Valor Econômico
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
antecipou deliberadamente o calendário eleitoral do Rio Grande do Sul, ao
nomear o ministro da Comunicação Social Paulo Pimenta para a pasta
extraordinária que vai coordenar a reconstrução do Estado e o auxílio à população
flagelada pela catástrofe.
Lula tinha opção. Seria possível manejar esforços em relação ao socorro ao Estado sem uma estrutura nova. A escolha de Lula, contudo, surpreende pouco. Um dirigente compromissado com a direita gaúcha ponderou, sob reserva: uma vez criado cargo dessa natureza, a única alternativa plausível ao nome de um político seria a indicação de um militar, o que daria um protagonismo às Forças Armadas, uma das coisas que o atual governo quer evitar.
É uma jogada de risco: se Pimenta revelar-se
à altura da empreitada, consolida-se como forte nome a governador, cria uma
narrativa positiva que favorecerá Lula em 2026, removendo uma das pilastras do
bolsonarismo mais incertas. Se o ministro mostrar-se inepto, multiplique-se o
prognóstico acima por menos um.
A volta de Pimenta ao comando da Secom no fim
do ano será surpreendente. Comenta-se dentro do próprio governo que Pimenta
nunca quis essa pasta e jamais perdeu de vista o Rio Grande do Sul. Gostaria de
um Ministério que lhe permitisse agir mais diretamente sobre o Estado. Essa é
uma possibilidade que se abre novamente se Lula optar por uma mexida
ministerial mais ampla.
Na Secom, Pimenta assumiu uma estrutura
balcanizada: assessores que estavam com Lula há muito tempo assumiram
postos-chave e pouco se reportavam a ele.
À frente da pasta, Pimenta pagou por contas
que não são suas. Disputar narrativas no subterrâneo das redes sociais é uma
tarefa dos partidos e da militância, não do governo. A mistura das duas coisas
resultaria em um escândalo, como foi o chamado “Gabinete do Ódio” no governo
Bolsonaro.
Sempre houve uma polifonia sobre o que fazer
na Internet para enfrentar o bolsonarismo. Ninguém dentro do governo se sente
confortável em falar, nem mesmo bem, da primeira-dama Rosângela Silva, a Janja.
O que dentro e fora da Esplanada se reconhece é que ela estabeleceu uma
estratégia própria de comunicação para seu marido e que ninguém manda nela.
Muitas vezes seu voluntarismo vai na direção correta. Há um enorme engajamento
nas redes sociais gerado por postagens sobre bichinhos, por exemplo.
Falta amarração em Brasília, contudo, da
atuação dos ministros que tragam uma marca ao governo. Falta um trabalho
conjunto que suplante as disputas partidárias e traga para a defesa do governo
políticos que manejam as redes sociais como ninguém e não são do PT. É o caso
de João Campos (PSB), prefeito do Recife; ou mesmo do de Guilherme Boulos
(Psol) pré-candidato em São Paulo, como comentou Manoel Fernandes, da
consultoria Bites.
Fernandes citou o Rio Grande do Sul como
exemplo da dificuldade do campo lulista em estabelecer narrativas. Na semana
entre 6 e 13 de maio, o clima nas redes sociais virou em relação a esse tema.
Segundo Fernandes comentou na segunda-feira, Bolsonaro tinha 37% de tração,
Lula 21%, Janja 11%, o deputado Marcel Van Hatten (PL) 8% e o governador
Eduardo Leite (PSDB) 6%. No começo da crise Lula e Janja somados estavam com
51,1% do engajamento sobre o tema.
É possível que a gestão da tragédia tenha
como efeito político uma guinada local, o que provavelmente estará no cálculo
de Lula. O Rio Grande do Sul foi palco de vitórias de Bolsonaro em 2018 e 2022,
mas é uma das mais frágeis bases bolsonaristas. No ano retrasado Bolsonaro teve
49% no Estado no primeiro turno, ante 42% de Lula. No segundo turno Bolsonaro
bateu o petista por 56% a 44%. Mas entre os 13 Estados onde o ex-presidente
ganhou, apenas em São Paulo o resultado foi mais apertado.
Ao lado de Pernambuco e Mato Grosso do Sul, o
Rio Grande do Sul é um dos únicos Estado do Brasil onde o governador elegeu-se
batendo adversários alinhados tanto a Lula quanto a Bolsonaro. O bolsonarista
Onyx Lorenzoni (PL) foi o mais votado no primeiro turno. Leite no segundo turno
apostou que receberia o voto da esquerda por osmose, sem fazer nenhum gesto, e
foi o que aconteceu. Em 2018 gravou vídeo de apoio a Bolsonaro no segundo
turno, contra o hoje ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT).
Até o começo da tragédia climática, Leite era
o nome mais lembrado no meio político para encabeçar uma candidatura
presidencial de terceira via em 2026. É outro, que pela fatalidade, foi
empurrado para o tudo ou nada: a gestão que realizar sobre a tragédia o
definirá na história.
O fato de ter ido à rodada decisiva das
eleições com uma vantagem de apenas 0,04% sobre o petista Edegar Pretto
sinalizou, contudo, para a força do PT gaúcho e para a sua vulnerabilidade.
O vice-governador, possível adversário de
Pimenta, é o emedebista Gabriel Souza, correligionário do prefeito atual de
Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), que não o apoiou nas eleições de 2022. Melo
ficou com Onyx para o governo gaúcho e deve ter um vice do PL como companheiro
de chapa.
Em Porto Alegre, a esquerda perdeu em 2020,
mas deu demonstração de força. A comunista Manuela d’Avila teve 29% dos votos
no primeiro turno e 45% no segundo turno. Foi um desempenho superior ao de
Boulos em São Paulo, na eleição em que o deputado do Psol perdeu para Bruno
Covas (PSDB). Melo era o favorito até o fim de abril. Qualquer previsão agora,
contudo, é precipitada.
No mundo da política profissional, ninguém dá ponto sem nó.
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