domingo, 28 de abril de 2024

Elio Gaspari - Netanyahu no golpe do ‘cachorro doido’

O Globo

'Governo de Israel atravessa um inédito processo de isolamento fora do mundo islâmico'

Em 2007, quando estava na oposição, Benjamin Netanyahu ensinou:

“Você não pode ter um primeiro ministro num país como Israel se ele não tem algum tipo de habilidade para conceber um conceito de diplomacia e segurança.”

Desde outubro, quando os terroristas do Hamas atacaram Israel, sabia-se que seus serviços de inteligência haviam fracassado. Só agora o general que os comandava deixou o cargo. Seis meses depois, enquanto o governo de Netanyahu atravessa um inédito processo de isolamento fora do mundo islâmico.

As manifestações de estudantes americanos acampando em universidades são um aviso de que algo está acontecendo. Eles não são contra Israel. Condenam o tipo de guerra que Netanyahu faz na Faixa de Gaza.

O primeiro-ministro de Israel entrou na tenebrosa galeria dos governantes que fazem o jogo do “cachorro doido”. Acreditam que prevalecerão indicando aos outros que são capazes de fazer o impensável.

Quem primeiro expôs essa teoria foi o presidente americano Richard Nixon diante da guerra do Vietnã. Deu com os burros n’água. Antes dele, o primeiro-ministro soviético Nikita Kruschev armou o mesmo bote em 1962, botando ogivas nucleares em Cuba. Dançou.

Vinte anos depois, o ditador argentino Leopoldo Galtieri invadiu as Ilhas Malvinas achando que a Inglaterra não reagiria. A primeira-ministra Margaret Thatcher desceu a frota e retomou as ilhas, e Galtieri foi deposto.

No Brasil o cachorro doido ladrou em 1961, mas acabou mordendo o próprio rabo. O presidente Jânio Quadros mandou pelo menos quatro bilhetes aos ministros militares tratando das Guianas.

No primeiro, de 31 de julho, denunciava a “presença de fortes correntes de esquerda, algumas, reconhecidamente, comunistas” e perguntava:

“Haverá, ainda, a possibilidade da nossa penetração nesses três Estados e, eventualmente, a da integração respectiva, no todo ou em parte, a nosso país?”

No último, de 24 de agosto, Jânio havia abandonado a ideia da “integração” e programou uma reunião do Ministério para tratar da Guiana Inglesa.

Segundo Jânio:

“Com as recentes eleições da Guiana Britânica instalar-se-á, sem dúvida, ao norte do Brasil, um país de estrutura soviética.

Conheço o dirigente desse novo governo e considero-o da mais alta periculosidade.”

No dia seguinte, Jânio tentou outro golpe. Com o vice-presidente terminando uma viagem à China, renunciou à Presidência e esperou que pedissem a sua volta.

Enganou-se.

Em geral, o “cachorro doido” perde.

Precisa-se de um coordenador

Surgiu em Brasília a ideia de colocar o vice-presidente Geraldo Alckmin na coordenação política do governo. Não tem a menor possibilidade de dar certo.

Dilma Rousseff tentou essa manobra usando seu vice, Michel Temer. Deu no que deu.

Temer até tentou alguns passos e foi torpedeado pelo comissariado petista. Figurativamente, ele fazia os acertos usando o seu cartão de crédito e o Planalto não pagava as contas.

O marinheiro e o almirante

Tramita na Câmara um projeto aprovado pelo Senado que manda inscrever no livro dos “Heróis da Pátria” o marinheiro negro João Cândido, líder da Revolta da Chibata, de 1910.

Essa revolta começou no encouraçado Minas Gerais e espalhou-se por outros navios da frota da Baía de Guanabara e durou quatro dias. Pediam: “que desapareçam a chibata, o bolo, e outros castigos”, bem como o aumento do soldo. Bombardearam o Rio, com a morte de duas crianças. Terminado o motim, os rebeldes foram anistiados, com o apoio de Rui Barbosa.

comandante da Marinha, almirante Marcos Olsen, escreveu à Comissão de Cultura da Câmara, desaconselhando a iniciativa:

“Nos dias atuais, enaltecer passagens afamadas pela subversão, ruptura de preceitos constitucionais organizadores e basilares das Forças Armadas e pelo descomedido emprego da violência de militares contra a vida de civis brasileiros é exaltar atributos morais e profissionais, que nada contribuirá ao pleno estabelecimento e manutenção do verdadeiro Estado democrático de Direito.”

Tudo bem. Revolta é revolta e revoltoso é revoltoso, mas a Marinha precisa equilibrar a equação.

Desde 1933 ela manteve na sua frota o navio-escola Saldanha da Gama. Desativou-o em 1990 e está construindo outro, com o mesmo nome, para apoio na Antártica.

Luís Filipe Saldanha da Gama (1846-1895) era um almirante de vitrine e se achava. Revoltou a Armada em 1893 contra o governo do marechal Floriano Peixoto, perdeu e foi combater no Rio Grande do Sul. Lá, foi batido e degolado.

Saldanha queria que Floriano convocasse eleições. Foi um rebelde do andar de cima. João Cândido, insurreto do andar de baixo, queria acabar com a chibata. Ambos se revoltaram, porém prevaleceram.

Um é nome de navio da Marinha, o outro é nome de um petroleiro da Transpetro.

Inteligência educacional

O governador Tarcísio de Freitas e seu secretário de Educação, Enredo Feder, querem usar instrumentos de inteligência artificial para produzir as aulas digitais que são utilizadas pelos professores de todas as escolas da rede estadual paulista.

Saiba-se lá o que é isso, mas a dupla precisa recorrer à própria inteligência convencional para cuidar da quitanda que administra.

O município de Morungaba (SP) tem 3 mil habitantes. Há 12 anos lá funciona a escola privada Ratimbum com 72 alunos (seis bolsistas) que cursam até a 5ª série. Há mais de um ano a escola pediu aos educatecas autorização para ampliar suas matrículas, com aulas até a 9ª série.

A Ratimbum recebeu quatro visitas de inspetores com inúmeras exigências, algumas erradas. Atendeu várias. (Um pedido, verbal, exigia que a água dos bebedouros viesse da Sabesp, que não atende o local onde fica a escola.)

Algum programa de inteligência artificial poderia organizar a comemoração do segundo aniversário da espera da autorização.

Londres na primavera

A primavera londrina recebeu mais uma série de palestras enfeitadas por magistrados brasileiros. Foi o 1º Fórum Jurídico Brasil de Ideias. Juntou três ministros do Supremo Tribunal (Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes), mais cinco juízes do STJ.

Um dos painéis, abrilhantado pelos ministros, discutiu “Mecanismos de aprimoramento do processo eleitoral brasileiro”.

Faz tempo, um diplomata ia todo ano a Nova York para participar de uma reunião que discutia a independência da Namíbia e comentava:

— Se essa comissão se reunisse na Namíbia, ela seria independente há muitos anos.

Se o aprimoramento do sistema eleitoral brasileiro tiver que ser discutido na Baixada Fluminense, seus problemas serão logo resolvidos.

O ministro Alexandre de Moraes não dá sorte com as sedes de suas palestras. Entre os patrocinadores da farofa de Londres esteve o empresário Alberto Leite. Em 2022 ele recebeu na pista do condomínio onde vive o jatinho que trazia Elon Musk, para um encontro com o presidente Jair Bolsonaro.

Ausência

Nos próximos quatro domingos o signatário cultivará o ócio.

 

2 comentários:

  1. Excelente! A diplomacia de Israel é feita por uma QUADRILHA de mentirosos e criminosos, que servem a um governo GENOCIDA!

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