Folha de S. Paulo
Apesar do desastre da campanha de Biden e do
atentado, eleição nos EUA é muito incerta
É ainda mais temerário fazer prognósticos
sobre uma eleição em que um
candidato quase foi assassinado e outro
pode ser deposto.
Mas os últimos
acontecimentos provocaram mais especulação sobre Donald Trump 2.
Segundo pesquisa YouGov/CBS feita entre os dias 16 e 18 de julho, Trump tem 52%
dos votos, Joe
Biden, 47%. A margem de erro é de 2,7 pontos percentuais.
Dados o estado calamitoso da campanha de Biden, a hipótese de que o sangue de Trump inflaria sua votação e que faltam três meses e meio para a votação, não parece vantagem insuperável. De resto, o resultado da eleição muito depende de meia dúzia de estados que oscilam entre democratas e republicanos, onde a disputa está apertada.
Biden
é impopular, decerto. Apenas 5% dos eleitores consideram
que os EUA vão "muito bem"; outros 19% acham que vai bem
("somewhat well"). Para 33%, vai "mal"; para 42%,
"muito mal".
Mas é fácil perceber que mesmo a péssima
avaliação de Biden não leva ainda mais eleitores para Trump. Poucas pessoas
dizem votar em Biden "principalmente porque gostam dele": 27%. Outras
23% votam no atual presidente porque ele é o candidato democrata; 50% porque
querem derrotar Trump.
Mesmo a desprestigiada vice de Biden, Kamala
Harris, faria disputa mais apertada com o republicano. A eleição parece ainda
aberta.
O escrutínio sobre Trump 2 é mais intenso
também porque ele é a novidade.
Na especulação mais comum, se diz que Trump 2 saberia
manejar melhor a máquina pública, com maior chance de levar à prática suas
ideias. Se diz que seus nomeados implementariam programa mais detalhado, talvez
o da Heritage Foundation, direita conservadora dura, embora o poder de
influência da fundação seja controverso.
Isto posto, Trump é um oportunista picareta
extremo, que muitas vezes se adapta a circunstâncias, embora seja perturbado. O
programa dele é ele.
Poucos antes do atentado, o Wall Street
Journal publicou pesquisa com economistas sobre as consequências
econômicas de Trump 2.
As previsões eram de inflação e juros
maiores, o que influencia a economia do mundo, aqui inclusive. Uma alta
grande de impostos de importação e barreiras à imigração, como quer Trump,
encareceriam produtos, insumos e mão de obra nos EUA.
Ok. Mas essas mudanças pequenas em
indicadores financeiros parecem risíveis perto do tumulto que o republicano
pode causar na ordem política e econômica mundial, para nem falar dos danos à
civilização e à democracia.
Trump diz que quer paz na
Ucrânia. Isto é, rendição: que a guerra termine com os ucranianos cedendo
territórios à Rússia de Vladimir Putin. Quer cortar o subsídio militar para a
Ucrânia e para a Europa. Se levar tais planos adiante, obrigará europeus não
apenas a gastar mais em defesa, o que causaria salseiro fiscal e econômico,
talvez político, mas também a mudar sua diplomacia, elevando a tensão mundial.
Terá uma Suprema Corte a seu favor; quem sabe
um Congresso republicano. Assim, poderia desmontar as agências de regulação e
fiscalização do governo e facilitar a demissão ou manipulação de servidores
federais. Não terá de se preocupar com reeleição (não pode se candidatar a um
terceiro mandato).
Trump pode querer mudar a regulação sobre as "big techs", apertando-a
em uns casos, de desafetos, liberando em outros. Não é liberal: escolhe
vencedores.
Se ficar solto para aumentar ainda mais
déficits e dívidas do governo (cortando impostos), pode causar mudanças
estruturais no sistema monetário internacional e nas taxas de juros dos EUA e
do mundo. Se diminuir impostos sobre empresas, vai colocar pressão sobre o
sistema tributário do resto do planeta também.
Mas a eleição está aberta. Ainda não é tarde
para os EUA e para o mundo.
O colunista estará em férias até agosto.
Na torcida.
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