O Globo
O debate sobre o equilíbrio das contas públicas terá hoje um desdobramento que deve levar o Senado a entrar em conflito com o governo no que concerne às prioridades dos cortes de gastos
O debate sobre o equilíbrio das contas públicas terá hoje um desdobramento que deve levar o Senado a entrar em conflito com o governo no que concerne às prioridades dos cortes de gastos. A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, anuncia hoje uma nota técnica, produzida pelo economista Alessandro Casalecchi, com projeção sobre a estimativa de arrecadação de cada medida compensatória à renúncia fiscal com a renovação da desoneração da folha de pagamento das empresas, tema que tem gerado tensão entre Executivo e Senado e será votado amanhã no Senado.
Em alguns casos falta; em outros, sobra
dinheiro. O ex-deputado federal Marcus Pestana, diretor executivo da IFI, acha
que o Brasil está se mediocrizando, e o debate público não revela “a
profundidade e o drama do estrangulamento fiscal que sacrifica o futuro do
país”. O corte de R$ 15 bilhões é insuficiente, segundo a IFI, para o alcance
da meta, num orçamento líquido do governo federal de R$ 2 trilhões e 138
bilhões, depois de já perder mais de R$ 500 bilhões de gastos tributários
(renúncias).
— Os investimentos já são medíocres, o Brasil
tem investido de 16% a 17% de seu PIB. China, Índia, Coreia do Sul, México,
África do Sul, Cingapura e Taiwan, cerca de 25% a 40% de seu PIB. Isso é
determinante para a nossa reiterada incapacidade de ter um processo de
desenvolvimento ousado, vigoroso e sustentado — diz Pestana.
O equilíbrio das finanças públicas é
fundamental para a vida de todos por suas repercussões na inflação, na taxa de
juros, na dívida pública, no ritmo de crescimento da renda e do emprego e na
confiança no futuro da economia do Brasil, ressalta o diretor da IFI, lembrando
que, por isso, “é fundamental cumprir a meta fiscal prevista no novo arcabouço
de zerar o déficit do governo”.
A IFI projeta que, para cumprir a meta de
déficit zero, seria necessário um corte de R$ 57 bilhões. A regra tem uma banda
de tolerância onde se aceita para 2024 um déficit de 0,25% do PIB, ou seja, R$
28,8 bilhões. Para atingir a margem de tolerância, ainda assim o corte teria de
ser de cerca de outros R$ 28 bilhões. “É claro que fatores como inflação,
crescimento maior do PIB, empoçamento orçamentário e medidas não recorrentes de
receitas podem aproximar o governo da meta ou de sua margem de tolerância”.
Os cortes sacrificam exatamente os
investimentos (PAC, emendas parlamentares, outros investimentos), o que faz com
que o Brasil não cresça de forma mais vigorosa e sustentada pelo baixo nível de
investimento público e privado. Isso é o que define o potencial futuro de um
país, acrescenta Marcus Pestana. Ele disseca o Orçamento:
— O dinheiro que o governo federal disporá em
2024 girará em torno de R$ 2 trilhões e 140 milhões. Nisso, ele já perdeu mais
de R$ 500 bilhões em renúncias de receitas chamadas gastos tributários (Zona
Franca, Simples, isenções no Imposto de Renda, imunidade para entidades
filantrópicas, etc). Dos R$ 2 trilhões e 138 milhões, mais de 60% (R$ 1,3 bi)
ficam com despesas com a Previdência, Benefício de Prestação Continuada (BPC),
Bolsa Família, Abono Salarial e Seguro-Desemprego. Sobram depois de Previdência
e gastos sociais R$ 838 bilhões. A folha de salários dos servidores demanda R$
374 bilhões; o Fundeb, outros R$ 48 bi. Precatórios, outros R$ 36 bi. Outros
Poderes e Distrito Federal, outros R$ 24 bi.
Por isso, ele finaliza, “quando se tem de promover cortes, o sacrifício é nos investimentos, que não são obrigatórios, mas são decisivos para um futuro mais ousado e promissor para o país”.
Pois é.
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