Folha de S. Paulo
Desvalorização do real já parece exagerada,
mas agenda do semestre tem problemas
Quem quer que soubesse predizer o valor
do dólar,
amanhã ou daqui a cinco meses, não contaria para ninguém, claro. Ganharia
dinheiro com isso.
Mas, como é fácil perceber, não se sabe fazer
tal coisa. No que nos interessa, há motivos para mais incertezas, daqui até o
final do ano, o que pode ser um fator de exageros extras nos preços da finança
(juros,
dólar).
Quem quer que se interesse pelo assunto, por preocupação com o país, com a economia, com sua empresa ou com seu dinheiro, tem consciência de que, no caminho adiante, há lombadas de tamanho desconhecido. Antes de pegar essa estrada, o dólar custa R$ 5,45.
Chegamos ao limite do exagero
("overshooting") ou há motivo para mais fuga do real, prudente ou
"especulativa"?
Dólar (mais) caro por tempo considerável
(três, quatro meses) tende a pressionar a inflação, o
motivo mais óbvio de preocupação. Por
tabela, afeta as taxas de juros. Mexe também, por exemplo, com projetos de
investimento e produção —importar máquinas, partes, peças, insumos industriais
tende a ficar mais caro.
A renda dos setores exportadores
(agropecuária, petróleo, minérios) aumenta, tudo mais constante.
Mas o balanço de perdas e ganhos na economia em geral não é simples de prever,
assim como a reação do dinheiro grosso na finança.
Isto posto, quais são as lombadas
previsíveis?
Logo adiante, em 22 de julho, o governo
apresenta sua reavaliação bimestral de receitas e despesas. Não era para ser
fato assim tormentoso, mas
o futuro das contas públicas é motivo de tensão.
Nessa reavaliação, o governo acaba por dizer
se precisa ou não suspender gastos previstos no Orçamento, tendo em vista se
vai ou não conseguir cumprir sua meta de déficit.
Há dúvida sobre a disposição do governo de
conter gasto, mesmo provisoriamente. Na Fazenda há quem defenda uma contenção
(contingenciamento, bloqueio) para "mostrar serviço".
Mesmo que a situação não tenha piorado de
modo relevante, uma mancada do governo tende a afetar juros, dólar etc. Até
fins de julho, de resto, Lula 3 e esse
Congresso precisam arrumar alguma maneira de tapar rombos já previstos (de
isenções de impostos). Vamos ter pelo menos um mês de estrada esburacada.
Em julho, o Congresso em tese tem de aprovar
a Lei de Diretrizes Orçamentárias. No final de agosto, o governo tem de
apresentar o Orçamento para 2025. Se não for "crível", como vêm
dizendo o Banco Central e
os credores do governo, vai haver problema.
No início de novembro, os americanos escolhem
presidente e Congresso. Na avaliação de bancões americanos, uma
vitória de Donald Trump provocaria uma alta do dólar e dos juros de
prazo mais longo —nem se mencione a desgraça para o mundo. Dólar e juros mais
altos são uma encrenca para juros aqui. Arrumar as contas do governo Lula 3
ajuda a atenuar mais esse possível vento contrário.
Notícias ruins sobre a inflação americana são
outro risco. No entanto, quando o gás vaza, qualquer palito de fósforo pode
causar acidentes.
Por exemplo, há quem especule até que um
resultado (mais) desastroso na eleição francesa possa provocar tumulto na União
Europeia e fuga para o dólar. Outro exemplo: uma conjunção de dólar em alta e
petróleo a US$ 85 pode suscitar discussões ruins sobre o preço dos combustíveis
no Brasil, que ficaria ainda mais para trás em relação à cotação internacional.
Em suma, o clima não está bom.
O Banco Central decidiu trancar as janelas
até a tempestade passar (dólar e juros de longo prazo nas alturas, incerteza
fiscal, incerteza sobre o efeito do ritmo da atividade econômica na inflação
etc.). Quanto ao governo, ainda não se sabe se vai adotar prudência pragmática,
ao menos.
Pois é.
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