.
Em novembro último, quando a +972 publicou um inquietante relato sobre o afrouxamento das normas militares que permitiam o bombardeio de alvos não militares por parte das Forças de Defesa de Israel (FDI), houve pouco alvoroço mundial. Uma lástima, pois a investigação, assinada pelo veterano Yuval Abraham, se baseava no depoimento inédito sob sigilo de sete integrantes da ativa e da reserva dos serviços de inteligência israelenses — todos com atuação direta na campanha contra Gaza.
Agora, nos primeiros dias de abril, Abraham e
a +972 voltaram à carga, em conjunto com o site em hebraico Sichá Mekomit
(Chamada Local). Sempre alicerçado no testemunho de oficiais das FDI, a
investigação detalha o funcionamento de dois sistemas de inteligência
artificial usados na retaliação militar ao traumático ataque terrorista sofrido
em 7 de outubro. O primeiro, batizado “Lavender” (Lavanda), elabora listas de
alvos inimigos a ser assassinados na Faixa de Gaza,
praticamente sem verificação humana. De que forma? O software analisa
informações recolhidas sobre a maioria da população de Gaza (2,3 milhões),
monitorada em permanência por Israel, e avalia a probabilidade de cada um ser
agente do Hamas. Ao mastigar características de agentes terroristas conhecidos
por Israel, o programa busca semelhanças na população. Disso brota a lista de
alvos potenciais para assassinatos, produzida pelo algoritmo. As autorizações
para o bombardeio passaram a ser quase automáticas, roubando em média 20
segundos de atenção humana.
O segundo programa desenvolvido para a ação
militar contra Gaza tem nome com interrogação: “Onde está papai?”. Destina-se a
rastrear alvos para bombardeá-los especificamente em casas, apartamentos ou
propriedades rurais familiares. “Não estávamos interessados em matar agentes do
Hamas apenas quando estivessem em instalação militar ou em confronto”, explicou
um dos entrevistados. “Ao contrário. Como primeira opção e sem hesitação, as
FDI bombardeavam o alvo em família.” O que explica o altíssimo índice de mulheres
e crianças despedaçadas e o apagamento de famílias inteiras.
Segundo entrevistados ouvidos na reportagem,
o comando militar de Israel tomou a decisão fatal de tolerar a morte de 15 a 20
civis palestinos para a eliminação de cada militante de pouca relevância. O
“dano colateral”. Quando o alvo inimigo fosse um oficial graduado do Hamas, a
tolerância aumentava para cem civis mortos. Ou mais. Para eliminar o comandante
da Brigada Central de Gaza, Ayman Nofal, o Exército autorizou, segundo a
reportagem, um dano colateral de 300 pessoas. Foi uma carnificina e tanto no
campo de refugiados de Al-Bureij naquele 17 de outubro. “As regras naquela fase
inicial e feroz da campanha eram muito lenientes”, contou um dos informantes.
“Arrasavam-se quatro edifícios inteiros, mesmo sabendo que o alvo estava em
apenas um — se é que estava. Era muito louco.”
Tão louco que, antes da pressão mundial para
a matança ser suspensa, as FDI trabalhavam com margem de erro de 10% nos alvos
humanos marcados para morrer. Um horror. Os critérios da “Lavender” eram
fluidos, mudavam a toda hora. Funcionários da Defesa Civil de Gaza ou pequenos
burocratas deveriam ser considerados militantes do Hamas? Ou simpatizantes? E
quem já pertenceu ao grupo, mas se desligou? Um único denominador comum foi
mantido com rigor: os alvos primários sempre deveriam ser homens, pois nem a ala
militar do Hamas nem o grupo terrorista Jihad Islâmica Palestina tem mulheres
em suas fileiras.
Foi nessa toada que a inteligência artificial
gerou um catatau de 36 mil alvos humanos a ser eliminados na Faixa de Gaza, o
que explica a criminosa mortandade indiscriminada das seis primeiras semanas da
guerra: mais de 15 mil palestinos mortos, quase metade do total de 33 mil
vítimas computadas até agora. Sem falar no uso maciço das “bombas burras” de
arrasa-quarteirão (sem componentes de precisão), responsáveis por danos
colaterais infinitamente mais graves que mísseis guiados. “Não é aconselhável
desperdiçar bombas caras com pessoas sem importância”, explica um dos ouvidos
na investigação.
Recomenda-se a leitura na íntegra dessa
investigação. Um Estado militarizado e de vanguarda tecnológica, em que
algoritmos calculam em escala industrial quem deve morrer, precisa ser chamado
à razão. A sorte de Israel é ter cidadãos dispostos a jogar luz sobre a
desumanidade.
EXCEPCIONAL!! O Estado terrorista de Israel usa todas as tecnologias mais modernas para ASSASSINAR CIVIS PALESTINOS, sob a cumplicidade dos EUA e de quase todos os governos europeus! São CRIMES de guerra em série, que já mataram mais de 10 mil crianças palestinas e mais de 10 mil mulheres palestinas sem qualquer envolvimento com o Hamas. Mais de 600 mil crianças palestinas estão sem qualquer aula há mais de 6 meses. Que futuro terão os palestinos sobreviventes da Faixa de Gaza?
ResponderExcluirDaniel, para de mentir. Não existe palestino, pra começar; existe árabe-muçulmano. Afirmar que não há qualquer envolvimento é o mesmo que dizer que todo petralha é honesto, a começar pelo líder mor.
ResponderExcluirMAM
Carácoles!
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