quarta-feira, 4 de setembro de 2024

José Ronaldo de C. Souza Jr. - Crescimento acima do potencial, riscos e perspectivas

Valor Econômico

Apesar do crescimento recente, investimento ainda está apenas retornando aos valores observados no final de 2022, com taxas que permanecem abaixo de 17% do PIB

Nos últimos anos, o desempenho do PIB brasileiro tem surpreendido positivamente. Em 2023, o crescimento foi impulsionado não apenas pelo setor agropecuário, que se recuperou de uma safra perdida no ano anterior, mas também por uma combinação de fatores que estimularam a demanda. Ainda assim, esse crescimento acima do esperado não garante que continuaremos a ter surpresas positivas em relação às projeções de crescimento nos próximos anos.

Em contraste, o cenário para os investimentos tem sido mais desafiador. Após uma queda de 3% em 2023, o primeiro semestre de 2024 trouxe sinais de recuperação. No entanto, apesar dessa recente alta, o nível de investimento ainda está apenas retornando aos valores observados no final de 2022 e a taxa de investimento permanece abaixo de 17% do PIB. O crescimento recente é um alento, mas o caminho para alcançar níveis de investimento que possam impulsionar de forma consistente o crescimento da capacidade produtiva ainda é longo.

Essa modesta recuperação nos fluxos de investimentos reflete-se no crescimento do estoque de capital. Dados do Ipea indicam um aumento ligeiramente acima da estabilidade nos 12 meses terminados em março. Este é um indicativo de que o produto potencial da economia — ou seja, a capacidade máxima de produção sem gerar pressões inflacionárias — está crescendo lentamente.

Além disso, outros indicadores, como a queda significativa da taxa de desemprego para a mínima histórica desde o início da série do IBGE em 2012, e o aumento do nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação para o nível mais alto desde 2014, sugerem um cenário em que o PIB está crescendo a taxas superiores ao produto potencial.

Esse crescimento mais elevado foi viável devido à margem de ociosidade criada pelas crises econômicas que o Brasil enfrentou entre 2014-2016 e em 2020, que deixaram o PIB significativamente abaixo do seu potencial por um período prolongado. No entanto, é fundamental reconhecer que, no longo prazo, crescer acima do potencial tende a gerar pressões inflacionárias e é insustentável.

Outros fatores também adicionam complexidade a esse cenário. O crescimento real dos gastos públicos projetado para o próximo ano deverá ser quase inteiramente absorvido por despesas obrigatórias, como transferências de renda e gastos com pessoal. Além disso, a receita esperada no Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2025 pode estar superestimada, considerando que o PIB projetado de 2,64% parece pouco factível num cenário em que se pretende manter a inflação dentro da meta. Também há uma expectativa de arrecadação de R$ 168 bilhões em receitas extraordinárias, que dependem da concretização de acordos com devedores da União e da aprovação de medidas no Congresso. Tudo isso sugere que, no ano que vem, haverá novamente um contingenciamento significativo das já limitadas despesas discricionárias, o que pode impactar negativamente os investimentos públicos.

O desequilíbrio fiscal e a falta de perspectiva de melhora sustentável na trajetória das despesas públicas adicionam incerteza ao cenário macroeconômico, criando um ambiente desafiador para a manutenção da estabilidade e desestimulando investimentos privados de longo prazo. Esse desequilíbrio fiscal coloca um peso ainda maior na responsabilidade da política monetária para manter a inflação sob controle, gerando uma pressão de alta de juros.

Em resumo, o Brasil tem experimentado um crescimento acima do potencial nos últimos anos, mas a ociosidade está se esgotando. A demanda, fortemente estimulada por política fiscal expansionista, não poderá sustentar esse ritmo de crescimento por muito mais tempo. Para 2025, o cenário aponta para uma desaceleração do crescimento, com a expectativa de que a expansão do PIB fique abaixo de 2%, refletindo os limites impostos pela capacidade produtiva e a necessidade de ajuste das condições estruturais.

 

Um comentário:

  1. Ao contrário do que escreve o colunista, este crescimento econômico da economia brasileira está ABAIXO do potencial, e não acima. Analistas mercadófilos e economistas neoliberais SUBESTIMAM nossa capacidade de crescimento e os incentivos governamentais, que têm "surpreendido" apenas quem seguidamente despreza e/ou critica a política econômica federal, frequentemente por motivos meramente ideológicos.

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