sexta-feira, 12 de julho de 2024

Bernardo Mello Franco - Na mira da polícia

O Globo

Cláudio Castro saiu em defesa de PMs após abordagem truculenta em Ipanema

Aconteceu na Rua Prudente de Morais, a poucos metros da Praia de Ipanema. Cinco adolescentes caminhavam na calçada quando uma dupla de policiais se aproximou de armas em punho. Os três negros foram revistados com truculência. Os dois brancos foram poupados do esculacho.

A cena resume o racismo nosso de cada dia, naturalizado por quem não costuma se ver na mira de um revólver. Por uma soma de fatores improváveis, a abordagem virou notícia. As imagens foram flagradas por câmeras de segurança. O relato da mãe de um dos meninos viralizou nas redes sociais. Os três alvos da dura eram estrangeiros e filhos de diplomatas.

Diante da repercussão negativa, o Itamaraty chamou representantes das embaixadas de Canadá, Gabão e Burkina Faso para pedir desculpas. Acrescentou que cobraria uma apuração rigorosa do governo do Rio.

Na terça, o governador Cláudio Castro foi questionado sobre o caso. Em vez de reforçar as desculpas, saiu em defesa da PM. “O pessoal ficou falando da questão de racismo, mas tinha jovens negros e brancos”, desconversou. “É muito complicado para o policial saber se é filho de um diplomata ou se é alguém que tá cometendo um delito.”

Castro governa um estado em que mais da metade (58%) da população se declara preta ou parda. Caberia perguntar se ele divide os jovens negros que circulam por Ipanema em apenas dois grupos: os filhos de diplomatas e os suspeitos em potencial.

Na quarta, o governador voltou ao assunto. Repetiu o discurso corporativista e acusou o Itamaraty de “avacalhar” a PM. “Depois de achincalharem a polícia, mandaram ofício. Perderam tempo em mandar ofício”, esbravejou, como se não tivesse que dar explicações pela má conduta da tropa.

Imagens e relatos deixam claro que houve racismo na abordagem policial. Ao negar os fatos e sair em defesa dos PMs, Castro ofende as vítimas e se solidariza com os algozes.

“O trauma dos meninos não é só de um dia. Vai permanecer, e a gente vai ter que cuidar disso”, lamentou a embaixatriz do Gabão no Brasil, Julie-Pascale Moudo. Talvez ela não saiba, mas seu filho foi alvo de racismo no Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial.

 

 

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