segunda-feira, 1 de julho de 2024

Alex Ribeiro - BC nada pode fazer sobre a alta do dólar

Valor Econômico

Mercado ainda não tem plena confiança do comprometimento com o controle da inflação do novo BC que será comandado por diretores indicados por Lula

O Banco Central nada pode fazer para impedir a tendência de alta da cotação do dólar. Se a autoridade monetária se arriscar a intervir com vendas de dólares, vai queimar reservas internacionais à toa e perder um pedaço de sua credibilidade na luta contra a inflação.

Na sexta-feira, quando o câmbio rumou para um novo patamar, encostando em R$ 5,60, havia alguma expectativa de que o Banco Central pudesse vender moeda estrangeira, seja à vista, seja por swaps cambiais.

Fontes ouvidas pelo Valor, algumas das quais já pilotaram a mesa de câmbio do BC, de forma unânime recomendam que não sejam feitas intervenções. Elas dizem que a pernada da cotação do dólar reflete o ambiente internacional mais difícil e sinais negativos do governo na política econômica, em particular no fiscal.

O Brasil não é o único país emergente sob pressão: México, Chile e Colômbia estão em situação bem parecida, alguns deles observando desvalorizações ainda mais agudas de suas moedas. Nenhum deles arriscou, até agora, a fazer novas vendas de dólares para segurar o avanço recente de suas moedas.

Só faria algum sentido intervir se acompanhado do anúncio de medidas firmes na área fiscal para lidar com a raiz do problema, pelo menos na parte no nosso controle.

Existem alguns participantes do mercado que incluem a política monetária na lista de culpados pela depreciação. Essa ala diz que o Banco Central mudou o seu discurso, mostrou total coesão na última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), mas no fim das contas a dose de juros não seria suficiente para colocar a inflação na meta.

Essa, é claro, não é a visão do Copom. Em reunião feita há dez dias, o colegiado divulgou projeções de inflação que mostram que, com juros estáveis em 10,5%, é possível baixar a inflação para 3,1% ao fim de 2025, percentual bem perto da meta, de 3%.

Alguns especialistas tomaram com ceticismo essa projeção de inflação. O Copom divulgou dois exercícios. Um pressupõe que a Selic cairia para 9,5% ao fim de 2025, o que levaria a inflação para 3,4%. E outro, como foi dito, manteria o juro em 10,5% e levaria a inflação a 3,1%. O argumento desses especialistas é que, com uma diferença tão pequena de juro, seria difícil baixar a projeção de inflação de 3,4% para 3,1% em 2025.

O Valor levou esse questionamento ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em entrevista na semana passada. Ele explicou que há diferentes formas de fazer o cálculo. Uma é considerar que o mercado antecipa a manutenção dos juros, outra leva em consideração que é surpreendido por juros maiores em cada reunião do Copom. Dependendo dos critérios adotados, o juro pode ter um efeito adicional de 0,15 ponto percentual na inflação.

Isso ajuda a entender como o Copom chegou à conclusão de que a dose de juros de 10,5% ao ano era suficiente naquele momento, mas a discussão parece ter envelhecido, porque não resolve o problema atual, que fica mais grave. O Copom trabalhou com dólar de R$ 5,30 na sua reunião de junho, hoje já está em outro patamar.

O fato é que ninguém está amarrado na projeção de inflação da reunião de junho, sobretudo o BC. A comunicação diz que, naquela data, o juro estável era suficiente para levar a inflação na meta, mas esse não é um “forward guidance”. O juro suficiente, no fim das contas, vai ser aquele que as projeções e todo o resto determinarem que é o necessário. O BC diz que está vigilante, o que também não é um “guidance”, mas uma lembrança de que o comitê vai fazer o que a evolução dos dados disser que é necessário.

Por essas e por outras - incluindo a forte coesão do colegiado na última reunião, que vai seguir adiante -, o fator monetário, se for de fato problema, tende a deixar de ser. O que nos traz de volta à origem dos males: a incerteza fiscal.

Uma ala dos participantes de mercado levanta a tese de que a economia política leva o Banco Central a não intervir. Se fizer intervenções, seguraria a cotação do dólar e tiraria a fonte de pressão que forçaria o mundo político a reagir.

Esse é um argumento interessante, mas nem todos acham que tem premissas corretas. O primeiro problema, apontado por alguns, é que na verdade o Banco Central não teria o poder para tirar o câmbio do lugar, se o fundamento vai contra. O mercado não está desfuncional. Os ganhos teriam vida curta, e seria como enxugar gelo.

O segundo ponto é que, mesmo que o BC tivesse esse poder de intervir, não seria prudente fazê-lo. A intervenção pura e simples no câmbio seria vista como um fraquejo da política monetária. Ou seja, um expediente para deixar de fazer o ajuste necessário na Selic. Assim, para alguns, só faz sentido intervir na taxa de câmbio se vier com uma alta de juro.

Tem uma outra questão que é um desdobramento da anterior. O mercado ainda não tem plena confiança do comprometimento com o controle da inflação do novo BC que será comandado por diretores indicados por Lula, apesar de aqueles que já estão no cargo terem ganhado muitos pontos com a decisão do Copom de junho. Intervenções seriam vistas como uma tentativa de ajudar o mundo político, num novo revés à sua reputação.

 

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