quarta-feira, 31 de julho de 2024

Elio Gaspari - A POF de Lewandowski

O Globo

O que falta é segurança, não é polícia

Ricardo Lewandowski entrou no Ministério da Justiça com uma boa biografia, as melhores intenções e dois planos. Um criará o Sistema Único de Segurança, centralizando informações que estão dispersas na árvore do governo. A ideia é boa, restando-lhe o teste da prática. O outro plano é redundante e politicamente tóxico. Trata-se de anabolizar a Polícia Rodoviária Federal, transformando-a numa Polícia Ostensiva Federal, ou POF.

Pretende-se mexer com uma Polícia Rodoviária que funciona, mas tem problemas passados e presentes, berços para encrencas futuras.

Chamada de Polícia Rodoviária do Flávio (Bolsonaro), ela foi usada na tentativa de atrapalhar os movimentos de eleitores nordestinos no segundo turno da eleição de 2022. A manobra falhou porque o ministro Alexandre de Moraes ameaçou prender seu diretor.

Silvinei Vasques está preso desde agosto de 2023 por essa malfeitoria y otras cositas más. Perdeu 13 quilos. Meses antes, na sua gestão, agentes da PRF mataram um cidadão asfixiando-o no porta-malas de uma viatura. Isso no governo Bolsonaro. 

Com Lula 3.0, a PRF tornou-se sede de uma guerra de dossiês contra seu atual diretor. Cinco de seus superintendentes são filiados ao Partido dos Trabalhadores. Tudo o que uma polícia não precisa é de superintendentes filiados a partidos. Esse é um direito de qualquer cidadão, mas guerra de dossiês já é um estágio superior de clientelismo.

A criação de uma Polícia Ostensiva Federal é uma gritante redundância. A União já tem a Polícia Federal, que funciona direito e não mostra os sinais de partidarização já exibidos pela PRF. Com Lula, mandariam petistas. Coisas como essas inibem a ação profissional, resultando em algo que o próprio PT já percebeu: cresce o crime organizado.

Depois dos distúrbios do 8 de Janeiro, saiu do governo a ideia de criar uma Guarda Nacional para proteger Brasília e sabe-se lá mais o quê. A ideia foi arquivada quando chegou ao Planalto o desconforto surgido nas corporações militares. (Em 1889 a República foi proclamada por oficiais do Exército e vivandeiras descontentes com um fortalecimento da Guarda Nacional.)

Um governo petista não precisa criar uma nova polícia. Estima-se que a POF geraria 3 mil nomeações, mas pode-se esperar que os lugares seriam preenchidos por concurso.

Até o governo de Bolsonaro, um presidente que dizia ter “o meu Exército”, a PRF foi uma instituição exemplar. Nele, foi mobilizada até nas tétricas mobilizações da necropolítica do Rio de Janeiro contra comunidades pobres. Com décadas de bons serviços comprometidos e um diretor na cadeia, a PRF não precisa expandir-se. Precisa retornar ao seu quadrado profissional.

Foi a expansão que arruinou a imagem da PRF e encarcerou o doutor Silvinei. Policiais amigos de ocupantes do Planalto são um perigo. Daqui a três semanas completam-se 70 anos da ruína do governo de Getúlio Vargas. Ele deu relevo ao chefe de sua guarda pessoal, e Gregório Fortunato equipou-se com policiais amigos.

Nos primeiros dias de agosto de 1954, dali saiu uma ideia: matar o jornalista Carlos Lacerda. Deu no que deu e, no dia 24, Getúlio Vargas matou-se.

 

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