Correio Braziliense
As centrais sindicais nem se deram conta dos
100 anos da efeméride no Brasil e realizaram, ontem, um evento esvaziado em São
Paulo, que virou mico eleitoral
As comemorações oficiais do Primeiro de Maio no Brasil completaram 100 anos, ontem. O feriado nacional é fruto de um período conturbado na vida nacional, no começo dos anos 1920, quando a questão social ainda era tratada como caso de polícia, inclusive os sindicatos de trabalhadores, na República Velha, então presidida por Arthur Bernardes. Em 1922, houve a Semana de Arte Moderna, a fundação do Partido Comunista e a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, grande estopim do movimento tenentista, com eclosão de várias rebeliões militares: em 1923, a Revolta no Rio Grande do Sul, em 1924, a Revolta Paulista, a Revolta de Sergipe, a Comuna de Manaus, a Campanha do Paraná, a Coluna Prestes; e, em 1926, a Coluna Relâmpago de Isidoro Dias Lopes.
Para acalmar os ânimos e apartar os
trabalhadores do movimento tenentista, Bernardes instituiu o Dia do
Trabalhador: “É considerado feriado nacional o dia 1º de maio, consagrado à
confraternidade universal das classes operárias e à comemoração dos mártires do
trabalho”. A data é comemorada em todo o mundo, desde 1889, quando a II
Internacional Socialista estabeleceu o 1º de maio, Dia Internacional dos
Trabalhadores, para homenagear os mártires da greve de Chicago de 1886, que foi
duramente reprimida.
Oito trabalhadores anarquistas foram acusados
de conspiração, sete foram condenados à morte e outro a 15 anos de prisão. Um
dos condenados à morte suicidou-se na prisão. Outros quatro foram enforcados. O
1º de maio de 1886 havia reunido milhares de trabalhadores em greve por “oito
horas por dia sem cortes no pagamento” nos Estados Unidos. As manifestações
atingiram Nova York, Detroit, Winsconsin e Chicago. À época, a jornada de
trabalho dos norte-americanos era de 60 horas semanais, por seis dias na semana.
No Brasil, como em todos os países, o caráter
e vigor das comemorações variaram de acordo com a conjuntura. Com a instituição
da legislação trabalhista e do salário mínimo, o presidente Getulio Vargas,
durante a ditadura do Estado Novo, usou e abusou das comemorações para
demonstrar apoio popular, principalmente dos trabalhadores urbanos. Em
contrapartida, no seu governo constitucional, em 1953, enfrentou uma greve de
300 mil trabalhadores em São Paulo, entre os dias 25 de março e 23 de abril de
1953. À época, os trabalhadores conquistaram um aumento salarial de 32%, que
foi comemorado no 1º de Maio daquele ano, no antigo Jóquei Clube da Mooca.
Outro 1º de Maio épico foi o de 1980, em São
Bernardo do Campo, que se tornou uma grande manifestação contra o regime
militar. Ocorreu quando a greve dos metalúrgicos do ABC estava no seu trigésimo
dia, com o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e de Diadema sob
intervenção e com grande parte da sua direção cassada pelo regime militar,
inclusive a principal liderança do movimento, Luiz Inácio Lula da Silva.
Faltou mobilização
Mais dramático foi o 1º de Maio de 1981. Na
véspera, seria realizado um grande show no RioCentro, em Jacarepaguá, no Rio de
Janeiro, com a presença de artistas como Chico Buarque, Alceu Valença,
Gonzaguinha e Gal Costa. O país acordou perplexo com a notícia de que um
atentado à bomba durante o espetáculo somente não ocorreu porque um artefato
explodiu no colo de um sargento do Exército, que morreu no ato, quando
manuseava o explosivo, ao lado de um capitão que ficou gravemente ferido. Havia
no veículo outra bomba, que não explodiu; uma terceira danificou a central de
energia do local do evento, o que provocou um apagão. Cerca de 20 mil pessoas
estavam no local.
Em vez de organizar uma comemoração à altura
dos 100 anos de reconhecimento das lutas operárias e sindicais no Brasil, as
centrais sindicais, lideradas pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), nem
se deram conta da efeméride e realizaram, ontem, um evento esvaziado, no
estádio do Corinthians, na Zona Leste de São Paulo, que virou mico. Presente ao
encontro, Lula disse que o ato foi “mal convocado” pelas centrais sindicais.
Depois do pito público nos dirigentes das
centrais sindicais, Lula resolveu fazer proselitismo eleitoral e pediu votos
para Guilherme Boulos (PSol), pré-candidato à Prefeitura de São Paulo.
Classificou as eleições paulistanas como “verdadeira guerra. Contra quem? O
prefeito Ricardo Nunes (MDB), candidato à reeleição, principalmente, e Tabata
do Amaral (PSB), que tem o apoio do vice-presidente Geraldo Alckmin, que estava
no palanque.
“Ele (Boulos) está disputando com o nosso
adversário nacional, contra o nosso estadual, contra o nosso adversário
municipal. Ele está enfrentando três adversários. E, por isso, quero dizer:
Ninguém vai derrotar esse moço se vocês votarem no Boulos para prefeito nessas
eleições”, disse Lula. A fala do petista foi um tiro no pé.
Não acrescentou um voto para Boulos.
Constrangeu os aliados, provocou pronta reação do presidente do MDB, deputado
Baleia Rossi, e descontentou a turma do PSB, partidos que integram a coalizão
de governo. Além disso, abriu um questionamento sobre uso indevido de recursos
públicos e campanha antecipada, por parte do prefeito Ricardo Nunes e de outros
candidatos. Por fim, não basta a Boulos o “physique du rôle” de Lula, que já
tem; para vencer as eleições, precisará do apoio da classe média paulista. Mas isso
é assunto para outra coluna.
É.
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