O Globo
Nunes não deve a Bolsonaro a liderança que recuperou em São Paulo, muito menos a vitória fácil contra seus adversários num provável segundo turno
As pesquisas Quaest sobre as eleições municipais no Rio e em São Paulo deixaram claro que o ex-presidente Bolsonaro não tem conseguido impor seus candidatos nas duas principais capitais do país. Em São Paulo, a situação fica mais explícita, pois ele errou ao praticamente deixar de lado a candidatura do prefeito Ricardo Nunes depois que o ex-coach Pablo Marçal surgiu como adversário surpresa.
A pesquisa de ontem mostra não apenas que Nunes recuperou popularidade depois da propaganda eleitoral no rádio e televisão, como Marçal está à frente de Boulos mesmo depois da briga política com o clã Bolsonaro e de ser barrado no palanque da Paulista. O resultado, ainda empate técnico entre os três candidatos, não se deve a nenhuma ação de Bolsonaro a favor de Nunes, muito menos de Marçal.
O fato de os dois estarem à frente da disputa
neste momento indica, em vez de uma vitória bolsonarista, uma derrota de seu
líder, que tentou se equilibrar entre os dois candidatos mais próximos e acabou
perdendo a influência decisiva. Ao contrário, para não ter de escolher entre os
dois, Bolsonaro decidiu abandonar a disputa paulistana e não pretende visitar a
cidade até o dia da eleição. Mais grave: nenhum dos dois é mesmo de seu grupo
político.
Nunes não deve a Bolsonaro a liderança que
recuperou em São Paulo, muito menos a vitória fácil contra seus adversários num
provável segundo turno. No momento, pesa mais a propaganda de sua gestão à
frente da capital paulista. Os bolsonaristas se dispersam entre Nunes e Marçal,
sem que Bolsonaro possa controlar esses votos. O mais grave para os
bolsonaristas é a performance de Marçal, que está na segunda posição por conta
e risco dele mesmo, sem obras para mostrar e sem apoio oficial da máquina
bolsonarista.
Em vez disso, o apoio formal dos evangélicos,
por meio do pastor Silas Malafaia, foi-lhe negado publicamente e de maneira
agressiva. Malafaia chamou-o de psicopata. Nunes, por sua vez, foi deixado de
lado pela família Bolsonaro quando parecia que Marçal o ultrapassaria. O peso
do bolsonarismo na vitória em São Paulo será menor do que podia ser avaliado no
início da campanha. Nunes temeu a “cristianização” em favor de Marçal, mas
acabou demonstrando que o tempo na propaganda eleitoral da televisão ainda tem seu
valor de convencimento do eleitorado.
Sem tempo próprio, e sem apoio formal de
Bolsonaro, dependendo apenas das redes sociais, Marçal mostra resiliência,
enquanto Boulos depende mais que nunca de Lula empenhar-se em sua campanha. Num
hipotético segundo turno contra Marçal, o candidato da esquerda tem chance de
vencer, embora estejam no momento ainda empatados. Mas perde sem apelação para
o prefeito paulistano.
No Rio, a situação do bolsonarismo, em seu
berço eleitoral, é mais frágil ainda. A cada pesquisa vai-se firmando a
possibilidade de o prefeito Eduardo Paes se eleger no primeiro turno. Bolsonaro
promete permanecer na cidade, e na campanha de seu candidato Ramagem, nos
últimos dias da campanha do primeiro turno. Pode não ser suficiente para uma
arrancada.
A pesquisa Quaest deu uma freada nas
expectativas de crescimento que permitisse vislumbrar uma reação que o coloque
no segundo turno. Embora tenha subido de 9% para 13%, viu Eduardo Paes subir os
mesmos 4 pontos percentuais. Se já se surpreendera com o crescimento de Paes
para 60%, pois pensara que ele já atingira seu máximo, agora viu o teto do
adversário aumentar. O candidato do PL deixou escapar, na sabatina de ontem do
Grupo Globo no rádio e nos jornais, que estudos mostram que o eleitor carioca
só se decide mesmo na última semana da campanha.
Não citou, mas me lembrei do fenômeno Wilson
Witzel, que venceu na última semana do primeiro turno a disputa de 2018 contra
o então prefeito Paes. Pode ser que essa seja a esperança de Ramagem, mas o
clima eleitoral hoje não é o mesmo de quando nasceu o fenômeno Bolsonaro.
Pois é.
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