Folha de S. Paulo
Dólar e commodities mais baratos ajudam, mas
remendo no arcabouço fiscal é essencial
Um ano depois de começar a baixar a Selic,
o Banco Central começou
a dar ré, o que era previsível desde as confusões de abril e maio deste ano. A
Selic baixara de 13,5% para 10,5% ao ano. Nesta
quarta-feira (18), foi a 10,75%. Sendo otimista, chega a 11,5% no
início de 2025. Pelo andar atual da carruagem, vai a 12%. No comunicado em que
anunciou a Selic maior, mais seco do que de hábito, o BC não disse mais nada de
interesse maior. Melhor assim. Menos confusão.
O que pode contribuir para que a Selic volte a cair logo? O preço do dólar baixar, em parte graças ao aumento da diferença de taxas de juros nos EUA e no Brasil (a "Selic" deles caiu meio ponto percentual também nesta quarta). Nesta quarta, o dólar já ficou menos salgado, mas a taxa de câmbio anda volátil e difícil de prever, para variar.
É preciso que o preço das commodities, soja,
milho, trigo, petróleo, fique por onde está —se cair muito mais, cria outros
problemas: menos crescimento, menos receita para o governo. Com o preço do
barril na mesma e dólar menos salgado, a Petrobras teria
mais motivos para baixar o preço dos combustíveis. Seria bom também que
chovesse, o bastante para evitar prejuízos nas
lavouras e termos preços melhores de eletricidade. Mas,
infelizmente, ainda não sabemos fazer a dança da chuva.
Mais importante, seria essencial que Lula 3
apresentasse um plano de bons remendos no arcabouço fiscal, desculpem a
obviedade tediosa —ou revoltante, no caso de quem é convicto de que déficits e
dívida crescente são irrelevantes. Fernando
Haddad, petista, de esquerda, acha que não é irrelevante.
A situação das contas federais não deve mudar
grande coisa em 2024 e 2025. Mas um plano de contenção do aumento de gastos em
Previdência, saúde e educação, para 2026 e além, teria algum feito imediato.
Facilitaria muito a vida de Gabriel
Galípolo, futuro
presidente do BC. Aliás, é o plano que está na cabeça de todo o
mundo na direção do BC, inclusive dos nomeados por Lula.
A Selic, taxa de curtíssimo prazo, afeta as
taxas dos demais prazos nos negócios do mercado, do atacadão de
dinheiro, onde se define o custo dos empréstimos para o governo, o piso das
taxas de juros para a economia inteira. Mas não as determina.
Desde abril, as taxas de prazo superior a
dois anos já estavam em nível mais alto do que em agosto de 2023, quando a
Selic começara a baixar. A mexida na
meta fiscal de 2025, a falação ignara da maioria do governo sobre
déficit e juros, as confusões nas mensagens do BC e rolos na finança mundial
elevaram os juros na praça, é tedioso lembrar. Como os donos do dinheiro grosso
temem, na prática, que o arcabouço fiscal vá rachar em algum momento (2026?),
cobram mais (juro maior), por conta.
Lula 3 vai apresentar um plano de remendo
ou reforma do
arcabouço? Só vendo para crer. Se o fizesse até o início do ano
político de 2025, daria contribuição relevante para um crescimento mais estável
e para a contenção da dívida.
O país cresce mais do que quase todo o mundo
esperava. A inflação
está fora da meta, mas algo contida, estável e, para padrões brasileiros, baixa.
Mas as taxas de juros (atenção para o plural) estão em níveis teratológicos.
Vão levar a dívida do governo a níveis assustadores, dado, de resto, que não
haverá superávit primário nas contas públicas tão cedo. Isso não vai prestar.
Vai dar ruim!
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