segunda-feira, 27 de maio de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Analfabetismo em queda abre novas perspectivas ao país

O Globo

Apesar do avanço mais lento que o desejável, Brasil tem obtido êxito no combate à chaga secular

O analfabetismo, que há séculos envergonha o Brasil, tem sido enfrentado com êxito, revelam dados do Censo de 2022. Em relação a 2010, a parcela de analfabetos na população com mais de 15 anos caiu 2,6 pontos percentuais, de 9,6% para 7%. É verdade que, em números absolutos, ainda há 11,4 milhões de brasileiros que não sabem ler nem escrever. Mas a situação já foi bem pior — e tem melhorado.

“Em 1930, apenas 21% dos brasileiros estavam alfabetizados, enquanto na Argentina esse número já era 63%”, diz Claudia Costin, ex-diretora global de educação do Banco Mundial. Em 1940, menos da metade da população era alfabetizada. Apenas depois da redemocratização, a educação passou a ser encarada com a devida importância, e a partir daí o progresso tem sido contínuo, ainda que mais lento que o desejável. Para Costin, o Brasil ainda paga um preço alto pela demora em universalizar o acesso à educação primária.

É consenso entre economistas e cientistas sociais a associação entre a educação e o desenvolvimento. Parte considerável das mazelas da nossa sociedade tem raiz na deficiência de formação da população. E ela começa na alfabetização. Ler e escrever são condições necessárias não apenas para a inserção no mercado de trabalho contemporâneo, mas para o exercício da cidadania e para uma vida plena em sociedade.

As disparidades regionais são sintomáticas. Dos 50 municípios em que a taxa de analfabetismo é superior a 30%, 48 estão no Nordeste (os outros dois estão em Roraima). Na região, os analfabetos somam 14,2% da população, o dobro da média nacional. Os 50 municípios com menor índice de analfabetismo, em contrapartida, estão todos no Sul e no Sudeste.

Ainda assim, entre 2010 e 2022, a proporção de alfabetizados no Nordeste subiu quase 5 pontos percentuais, de 80,9% para 85,8%. Outro alento é que a faixa etária mais alfabetizada no Brasil vai de 15 a 19 anos (apenas 1,5% dela não sabe ler e escrever). O analfabetismo nesse segmento caiu 3,5 pontos percentuais desde o último Censo. Isso significa que o avanço da alfabetização entre crianças e jovens tem quebrado a cadeia de transmissão do analfabetismo entre as gerações. O Brasil está no caminho certo.

A maior redução no analfabetismo, de 31,3% para 15,3%, ocorreu na Região Norte. Isso se deve à alfabetização dos indígenas. Os que não sabem ler nem escrever caíram de 23,4% para 16,1%. A inserção na sociedade se dá por meio do papel e do lápis. Deve-se considerar que não é fácil alfabetizar tais povos, tal a multiplicidade de culturas e idiomas. Metodologias que levassem isso em conta poderiam obter resultados ainda mais positivos.

Os indicadores também seriam mais auspiciosos se não tivesse havido a pandemia. A alfabetização das crianças ficou prejudicada com o fechamento das escolas por mais tempo que o razoável. Espera-se que o trabalho de restauração e manutenção do aprendizado recupere o tempo perdido, sem deixar sequelas.

Legislação trabalhista continua a pesar contra geração de emprego

O Globo

Há uma relação inequívoca entre o alto custo de criar vagas com carteira assinada e a alta informalidade

Enquanto Executivo, Legislativo e Judiciário discutem como taxar a folha de pagamentos de empresas, poucos lembram o principal fato que cerca a questão: empregar no Brasil custa caro. O empregador, além de pagar seu funcionário, precisa gastar o equivalente a um segundo salário em contribuições à Previdência, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, salário-educação, décimo terceiro, férias, seguro contra acidentes, contribuições ao Sistema S etc.

Pelas contas do pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) José Pastore, um empregado com carteira assinada custa para o empregador, somando todos os direitos decorrentes, 103,7% do salário. Uma indústria, ao contratar um trabalhador pelo salário médio pago pelo setor a quem tem ensino médio completo, de R$ 2.287, terá de gastar com encargos outros R$ 2.371,62. Nas palavras dele, os trabalhadores “ganham pouco e custam muito”.

Trata-se de uma das maiores proporções do mundo. Considerando apenas impostos sobre salários e as contribuições à Previdência — excluindo encargos como férias, décimo terceiro salário e outros tributos—, o Brasil fica atrás apenas da França numa lista de 42 países, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Com 25,8%, supera a média da OCDE (13,8%), Alemanha (16,5%), México (10,4%), Reino Unido (9,8%), China (22,1%) e Estados Unidos (7,6%).

Não é por acaso que os Estados Unidos têm um mercado de trabalho robusto. É inequívoca a relação entre custo trabalhista e informalidade, pois os encargos pagos ao governo funcionam como desincentivo à geração de emprego. Não é outro o motivo para haver tanto trabalho informal no Brasil. Aqueles que não têm carteira assinada — nem acesso a benefícios como férias ou décimo terceiro — representam 38% da força de trabalho, ou 38,8 milhões, de acordo com o IBGE.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi baixada por Decreto-Lei por Getúlio Vargas em 1943, ainda durante a ditadura do Estado Novo. Ela incluiu direitos trabalhistas de todo tipo, criados numa época em que o Brasil ainda era mais rural que urbano. A reforma trabalhista promovida em 2017 no governo Temer foi feliz ao flexibilizar vários aspectos dessa legislação arcaica. Mesmo assim, a lei brasileira ainda impõe obstáculos à geração de empregos e de riqueza. Eles precisam ser removidos.

Não se trata, como argumentam líderes sindicais, de “precarizar” os empregos, mas de adaptá-los às condições de uma economia moderna. A precarização decorre do elevado peso das contribuições com que o empregador tem de arcar ao criar vagas com carteira assinada. Reduzi-lo fortalecerá o mercado de trabalho e propiciará maior crescimento econômico.

Avaliação correta de monopólio do refino foi deixada de lado

Valor Econômico

Decisão do Cade deve fastar investidores domésticos e externos na concorrência no refino

A mesma direção do Cade, o órgão antitruste, que assinou um acordo para que a Petrobras vendesse 8 refinarias, e cessasse inquérito que apurava posição dominante no mercado de refino, decidiu agora que ele não era mais necessário. O presidente do Cade, Alexandre Barreto, disse em 11 de junho de 2019, poucos dias após a celebração do acordo, que ele “foi construído em consonância com as melhores práticas internacionais no que diz respeito à consecução de um ambiente concorrencial saudável, mediante uso adequado e suficiente de remédios estruturais pró-competitivos que resolvam não só o problema atual, mas que também mitiguem, de modo duradouro, o risco futuro de eventuais condutas anticompetitivas no mercado nacional de refino de petróleo”. A revogação do acordo, que desobriga a estatal de se desfazer de suas refinarias, foi feita de forma mais sucinta.

A história da mudança de posição do Cade e da Petrobras é a da troca de governo. Em março de 2023, já sob o presidente Lula, o Ministério de Minas e Energia pediu que a estatal esclarecesse se deveria ou não continuar com a venda das refinarias - três das oito em questão já o haviam sido -, e o comando da empresa decidiu que não, atendendo à política do Planalto. Em seguida, a Petrobras apresentou seu plano de investimentos 2024-2028, sob o comando de Jean Paul Prates, que não contemplava mais a privatização desses ativos, e solicitou ao Cade a “adequação” do Termo de Compromisso de Cessação. O Cade estabeleceu algumas condições e concordou.

Vale a pena comparar o que o termo de cessação pretendia impedir e o que o seu fim pode não mais impedir. Em maio de 2019, o órgão antitruste constatou que o mercado nacional de refino era um “quase-monopólio”, eufemismo para o fato de a Petrobras deter 98% de participação. Com isso, suspeitava o Cade, ela poderia “oportunizar ou mesmo ensejar abusos de posição dominante que, por certo, redundariam em consequências deletérias à sociedade brasileira”. A dominância da Petrobras ia além, porém. A estatal era um “quase-monopsônio na obtenção do principal insumo do refino, com que resta evidente que a ela é claramente um formador de preços, e não um tomador de preços, afetando significativamente, com suas políticas comerciais, uma das cadeias de produtos mais relevantes do país”. A venda de oito refinarias foi considerada então como solução que atacava “o cerne estrutural que origina esta e outras apurações relativas ao mercado doméstico de refino”, com precedente para que “eventuais condutas anticompetitivas sejam encerradas via remédios ou mecanismos que favoreçam a existência duradoura de um ambiente concorrencial saudável”.

Essas corretas avaliação e definição de objetivos foram deixadas de lado, entre outras razões, simplesmente porque a Petrobras mudou de planos. O Cade esqueceu a caracterização de quase monopólio e quase monopsônio e estabeleceu práticas a serem seguidas que, a seu ver, também podem impedir práticas anticompetitivas. Uma delas, por exemplo, estabelece a oferta do insumo em contrato “frame” a qualquer refinaria independente. Nele, “a obrigação de compra e venda somente será assumida na hipótese de ambas as partes chegarem a um acordo de preço”, em uma negociação que estará muito distante da igualdade de condições.

A longa série de desavenças entre as empresas de refino independentes e a Petrobras em relação à “defasagem” de gasolina e diesel, em que a estatal, ao represar os preços abaixo da paridade do mercado internacional, provocava prejuízo aos concorrentes, tem origem no desequilíbrio de forças de mercado provocado pelo “quase monopólio”. O governo Lula, porém, nunca escondeu que o petróleo, a produção de derivados, o transporte e a comercialização - toda a cadeia, enfim - deveriam ser estatais.

Ao tomar posse, um de seus primeiros atos, com o apoio do então presidente da Petrobras Jean Paul Prates, foi pôr fim à fórmula de preços com base na paridade com cotações internacionais. Antes, o então senador Prates aprovara projeto de lei no Senado (engavetado pela Câmara) para “abrasileirar” a fórmula, que reforçava o poder de fogo da estatal, mas deixava no escuro as empresas concorrentes e arruinava a capacidade delas de planejar negócios e ter previsibilidade em seu desempenho. Com o poder de concorrência da Petrobras ainda muito forte, não foi à toa que não apareceram muitos interessados na compra das refinarias. A “impossibilidade” da venda foi um dos argumentos da estatal para convencer o Cade a mudar de ideia sobre o TCC.

A decisão do Cade devolve quase que integralmente o monopólio para a Petrobras e deve afastar de vez investidores domésticos e externos na concorrência no refino. A direção da Petrobras no atual governo sempre esgrimiu o argumento da dependência externa para defender seu monopólio. Supondo que esse argumento seja correto, daí não decorre que os investimentos na área deveriam ser feitos só pela estatal, e não por empresas privadas. Era isso que o primeiro acordo com o Cade possibilitaria e é isso que sua revogação passa a impedir.

Governança terá novo teste na Petrobras

Folha de S. Paulo

Com oitava presidente em oito anos, estatal evita o pior das pressões do Planalto graças a regras instituídas em 2016

confirmação de Magda Chambriard na presidência da Petrobras pelo Conselho de Administração, com dois votos divergentes de membros independentes, encerra o mais recente episódio de crise no comando da estatal.

Têm sido frequentes as turbulências —a nova presidente é a oitava a ocupar o posto em apenas oito anos. Na maior parte das vezes, as trocas ocorreram sob pressão do Palácio do Planalto, normalmente em momentos de elevação dos preços dos combustíveis.

Assim foi na paralisação dos caminhoneiros, durante a gestão de Michel Temer (MDB), e depois repetidas vezes sob Jair Bolsonaro (PL), sempre fixado no populismo tarifário para sua base eleitoral.

Em todos esses momentos, o valor de mercado da empresa caiu em razão da suspeita de que o novo comando se renderia a pressões políticas contra os preços —risco que acabou não se confirmando.

Com ruídos e alguns desvios, a política de alinhamento às cotações internacionais vigente desde 2016 se manteve, graças à Lei das Estatais e a normas de gestão.

Mesmo em meio à instabilidade administrativa, ademais, entre 2016 e 2023 foi preservado o mais essencial —o plano de investimentos com foco em exploração e produção, com a governança mais firme estabelecida depois dos escândalos do petrolão petista.

Com disciplina no uso do capital e preços realistas, foi possível obter aumento sensível da produção, dos lucros e dos pagamentos de dividendos nos últimos anos, fator principal para a valorização das ações, agora novamente interrompida —a perda de valor de mercado desde o anúncio de Chambriard chegou a R$ 55,7 bilhões.

O que está por ser verificado é se desta vez o intervencionismo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) significará alteração mais substancial de rota a ponto de ressuscitar problemas do passado.

O mandatário não esconde que quer fazer da estatal novamente um instrumento político. O objetivo principal nem é a manipulação de preços, que a partir de certos limites traria problemas jurídicos, contestações de minoritários e reação de órgãos de controle.

O maior risco deriva da intenção de obrigar a empresa a realizar investimentos em áreas que no passado se relevaram antieconômicas, como refino e fertilizantes.

Além de recomprar refinarias privatizadas, Lula quer concluir aquelas que são notórias por prejuízos bilionários e pela corrupção. Também deseja reativar a indústria naval com encomendas a estaleiros nacionais.

Com perfil a princípio mais alinhado à tal orientação, Chambriard testará novamente as regras que têm evitado o pior na estatal.

Cidades-esponja

Folha de S. Paulo

Reconstrução urbana do RS pode inaugurar modelo de adaptação a chuvas no país

Assim que as águas baixarem de vez no Rio Grande do Sul, a reconstrução das cidades comporá um importante experimento social. Sem reformar a mentalidade dominante no planejamento urbano, como exige a mudança climática, uma onda de fracassos varrerá o país.

A tarefa mais urgente é encontrar moradia para milhares de famílias. Em paralelo, traçar um diagnóstico do que falhou e apurar eventuais responsabilidades. Além disso, reativar instalações vitais como escolas, postos de saúde e hospitais.

Nada disso terá sentido, no entanto, se tudo for refeito como antes. Entende-se que moradores queiram retornar para suas casas, mas o poder público precisa dar incentivos e alternativas para que deixem as zonas de risco.

O ideal seria devolver à natureza áreas de inundação, sobretudo as que surgiram da construção de aterros, por exemplo na forma de parques que favoreçam a infiltração pluvial. Pode-se objetar que o investimento seria proibitivo, mas qualquer programa de reconstrução envolverá custos portentosos. No mínimo, seria indicado realizar estudos sobre cada região.

Esse conceito de desenho urbano se aproxima do modelo de cidades-esponja, já aplicado na Europa e na China. Em lugar da pretensão de domar águas com concreto para dirigi-las aos rios, eles próprios retificados em canais que só aceleram a torrente, permitir que penetrem no lençol freático.

Meandros fluviais e várzeas faziam isso. Pode parecer impensável reverter o emparedamento do Tietê e do Pinheiros, em São Paulo, mas, em algum ponto da tragédia climática que se avizinha, será preciso planejar tal adaptação, ainda que em escala reduzida e local.

Em Xangai, uma área industrial foi convertida em parque linear com 2 km ao longo do rio Huangpu. Oslo reverteu a canalização subterrânea do rio Hovinbekken.

Empreendimentos desse porte podem não ser factíveis para o depauperado Estado brasileiro. Em todo caso, mudar mentalidades custa pouco, em termos financeiros, e trará dividendos inestimáveis para gerações futuras: qualidade de vida e patrimônio preservado diante de eventos extremos.

‘Todos sabem o que o governo quer da Petrobras’

O Estado de S. Paulo

Ministro Silveira deixa claro que é o governo quem manda na estatal e que ela retomará a ‘política correta’ que o lulopetismo adotou no passado – aquela que quase quebrou a empresa

O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, concedeu um punhado de entrevistas às vésperas da aprovação do nome de Magda Chambriard como nova presidente da Petrobras – o que ocorreu em tempo recorde e dispensando a praxe da votação dos acionistas reunidos em assembleia – com o ostensivo propósito de frisar que quem manda na companhia é o governo, não seus executivos nem muito menos os acionistas privados. E “todos sabem o que o nosso governo quer da Petrobras”, declarou ao Estadão.

Ao jornal O Globo, por exemplo, Silveira deixou claro que, para o governo petista, a administração da Petrobras nos mandatos anteriores de Lula da Silva foi “correta”, e só não entregou os resultados esperados porque “a Petrobras ficou paralisada por causa da Lava Jato”. Ou seja, para o ministro, não fosse a Lava Jato, que flagrou um colossal esquema de corrupção na Petrobras, a estatal teria voado.

Assim, Silveira matou dois coelhos com uma só declaração: atribuiu à Lava Jato a ruína da Petrobras, quando todos sabem que a empresa foi ao brejo por causa do seu escancarado uso político pelos governos petistas; e considerou “corretos” justamente os megalomaníacos planos desenvolvimentistas de Lula e Dilma Rousseff que dilapidaram a empresa.

Portanto, devemos agradecer ao ministro pela transparência. Ninguém mais no Brasil pode dizer que não foi avisado das intenções de Lula na Petrobras.

É verdade que a Petrobras é controlada pela União, razão pela qual seria ingenuidade supor que a empresa fosse atuar sem levar em conta os interesses do governo. Por outro lado, essa característica não significa que o governo possa fazer da estatal o que bem entender, porque uma má administração desta que é a maior empresa do País gera prejuízos para todos.

E foi isso precisamente o que aconteceu durante o trevoso mandarinato lulopetista ao qual o sr. Silveira aludiu. Em frentes simultâneas foram tocados projetos grandiosos que partiam do zero, como a construção de estaleiros e navios, criação de polos petroquímicos, grandes refinarias, gasodutos e plataformas. Tudo ao mesmo tempo, movimentando um volume de recursos que obrigou a companhia a contrair uma dívida que chegou a ultrapassar meio trilhão de reais (R$ 507 bilhões, em setembro de 2015, ante um caixa de pouco mais de R$ 100 bilhões na época).

Obviamente, nada disso importa para o governo. O movimento de Silveira – integrante do Centrão que se tornou um dos ministros mais influentes de Lula – pareceu ter como alvo a própria Magda Chambriard. Depois da gestão do petista Jean Paul Prates, demitido de forma sumária apesar de fazer quase tudo o que seu chefe mandou, o ministro deixa claro que não basta concordar com a estratégia estipulada pelo governo. É preciso ser veloz na execução e não questionar. Difícil acreditar que o recado do ministro tenha sido dado sem o aval do demiurgo petista.

O ministro Silveira sustenta que a Petrobras não é só uma empresa de petróleo e que tem outras obrigações com o Brasil, mesmo se tiver de renunciar ao lucro. Cita a produção de gás e fertilizantes, além do refino, para enfatizar que caberá ao presidente Lula, o verdadeiro CEO da empresa, a decisão final sobre os investimentos.

Logo, a nova presidente da Petrobras deve obedecer cegamente ao chefe, algo que, segundo Silveira, Magda Chambriard certamente fará, porque “as mulheres, quando pegam essa missão, o fazem com muito zelo”. Magda é funcionária de carreira da Petrobras e foi diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis. Sua linha de pensamento está em linha com os ideais do lulopetismo para o setor, desde a necessidade de investir em refino até a valorização da política de conteúdo local.

Resta saber se Magda Chambriard respeitará o alinhamento também em questões comerciais, como a definição do preço dos combustíveis, tão cara ao presidente da República, preocupado com o impacto na inflação. Mas o ministro deixou claro que a nova presidente da Petrobras terá de ter a “humildade” de fazer tudo o que o controlador mandar.

Uma verdade inconveniente

O Estado de S. Paulo

A este jornal, o ensaísta Francisco Bosco admitiu que Olavo de Carvalho acertou ao dizer que os esquerdistas dominam as universidades. Foi o que bastou para apanhar desses intolerantes

Em entrevista ao Estadão, o insuspeito ensaísta Francisco Bosco deu uma declaração que provocou a ira de muitos abutres da esquerda, adeptos do violento tribunal das redes sociais: reconheceu um acerto de Olavo de Carvalho, o ex-astrólogo convertido em guru de Jair Bolsonaro e da extrema direita brasileira. O acerto em questão, tratado pelos algozes do entrevistado com simplificações e clichês, parece inquestionável a Bosco, a este jornal e a qualquer pessoa que conheça o universo acadêmico do Brasil e preze a boa convivência democrática no debate público: nossas universidades concentram excessivamente uma perspectiva ideológica e política de esquerda e, mais do que isso, o ambiente acadêmico e intelectual tenta excluir grandes dissensos e reage violentamente a qualquer tentativa de ocupação de espaços por parte de pensadores conservadores.

Sem pluralidade e diversidade, um debate empobrecido emerge dos circuitos universitários e avança para todo o universo cultural do País, razão pela qual, como afirmou Bosco, a palavra “intelectual” é hoje “vista sob suspeita de elitismo e concentração ideológica”. Mas bastou o reconhecimento do ensaísta estar resumido no título da entrevista e nas postagens das redes sociais – Olavo de Carvalho tinha razão, alusão aos cartazes que manifestantes de direita conduziam nos protestos de 2013 – para que os vândalos da reputação alheia se ouriçassem. Não custa dizer: no conjunto da obra, sobretudo quando, mais recentemente, se tornou o sinônimo da desonestidade intelectual e da paranoia destrutiva que tão bem definem o bolsonarismo, Olavo está longe de ter razão. Mas não é preciso admirá-lo para reconhecer sua influência sobre um campo que nunca se viu representado na universidade e na política nem o acerto de suas reflexões sobre intelectuais acadêmicos. Foi o que Bosco fez na entrevista.

O mundo implacável, tóxico e superficial das redes, no entanto, costuma oferecer escasso espaço para reflexões complexas, invariavelmente substituídas por desqualificações grosseiras a partir do primeiro sinal de dissenso. Houve até quem levantasse a hipótese de que a entrevista publicada pelo Estadão fosse fake news. Não raro se ignorou o próprio conteúdo da entrevista, em que se vê uma tese cristalina, isto é, a de que o guru do bolsonarismo tinha razão num ponto: há concentração ideológica e elitização no debate intelectual nas universidades, sobretudo no campo das ciências humanas e particularmente na filosofia, nas letras e nas ciências sociais. E Bosco a demonstrou, não sem desconforto ante a natureza abominável de Olavo de Carvalho.

Assim resumiu o ensaísta ao Estadão: “Eu estudo (...) um autor de direita que fez uma verificação nos bancos do CNPq e mostrou que alguns dos autores conservadores mais importantes do mundo praticamente não são mencionados nas teses de ciências humanas do Brasil. A pessoa que talvez primeiro tenha falado sobre isso, e nem sempre da melhor maneira, foi o Olavo de Carvalho. Embora me custe dizer essa frase, eu a digo (...) sem problema algum: Olavo tinha razão nesse ponto”. Uma constatação que não é de hoje – nem restrita a um intelectual público independente como Bosco ou à extrema direita. Há mais de 50 anos, o professor da USP Roberto Schwarz, referência entre intelectuais de esquerda, já apontava isso num estudo sobre o período que antecedeu o golpe militar de 1964. Schwarz constatou então que nem mesmo a instauração da ditadura impedira a preservação do domínio cultural da esquerda.

O episódio ilustra o ar rarefeito sentido hoje no debate público brasileiro, no qual a lógica de grupo se sobrepõe à necessária liberdade de divergir e conviver. Um modo tribal de encarar o mundo, os valores e as ideias leva à sensação de ameaça permanente nos grupos e identidades que se enfrentam. Às tribos da esquerda que gritaram agora, resta o alerta: se prosseguir reagindo assim, obrigarão alguns a dizer que a esquerda é burra – e aí Olavo de Carvalho terá, infelizmente, acertado de novo.

Ainda as bugigangas

O Estado de S. Paulo

Tributar plataformas estrangeiras é questão de isonomia, mas interesses eleitoreiros se impõem

O governo Lula da Silva tem tido uma atitude absolutamente incongruente no imbróglio sobre a taxação de compras internacionais de até US$ 50. Nada, além do mero populismo eleitoreiro, explica tanta hesitação em voltar a aplicar o Imposto de Importação sobre produtos adquiridos em plataformas estrangeiras. Não se trata de protecionismo. Tributar esses sites é tratar as empresas nacionais com um mínimo de isonomia.

De um lado, a medida pode preservar empregos e impulsionar a produção local, as vendas e a economia. De outro, a taxação tem tudo a ver com a agenda da equipe econômica, que conta com a ampliação da base de arrecadação como principal arma para reequilibrar as contas públicas.

Se é hora de cobrar quem não paga imposto, como diz o ministro Fernando Haddad, nada mais justo começar por quem inunda o País com bugigangas vendidas por valores que, tudo indica, não cobrem nem o custo de produção nem o gasto com o transporte até o Brasil.

É preciso desinterditar esse debate com fatos, não crenças. A isenção de Imposto de Importação para produtos de até US$ 50 é uma regra antiga e que só valia para transações entre pessoas físicas. Não há, nem nunca houve, isenção para o comércio eletrônico.

O que havia era fraude: empresas se passavam por pessoas físicas para se beneficiar dessa brecha, omitiam o valor dos itens comercializados para se enquadrar na cota e fracionavam as remessas para driblar o sistema e se utilizar de uma isenção que nunca lhes coube.

Ao criar o programa Remessa Conforme no ano passado, a intenção da equipe econômica era aplicar o imposto sobre as empresas, que, evidentemente, repassariam o custo ao consumidor. Era esperado que a oposição fizesse barulho com a medida. Por outro lado, era uma agenda que unia setores que muitas vezes estão em flancos opostos, como a indústria e o comércio.

De maneira inacreditável, Lula da Silva se rendeu ao barulho das redes sociais – como se elas representassem o verdadeiro espaço público dos tempos atuais e não uma arena dominada por robôs e vândalos virtuais. Mas o pior é que o presidente ignorou seus técnicos e cedeu ao discurso de palpiteiros, entre os quais a primeira-dama Rosângela Lula da Silva, para quem os mais pobres são os principais clientes das plataformas internacionais.

Não adiantou nada. Mesmo sem ter aplicado o Imposto de Importação, como já deveria ter feito no ano passado, é Lula da Silva quem paga o pato pelo fato de os governadores terem aumentado o ICMS cobrado sobre as compras feitas por meio desses sites. E, ainda assim, a tributação dessas plataformas continua a ser muito menor do que aquela que incide sobre a indústria e o comércio locais.

Taxar essas plataformas é medida tão óbvia que conta até com o apoio de quem resiste à elevação de impostos, como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Passou da hora de o governo tratar esse tema com a seriedade que ele requer. Que o Congresso tenha a coragem de aprovar a retomada da taxação, e que Lula da Silva tenha a coragem de não vetá-la.

Investir na alfabetização e ganhar em crescimento

Correio Braziliense

Dados do IBGE mostram que o país ainda tem um desafio a ser vencido para cumprir a determinação da Constituição

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou informações sobre a educação no Brasil colhidas no Censo de 2022. Os dados, apresentados no último dia 17, apontam que o percentual de analfabetos diminuiu. Os números indicam que 7% da população não sabia ler um simples bilhete — em 2010, esse problema atingia quase 10%. Para consolidar a pesquisa, o IBGE analisou a população de 15 anos ou mais, composta por 163 milhões de pessoas. Dentre elas, 151,5 milhões são alfabetizadas, enquanto 11,4 milhões não são. Esse retrato mostra que o país ainda tem um desafio a ser vencido para cumprir a determinação da Constituição.

A Carta Magna coloca que a educação é direito de todos e dever do Estado, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. Ainda segundo a Lei Maior, o aprendizado é a garantia do pleno desenvolvimento individual, preparando cada um para o exercício da cidadania e possibilitando a qualificação ao trabalho.

Conforme nos ensinou o mestre Paulo Freire, a alfabetização é o caminho para a conscientização social e o empoderamento. Sem o conhecimento das letras, o indivíduo tem a sua autonomia comprometida, explicava o educador e filósofo. Em tempos de tecnologia e desenvolvimento acelerado, muito mais que básica, ler é condição fundamental para a vida em igualdade e o crescimento coletivo.

Bem do cidadão e da sociedade, a educação faz toda a diferença para que um país se torne uma nação desenvolvida. A taxa de alfabetização é considerada um importante indicador nacional — levada em conta no cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que, por sua vez, é um indicador essencial no contexto da sociedade.

Não é possível que um país se destaque em nível mundial com pessoas que não foram apresentadas às instituições de ensino e, por consequência, vão ficar apartadas das oportunidades profissionais. Como uma nação vai criar, inovar e produzir com graus de excelência e competitividade se seus cidadãos estão sem acesso à formação? A história já apontou a resposta.

A defasagem educacional no Brasil engloba ainda o "analfabetismo funcional", condição que caminha muito perto da impossibilidade de leitura. A pessoa que lê, mas não é capaz de compreender um texto inteiro, um livro ou uma notícia também tem comprometida sua trajetória de emancipação. Em diversos casos, a frequência na escola não garante que o indivíduo será devidamente alfabetizado.

Níveis ruins de alfabetização em geral prejudicam e desenvolvimento econômico de um país no atual mundo em rápida mudança tecnológica. A modernidade instantânea exige uma resposta elevada no que diz respeito à educação. Implementar políticas públicas voltadas para o ensino básico, particularmente nas áreas mais deficitárias, é uma iniciativa de desenvolvimento.

A decisão de crescimento econômico e de redução das desigualdades passa pelo combate ao analfabetismo. Porém, o país ainda está amarrado a essa questão. A solução não é uma tarefa simples, no entanto, precisa ser buscada. Se o Brasil quiser ter êxito em suas metas de desenvolvimento, tem de erradicar esse mal. O país apenas será verdadeiramente justo, independente e desenvolvido quando conseguir cumprir o dever de oferecer uma educação plena para todos os brasileiros.



 

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