O Globo
A decisão do Supremo sobre maconha levará à
reação da Câmara, que deve correr com a PEC da criminalização
O Supremo Tribunal Federal formou ontem
maioria para descriminalizar o porte de maconha para consumo pessoal. A
quantidade considerada para esse fim será definida na continuação do
julgamento, hoje, bem como as divergências de interpretação quanto à constitucionalidade
de um artigo da Lei das Drogas que surgiram nos votos dos ministros. A decisão
do STF vai na contramão da Proposta de Emenda à Constituição em discussão na
Câmara, depois de aprovada pelo Senado, por iniciativa do seu presidente,
Rodrigo Pacheco.
Não demorou para que Pacheco reagisse à conclusão do julgamento do Supremo, dizendo que cabe ao Congresso deliberar sobre a questão. Mas a bola estava quicando desde 2015 — quando chegou ao STF a ação cujo julgamento está prestes a ser concluído, depois de sucessivos adiamentos — sem que o Parlamento tomasse a frente do debate.
Como noutros casos controversos, entre os
quais as diversas discussões a respeito da ampliação ou restrição do direito ao
aborto legal ou a definição de um marco temporal para a demarcação de terras
indígenas, o Supremo foi chamado a agir a partir da judicialização, que se dá
no vácuo de ação legislativa.
Quando isso acontece, o Congresso finalmente
acorda da letargia e passa a deliberar, ultimamente em sentido contrário ao
Judiciário. E aí se instala a situação de indefinição quanto a quem dá a última
palavra, o que é grave para a previsibilidade e a segurança em temas que afetam
a vida de setores expressivos da sociedade.
O caso das terras indígenas segue sem
definição clara a respeito dos critérios para a homologação de novas áreas.
Isso porque o STF decidiu no ano passado que o marco temporal da Constituição
de 1988 não era válido, depois o Congresso aprovou Projeto de Lei fixando esse
critério.
Lula vetou o projeto, o Congresso derrubou o
veto e, diante do vaivém, o ministro Gilmar Mendes, relator de ações pela
validade do marco, determinou a abertura de uma conciliação, por entender que
um caso tão complexo não se resolveria pelas “vias tradicionais”.
Trata-se de uma forma branda de admitir um
impasse entre Poderes, algo que não deveria acontecer se cada um cumprisse suas
atribuições constitucionais, e os demais se conformassem com elas.
Solução semelhante foi adotada diante da
confusão criada com as leniências das empreiteiras envolvidas na Lava-Jato, uma
vez que dois ministros, André Mendonça e Dias Toffoli, estavam com ações
diferentes relativas ao assunto, proferindo decisões em sentidos bastante
díspares. Mendonça mandou que o governo e as empresas se entendessem, num
acordo que caminha a passos lentos.
Enquanto isso, Toffoli segue anulando tudo o
que lhe passa pela frente em relação aos acordos. Não está claro como será
possível compatibilizar um acordo que mantenha as leniências e aplique um bom
desconto aos valores com as decisões dizendo que as provas que as embasaram não
valem. Mas é assim que a banda tem tocado.
A recente ressurreição do projeto abjeto que
criminaliza o aborto após 22 semanas mesmo para vítimas de estupro também
nasceu de uma reação do Congresso ao que considera avanço do STF em suas
atribuições.
Mas a ação em que o ministro Alexandre de
Moraes decidiu suspender uma resolução do Conselho Federal de Medicina segue,
com decisões do ministro no sentido de que prefeituras e hospitais as cumpram.
Diante da reação da sociedade, Arthur Lira e deputados tiraram o tema da
vitrine, mas sem arquivá-lo, deixando claro que a ideia é voltar à carga quando
ninguém estiver olhando.
Certamente a decisão do STF sobre maconha
levará à reação da Câmara, correndo com a PEC da criminalização. Até alguém
decidir uma regra de desempate, que, do jeito como a coisa vai, daqui a pouco
pode ser no palitinho ou no cara ou coroa.
Bagunça generalizada.
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