Candidatura de Marçal exige maior vigilância
O Globo
Condenado por furto e acusado de violar lei
eleitoral, surpresa paulistana está longe de ser apenas folclórico
A democracia ganha quando gente de todo tipo
concorre a cargos eletivos. Candidatos com origens diversas e conhecimentos
variados trazem pontos de vista originais, enriquecem o debate e melhoram a
representatividade. Mas, em nome da saúde da própria democracia, nem tudo é
aceitável no embate político.
O Brasil já teve sua cota de personagens folclóricos que aglutinaram a revolta contra os políticos e conquistaram projeção. Foi nessa raia que despontou a candidatura à Prefeitura de São Paulo do dublê de influenciador, coach corporativo e empreendedor das redes sociais Pablo Marçal. Qualquer um que almeje comandar a maior cidade do país deveria manter conduta irrepreensível e respeitar as regras que garantem equilíbrio na disputa. Não é o caso de Marçal. Candidato pelo inexpressivo PRTB, ele não teve pejo em adotar o escândalo como estratégia.
Até agora, não apresentou uma única ideia
sensata para resolver os problemas dos paulistanos. Mas, com seu estilo
provocador e desafiando as leis eleitorais, tem chamado a atenção nas redes
sociais, conquistado pontos nas pesquisas de intenção de voto — e se tornou
tema incontornável na eleição.
Ainda é cedo para fazer prognósticos.
Questionados na pesquisa espontânea sobre em quem votarão, 48% dos ouvidos pelo
Datafolha nesta semana disseram não saber. Mas o avanço de Marçal se faz sentir
nas pesquisas. Na média
mantida pelo agregador Rali, do GLOBO, ele atrai 20% das preferências e aparece
embolado com Guilherme Boulos (PSOL, 23,2%) e o prefeito Ricardo Nunes (MDB,
19,2%). Uma semana atrás, tinha apenas 13,3%.
Sua arrancada foi impulsionada por acusações
sem evidências contra adversários — algumas flagrantemente mentirosas — e
indícios de abuso de poder econômico. Infelizmente, a resposta da Justiça
Eleitoral tem sido tíbia. O Ministério Público Eleitoral suspeita que vídeos de
propaganda são distribuídos por terceiros mediante ganho financeiro, uma
violação flagrante à legislação que rege as campanhas. Mas nada ainda foi feito
contra isso.
O foco em Marçal o tornará alvo preferencial
dos adversários. Não falta munição. Ele foi condenado por furto qualificado,
sob a acusação de participar de quadrilha especializada em fraude bancária pela
internet. Preso durante a Operação Pegasus em 2005, foi condenado pela Justiça
Federal de Goiás, mas recorreu, e o caso prescreveu. Marçal fazia manutenção
dos computadores da quadrilha e nega que estivesse ciente das atividades
ilícitas. Noutro caso, é investigado por tentativa de homicídio, acusado de pôr
a vida de seguidores em risco em expedição a uma região montanhosa em São
Paulo.
Problemas com a Justiça também atingem seu
partido. O vice-presidente do diretório municipal foi condenado por extorsão
mediante sequestro. Homens de confiança do presidente nacional são investigados
por suspeita de ter trocado carros de luxo por cocaína para a facção criminosa
PCC.
Marçal tem até o primeiro turno para enfrentar essa profusão de acusações. Seria salutar se também explicasse aos eleitores o que pretende fazer em caso de vitória e pautasse o debate por propostas para a cidade, e não por acusações descabidas. Nas redes sociais, a estratégia sedutora do coach pode trazer dividendos. Numa prefeitura, dificilmente reverteria em consequências positivas para a população.
Motofaixa exclusiva contribui para reduzir
letalidade no trânsito
O Globo
Depois do sucesso em São Paulo e Santo André,
Rio também adotou iniciativa de forma experimental
Faz bem a Prefeitura do Rio em testar o
modelo das faixas azuis para motos adotado na cidade de São Paulo. O primeiro
corredor carioca começou a funcionar na semana passada de forma experimental,
num trecho de 2 quilômetros da Autoestrada Lagoa-Barra, ainda sem autorização
da Senatran. A faixa tem 1,3 metro de largura e fica no meio da pista, por
enquanto apenas no sentido Lagoa. A velocidade máxima é 60km/h (nas demais é
80km/h). A fase de testes deverá durar quatro meses. Se a iniciativa for
bem-sucedida, poderá ser levada também a um trecho de 1,5 quilômetro da Avenida
Rei Pelé (Radial Oeste), nas imediações do Maracanã.
O objetivo é reduzir acidentes envolvendo
motociclistas e passageiros de motos — 44% das vítimas de trânsito na
Lagoa-Barra —, além de organizar o fluxo na via expressa. Levantamento com base
nas imagens de câmeras mostra que 42% das motos se arriscam em situações
perigosas ao mudar de faixa, ao circular entre os carros ou pelo acostamento. A
motofaixa não é obrigatória. Motociclistas podem usá-la durante as 24 horas do
dia, mas a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio) recomenda o uso quando
o trânsito estiver lento. A Prefeitura instalou radares para monitorar o limite
de velocidade.
Em São Paulo, que tem 7 milhões de carros e
1,3 milhão de motos, a faixa azul começou a funcionar em 2022. Hoje está
implantada em 17 vias, num total de 122 quilômetros de corredores exclusivos. A
meta é chegar a 200 quilômetros até o fim do ano. As faixas não acabaram com
acidentes e mortes (foram registradas pelo menos sete neste ano), mas
contribuíram para aumentar a segurança. Levantamento da Companhia de Engenharia
de Tráfego na Avenida dos Bandeirantes mostra que trafegar no corredor é 20
vezes mais seguro que fora dele. O projeto, inspirado em iniciativas de
Copenhague e de cidades australianas, foi adotado com sucesso também em Santo
André, no ABC paulista.
Um dos principais problemas das cidades
brasileiras são acidentes envolvendo motociclistas. Em 2023, 142 mil vítimas de
acidentes com moto foram internadas no SUS em todo o país — quase 400 por dia,
9,3% acima do ano anterior. São comuns acidentes graves, que deixam sequelas e
incapacitam para o trabalho.
As faixas azuis não resolverão os males de um
trânsito caótico, em que se misturam ônibus, caminhões, carros particulares,
ciclistas e motos ziguezagueando perigosamente. Mas podem trazer bons
resultados nas vias de maior letalidade. As cidades brasileiras deveriam se
inspirar nessas experiências. Toda iniciativa para poupar vidas merece ser
incentivada.
Transição demográfica rápida impõe desafios
Folha de S. Paulo
Com envelhecimento, população brasileira
cairá antes do esperado, em 2042, o que trará impactos em Previdência e saúde
A população
brasileira começará a cair em 2042, seis anos antes do esperado,
segundo a projeção mais recente do IBGE com
base nos dados do Censo 2022.
A rapidez da transição demográfica já traz impactos econômicos e sociais, que
serão crescentes nas próximas décadas e demandam planejamento.
A atualização dos dados elevou a estimativa
da população na data de referência (1º de julho de 2022) em 3,9%, para 210,9
milhões. O pico ocorrerá em 2041, com 220,4 milhões de pessoas, cerca de 12,8
milhões abaixo da estimativa anterior. A partir daí, haverá redução para 199,2
milhões em 2070.
A transformação etária da qual decorre essa
trajetória é notável e já presente. Entre 2000 e 2022, a taxa de fecundidade
recuou de 2,32 para 1,58 filho por mulher. O número de nascimentos no país, que
em 2022 foi de 2,6 milhões, será de 1,5 milhão em 2070.
A parcela da população de zero a 14 anos de
idade caiu de 30% para 20,1%, enquanto a representação dos acima de 60 anos
saltou de 8,7% para 15,6%. Essa tendência prosseguirá —pela projeção, em 2070
os mais jovens serão 12%, e os mais idosos, 37,8%.
Essas mudanças ensejam, desde já, ampla revisão
de programas e criação de políticas públicas.
Um caso óbvio é a sustentabilidade das contas
da Previdência com o aumento da longevidade e da proporção de aposentados.
Programas de fomento ao emprego e requalificação de mão de obra tornam-se ainda
mais relevantes, conforme se estende a vida ativa.
Novas formas de contribuição alinhadas às
diferentes modalidades de relações de trabalho também
precisam ser incentivadas.
Para reduzir déficits, além de ampliar as
fontes de contribuição, serão essenciais novas reformas no Instituto Nacional
do Seguro Social (INSS) e nos regimes
dos servidores públicos civis e militares.
Outra consequência da mudança demográfica é a
alocação de recursos em educação e saúde.
Com menos crianças nas escolas, deve-se priorizar a melhoria de qualidade na
educação básica com os recursos existentes, já relativamente elevados de acordo
com os padrões internacionais.
Será necessário ampliar aportes na área de
saúde, tanto públicos quanto privados. Custear o SUS, melhorar a
regulação de seguros, incorporar tecnologia e ampliar a produtividade são temas
a serem trabalhados continuamente.
Por fim, tão melhor o país estará preparado
para a transição demográfica quanto mais próspero for, o que depende de ampliar
as oportunidades de emprego. Para tanto, é imperioso reconstruir a poupança e a
efetividade da ação estatal, o que demanda ampla reforma administrativa e
orçamentária.
Ditadura escancarada
Folha de S. Paulo
Decisão da alta corte da Venezuela completa
descaramento da farsa de Maduro
O roteiro autocrático cumpriu-se na Venezuela.
A suposta vitória do ditador Nicolás
Maduro no pleito de 28 de julho foi confirmada —sem
possibilidade de recurso nem divulgação das atas eleitorais— pelo Tribunal
Supremo de Justiça (TSJ) na quinta-feira (22).
Aos protestos dos cidadãos, o regime reage
com brutal repressão estatal e paramilitar, prisões políticas e perseguições às
lideranças da oposição. Às constatações das Nações Unidas, do Centro Carter e
da Organização dos Estados Americanos (OEA) de que os
resultados oficiais das urnas são ilegítimos, faz vista grossa
Tudo indica que Caracas continuará
como antes: desacreditada pelo Ocidente e imersa no atoleiro econômico e
repressivo que levou cerca de 8 milhões de venezuelanos a deixarem o país.
Contudo, agora, com a ditadura escancarada
para quem ainda tergiversava sobre seu caráter, muito mais isolada.
A decisão do TSJ, corte tão subserviente ao
regime quanto o Conselho Nacional Eleitoral, obstrui a potencial mediação dos
vizinhos Brasil e Colômbia para
tentar resolver a crise. A hipótese —insensata, diga-se— de nova eleição,
cogitada por Luiz Inácio Lula da
Silva (PT),
acabou sepultada.
Ao possuírem vastas fronteiras amazônicas com a Venezuela, os dois países são desafiados a optar entre reconhecer ou não um governo ditatorial que se estenderá até pelo menos 2031. Nos cálculos diplomáticos, porém, não há ilusão de que o reconhecimento preservaria o grau de interlocução que mantinham antes com Caracas.
Insistir na divulgação das atas, por mais que
Maduro ridicularize a pressão, será o único caminho
moralmente aceitável para as democracias brasileira e colombiana.
Não só porque EUA, União Europeia e 11 países
latino-americanos assim se manifestaram, em consonância com a ONU e a
oposição venezuelana. Mas, sobretudo, porque Maduro se tornou uma ameaça
latente à segurança na América do
Sul e a democracias já sob estresse da polarização política na
região.
Crer em sentença imparcial da alta corte da ditadura, como Lula chegou a sugerir, implica tolerância com o despotismo ao lado.
O espectro do niilismo político
O Estado de S. Paulo
O vandalismo que Marçal representa não surgiu
da noite para o dia. Para enfrentá-lo, é preciso que o radicalismo do amor à
política se imponha ao radicalismo dos que odeiam a política
Há algo de podre na democracia brasileira. O
mau cheiro não é de agora. Lá se vão mais de 10 anos desde as Jornadas de Junho
de 2013.
Nos últimos 21 anos, o PT governou por 15.
Mesmo após os ardis antidemocráticos de compra de parlamentares no primeiro
mandato de Lula da Silva, o partido conquistou mais três mandatos consecutivos,
o suficiente para engendrar outro esquema de cooptação da máquina pública a
serviço de seu projeto de poder, promover algumas das ditaduras mais sangrentas
do mundo e afundar a economia na pior crise dos tempos modernos.
Então surgiu o fenômeno Jair Bolsonaro. Tão
grande foi a indignação popular com a crise moral da República, que o deputado
do baixíssimo clero, sob sua fúria antipetista, conseguiu magnetizar os ânimos
antissistema. Mas tão incompetente e truculento foi o seu governo, que o PT
retornou ao poder propagandeando-se como “salvador da democracia”.
Nas eleições deste ano estava contratada uma
reedição dessa polarização nas praças municipais. Mas, desafiando o Axioma de
Tiririca, a coisa ficou pior. São Paulo é exemplar. Segundo as últimas
pesquisas, o aventureiro Pablo Marçal foi alçado ao patamar de “terceira
força”, em condições de igualdade com o candidato do PT, Guilherme Boulos, e
com o candidato de Bolsonaro, o incumbente Ricardo Nunes.
Marçal é o produto de uma espécie de “seleção
natural” da extrema direita. Dizendo barbaridades que nem Bolsonaro diria,
Marçal cativa o eleitorado bolsonarista à revelia de Bolsonaro, como se
demonstrasse que o ex-presidente não é hegemônico na direita antidemocrática.
Mas o espectro do embate entre direita e
esquerda é só parte do fenômeno, talvez a menos relevante. Se Bolsonaro usou a
descrença na política para alimentar seu discurso contra a esquerda, Marçal –
ao contrário de Bolsonaro, um corpo genuinamente estranho ao sistema – usa a
impopularidade da esquerda como pretexto para atacar seu verdadeiro alvo: a
política.
Goste-se ou não do conteúdo lulopetista, a
rigor o PT é, na forma, o único partido político brasileiro digno desse nome,
com um programa claro e uma militância organizada em escala nacional. Bolsonaro
é um político sem partido, ou de muitos partidos, mas também tem uma militância
organizada e algo que se pode chamar de ideologia: a nostalgia da ditadura, o
ressentimento com as minorias, a luta contra a esquerda. No poder, um e outro
se “institucionalizaram”, por assim dizer, ainda que na forma de conchavos com
os potentados de Brasília e soluções de compromisso com oligarquias regionais.
É uma política bruta, divisiva, cínica, autoritária, mas, ainda assim,
política.
Já o voto de confiança em Marçal é um voto de
desconfiança na própria política – um tiro de bazuca contra o establishment,
um voto de negação, de ruptura, de vandalismo.
Tão profundo desencanto não acontece no vácuo
e não é obra de um dia. Com todos os seus méritos, a Constituição “cidadã” não
entregou suas promessas de cidadania. Os serviços públicos funcionam mal. A
desigualdade é gritante. As classes dirigentes estão entupidas de privilégios.
Os partidos são meros balcões de negócios. O Judiciário se intromete na arena
política, ora confrontando Poderes, ora se colocando como uma espécie de Poder
tutelar.
Não se pode abafar o grito de desespero nem
menosprezar a revolta do eleitorado. Há algo de podre na democracia brasileira.
Mas não se reformará a democracia destruindo a democracia. Diante de uma
manifestação tão formidável de antipolítica, é preciso valorizar ainda mais a
política.
Uma candidatura niilista como a de Marçal não
levará, por definição, a nada. Mas fugir dos debates, como fizeram os
candidatos de São Paulo, foi a pior resposta possível. O vandalismo que Marçal
representa não surgiu da noite para o dia. Para enfrentá-lo, é preciso que o
radicalismo do amor à política se imponha ao radicalismo dos que odeiam a
política. Há algo maior em jogo que a disputa de ideologias. É a sanidade da
democracia.
O maná dos fundos de pensão
O Estado de S. Paulo
Intenção do governo de afrouxar as amarras que protegem investimentos de fundos de pensão de estatais desrespeita direitos dos funcionários que poupam para melhorar aposentadoria
O presidente Lula da Silva reuniu-se em
Brasília com presidentes de fundos de pensão de estatais e com o
diretor-superintendente da Previc – que supervisiona o setor de previdência
complementar –, todos nomeados por ele, para discutir a “flexibilização” dos
critérios de investimento dessas instituições. Reportagem do jornal O
Globo mostrou que a intenção é fazer com que os fundos retomem
investimentos em obras do governo, em especial no Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). Em resumo, a ideia é reduzir o rigor adotado após os
prejuízos bilionários que as instituições sofreram ao bancar os delírios
lulopetistas.
O capital administrado pelos fundos de pensão
explica a cobiça do governo. Juntos, os investimentos de Previ (dos
funcionários do Banco do Brasil), Petros (Petrobras), Funcef (Caixa) e Postalis
(Correios) somam mais de meio trilhão de reais – mais especificamente, R$ 509,5
bilhões, ou 43% do total de R$ 1,183 trilhão de 274 entidades de previdência
privada em atuação no País. Os dados, referentes a 2023, constam do consolidado
estatístico da Abrapp, associação que reúne os fundos de previdência e que registrou,
no ano passado, o melhor resultado do segmento em 10 anos, com superávit de R$
14 bilhões.
Saldos positivos como esse são um alívio para
os quase 3 milhões de participantes dessas entidades que se dispuseram a
formar, durante os anos de atividade laboral, uma poupança previdenciária
complementar para reforçar a aposentadoria. E aí está o ponto central da
questão: o objetivo dos investimentos dos fundos é garantir reserva financeira
para honrar o pagamento de aposentados e pensionistas. Simples assim.
Contrariando a lógica, a gestão lulopetista
continua a enxergar nas instituições previdenciárias vinculadas às estatais o
braço financeiro para obras que o orçamento público não tem condições de
bancar. Ainda que, cumprindo ordem do chefe, o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, tenha alegado que está em curso apenas uma mudança regulatória, o
documento da Previc deixa claro que a medida contempla o programa do governo
“visando cumprir os compromissos e as metas em favor da sociedade” e “do
desenvolvimento do País”.
A Previc é um órgão do governo, vinculado ao
Ministério da Previdência Social, mas não é sua função, nem de forma lateral,
cumprir metas de desenvolvimento. Seu papel, como fiscalizadora das entidades
fechadas de previdência complementar, é assegurar que os participantes desses
fundos recebam o que lhes é de direito ao se aposentarem, sem o risco de terem
de pagar – com descontos em aposentadorias e pensões – por aplicações mal
geridas feitas para atender este ou aquele governo, ainda que com as melhores
intenções.
Foi exatamente esse o prejuízo que tiveram os
participantes de Petros, Funcef e Postalis com operações questionáveis de
gestões petistas. Se o uso de estatais, como Caixa e Correios, e empresas
mistas, como o Banco do Brasil e Petrobras, para fomentar políticas públicas já
é abusivo, estender o método às caixas de previdência dos funcionários dessas
empresas é condenável sob todos os aspectos.
Investir em infraestrutura faz parte das
características dos fundos de pensão porque são investimentos com retorno no
longo prazo e risco moderado, na maior parte das vezes. Mas cada caso tem de
ser avaliado de forma crítica, tendo em vista que são projetos cujo retorno é
atrelado às necessidades atuariais dessas instituições. Parece elementar, mas
não foi o que se viu no passado recente, quando a participação dos fundos nos
projetos petistas criou passivos bilionários, foi alvo de investigações da Polícia
Federal e prejudicou centenas de milhares de participantes. Somente no Postalis
o rombo é de R$ 15 bilhões; na Petros, gira em torno de R$ 30 bilhões.
A mudança que está sendo elaborada para
soltar amarras colocadas como proteção dos investimentos dos fundos de pensão
parece mais um atalho aberto entre os caminhos para reproduzir inclassificáveis
desacertos do modo petista de governar. O lulopetismo mostra, a cada passo, que
não sabe fazer de outro jeito.
Transição com civilidade
O Estado de S. Paulo
Sucessão no Banco Central tem rito suave, a
despeito do bombardeio de críticas do Planalto
A transição no Banco Central (BC) já começou,
independentemente do presidente Lula da Silva e da campanha injuriosa promovida
pelo PT acerca da atuação da autoridade monetária. Ainda que não tenha sido
oficialmente batido o martelo sobre o próximo presidente da instituição, os
sinais emitidos pelo BC indicam o início do rito de passagem de bastão de
Roberto Campos Neto para Gabriel Galípolo – um dos diretores indicados por Lula
e o mais provável sucessor de Campos Neto – com um nível de civilidade que deveria
ser o padrão republicano, mas que surpreende diante de um cenário político
drasticamente contaminado pela polarização.
Campos Neto, que chegou a ser classificado
por Lula em 2022, quando ainda candidato, como um “economista competente”,
passou a ser bombardeado pelo presidente por perseguir o controle
inflacionário, ora com manutenção dos juros, ora com quedas mais suaves do que
as almejadas pelo governo. Desde o início do terceiro mandato do petista não
houve aumento na taxa, o que não foi suficiente para arrefecer a artilharia
lulopetista.
Conforme se aproxima o fim do mandato do
atual presidente do BC, em dezembro, o discurso de Lula tem mudado. Chegou a
dizer que o próximo presidente do banco terá de ter coragem de reduzir a taxa e
ter “a mesma coragem” de aumentar, se necessário. A fala ocorreu dias depois de
Galípolo declarar que a alta da taxa de juros é uma possibilidade à mesa nos
debates no banco. Lula deixou a estranha sensação de que a autoridade monetária
pode aumentar os juros desde que com o seu consentimento.
Campos Neto, Galípolo e os demais sete
membros da diretoria colegiada do BC têm deixado evidente que a autonomia da
instituição, desde 2021 garantida em lei complementar, não é decorativa. É essa
atribuição que assegura decisões técnicas e profissionais nas questões
monetárias para manter a estabilidade de preços, o objetivo maior do BC. Os
mandatos dos diretores, instituídos de forma alternada por quatro anos, são uma
ferramenta para salvaguardar essa autonomia.
Numa estratégia calculada, Galípolo foi o
primeiro a falar publicamente depois da decisão do Comitê de Política Monetária
(Copom) do fim de julho, que manteve a taxa básica de juros em 10,5% ao ano
(para irritação do Planalto). Com tranquilidade, disse que uma eventual alta
dos juros não está descartada, embora a ata do Copom não tenha emitido qualquer
orientação futura. Ao contrário, uma política mais restritiva está também na
mesa, a depender do cenário interno e externo. E aí, ressalte-se, o compromisso
fiscal do governo tem papel primordial.
Campos Neto veio a público depois com declarações no mesmo tom. O recado foi claro de uma preparação sucessória. Em entrevista recente ao jornal O Globo, o presidente do BC confirmou que internamente a transição está sendo “supersuave”, com um forte espírito de equipe. Galípolo vai em linha semelhante, o que demonstra que, quem quer que seja o indicado para o cargo, a autoridade monetária tende a concentrar seu compromisso na manutenção do poder de compra da moeda.
Fraude deslegitima novo mandato de Maduro
Correio Braziliense
Esgotou-se a capacidade de intermediação de
uma solução que preservasse a democracia na Venezuela, como defendiam Brasil e
Colômbia. Maduro optou pelo fato consumado
A decisão do Tribunal Supremo de Justiça
(TSJ) da Venezuela de respaldar a vitória de Nicolás Maduro nas eleições
venezuelanas sem a apresentação das atas das mesas eleitorais deslegitima o
novo mandato do presidente Venezuelano, que pretende governar o país por mais
seis anos. Maduro, agora, lidera um regime autoritário e militarista, que está
sendo repudiado internacionalmente.
Nesta sexta-feira, Estados Unidos, União
Europeia e mais 10 países da América Latina — Argentina, Costa Rica, Chile,
Equador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai —,
além da Organização dos Estados Americanos (OEA), rejeitaram a decisão da Corte
venezuelana, manipulada por Maduro, que respaldou a decisão do Conselho
Nacional Eleitoral (CNE), a justiça eleitoral do país.
A vitória de Maduro foi proclamada no
próprio dia da eleição, mas o CNE não apresentou provas de que esse era mesmo o
resultado das urnas. A contabilidade da oposição, com base nas atas das mesas
eleitorais, apontava a vitória, por ampla margem, do oposicionista Edmundo
González, que, agora, é perseguido. Na clandestinidade, ele e a líder
oposicionista Maria Corina Machado, que fora impedida de disputar o pleito e
lidera os protestos populares contra a fraude eleitoral, correm risco de vida.
O Brasil deve fazer um comunicado conjunto
com a Colômbia sobre a decisão do TSJ venezuelano. O presidente Luiz Inácio
Lula da Silva está em uma situação delicada, porque se propôs a mediar o
impasse, mas não foi levado em conta por Maduro, muito pelo contrário. Para
piorar, a nota do PT que reconheceu a vitória de Maduro no dia seguinte à
eleição comprometeu a credibilidade de Lula quanto ao seu empenho a favor do
reconhecimento do resultado das urnas.
A situação da Venezuela é uma ameaça de
desestabilização das democracias da América Latina, na trilha do que ocorreu na
Nicarágua, onde Daniel Ortega se tornou um ditador. Além disso, por seu
alinhamento com Cuba, Rússia, China e Irã e devido ao projeto expansionista de
Maduro, principalmente em relação à Guiana, com objetivo de anexar a província
de Essequibo, altera profundamente a geopolítica na América do Sul. Não podemos
aceitar o surgimento de uma Coreia do Norte, um país fortemente armado e em permanente
conflito com vizinhos, na fronteira com o Brasil.
Não à toa, o porta-voz do Departamento de
Estado dos Estados Unidos, Vedant Patel, afirmou que o respaldo do TSJ à
vitória de Maduro "não tem nenhuma credibilidade". A OEA, por sua
vez, "rechaça completamente" a decisão do tribunal "com base em
um boletim parcial emitido de forma oral, com números que evidenciavam
impossibilidades matemáticas". E a União Europeia não reconhece o novo
governo de Maduro "antes de ver provas de que ele venceu as
eleições", segundo o alto representante para Assuntos Exteriores, Josep
Borrell.
Como a presidente do Tribunal Supremo, Caryslia Rodriguez, afirmou que a decisão é irreversível e que quem contestá-la não poderá concorrer nas próximas eleições, esgotou-se a capacidade de intermediação de uma solução que preservasse a democracia na Venezuela, como defendiam Brasil e Colômbia. Maduro optou pelo fato consumado. Diante disso, o presidente Lula não reconhecer a eleição de Maduro, mesmo que isso implique em rompimento de relações diplomáticas, tornou-se uma necessidade imperiosa, a não ser que renuncie aos valores democráticos que garantiram sua volta ao poder.
POr que ele ainda respira? Porque a democracia é militante, mas é frouxa. MAM
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