Folha de S. Paulo
Sem a regra da proporcionalidade, parte
significativa dos candidatos negros não terá recursos públicos para financiar
suas campanhas
Em 2022, o número de candidaturas negras superou o de candidaturas brancas
pela primeira vez na história do Brasil. Os registros da Justiça Eleitoral apontam que 50,27% dos inscritos para
disputar as eleições gerais se autodeclaram pretos ou pardos. E o total de
pessoas negras eleitas aumentou 11,4% em relação a 2018.
Esse desempenho foi fruto direto de mudanças promovidas na lei eleitoral. Em
2020, o TSE decidiu que o dinheiro do Fundo Especial de
Financiamento de Campanha e o tempo de propaganda eleitoral gratuita seriam
distribuídos proporcionalmente ao total de candidatos negros dos partidos.
O enfrentamento da disparidade étnica na cena
política nacional por meio do equilíbrio na divisão de recursos públicos
desagradou a muitos. A ponto de unir "caciques" políticos da esquerda
à extrema direita pela aprovação da PEC da Anistia (em dois turnos, no mesmo dia) na Câmara dos Deputados.
A determinação de não compartilhar o poder —especialmente com gente preta—,
resultou no avanço sobre o processo democrático para frear conquista obtida com
décadas de lutas dos movimentos sociais negros.
Contudo, por abjeto que seja, não é de se estranhar vindo de um Parlamento que
tem tomado decisões que podem ser definidas como racistas.
Os exemplos incluem a defesa de dois pesos e duas medidas para enquadrar negros
como traficantes e brancos como usuários de drogas; a criminalização de vítimas que engravidaram de um estupro (sendo que a maioria delas é negra); e a proposta de mudar a Constituição para
reduzir a idade mínima para o trabalho (num país em que a maior parte das
crianças que trabalham é preta ou parda).
Sem a regra da proporcionalidade, parte significativa dos candidatos negros não
terá recursos públicos para financiar suas campanhas. E, por óbvio, isso
afetará a representatividade étnica na política. Resta saber se o Senado irá
compactuar com esse ultraje à democracia.
Pois é.
ResponderExcluir