Valor Econômico
Para secretário, novo sistema vai igualar o jogo da concorrência entre empresas
O novo sistema de impostos sobre o consumo
vai favorecer o empreendedorismo, disse à coluna o secretário extraordinário da
Reforma Tributária, Bernard Appy. Um de seus efeitos será igualar o jogo da
concorrência entre empresas, ao reduzir a quantidade de tratamentos específicos
que hoje privilegiam setores com maior poder de pressão política.
“Quando o sistema se torna mais neutro, os
mais eficientes são favorecidos”, comentou. “E o estímulo à eficiência é
positivo para o empreendedorismo.”
O sistema tributário que se consolidou nas últimas quatro décadas abriu espaço para uma miríade de incentivos fiscais. “Hoje, às vezes é mais importante ter capacidade de negociação de um bom benefício fiscal do que ser eficiente”, disse o secretário. As empresas maiores também se beneficiam de planejamento tributário, algo fora do alcance das micro e pequenas, acrescentou.
Essa mudança no ambiente competitivo, porém,
não ocorrerá de uma hora para outra. É um processo, explicou Appy. O novo
sistema entrará em funcionamento aos poucos, começando com uma fase de testes
em 2026, seguida por uma implementação gradual a partir de 2027 até 2033.
A reforma tributária, além disso, não
eliminou totalmente os tratamentos diferenciados. Se não houvesse exceção
alguma à regra geral, a soma das alíquotas da Contribuição sobre Bens e
Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), criados na reforma,
seria 21,5%. Por causa das exceções, a alíquota-padrão está no momento em
27,97%, pelos cálculos do Ministério da Fazenda.
Além de aplainar o terreno da concorrência, a
reforma vai trazer novas opções de tributação para as micro, pequenas e médias
empresas, apontou Melina Rocha, consultora internacional em Imposto sobre o
Valor Agregado (IVA) e integrante do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação
Getulio Vargas.
As empresas do Simples Nacional poderão optar
por aderir ou não ao novo sistema. Existirá a possibilidade de recolher IBS e
CBS pelo modelo novo e os demais tributos no sistema simplificado atual.
“A reforma é positiva porque traz todas as
opções para o empreendedor”, disse. “Ele pode fazer os cálculos para ver qual
regime vai usar.”
Foi também criada a figura do
nanoempreendedor, que não precisará pagar os novos tributos. Vários países
possuem instrumento semelhante. Aqui, o nanoempreendedor será aquele que fatura
até R$ 3.375 por mês e não é microempreendedor individual (MEI).
No entendimento de Rocha, o sistema regular
do IBS e CBS é favorável até mesmo para os nanoempreendedores.
Por não serem obrigados a recolher o IBS e da
CBS nas suas vendas, esses empresários podem ficar com a impressão que não são
tributados. Mas é uma impressão falsa, disse. Os nanoempreendedores pagarão IBS
e CBS quando adquirirem insumos para sua produção. Porém, por estarem fora do
sistema, não poderão recuperar os tributos pagos na forma de crédito. Um
concorrente que esteja no sistema poderá fazê-lo.
De forma semelhante, as empresas que ficarem
no Simples não poderão tomar crédito tributário sobre insumos adquiridos. Além
disso, o crédito que elas gerarão a seus clientes será mais baixo, pois a
alíquota no sistema simplificado é menor. Por outro lado, se estiverem no
sistema regular, elas e seus clientes poderão tomar crédito tributário.
Rocha contou que, mundo afora, empresas muito
pequenas foram dispensadas de pagar o IVA por dois motivos: facilitar a
formalização e diminuir custos de conformidade.
Aqui no Brasil, porém, o novo sistema
tributário terá uma base altamente tecnológica. A ideia é que seja bastante
fácil de lidar, inclusive para os nano.
A apuração e declaração dos impostos será
automática. O contribuinte receberá a declaração pré-preenchida. Haverá um
sistema de recolhimento automático dos tributos, o “split payment”. A única
obrigação do contribuinte será emitir a nota fiscal eletrônica, algo que as
empresas do Simples já fazem atualmente.
A reforma tributária tem ainda um viés de
empreendedorismo ao estimular a inovação, acrescentou Rocha. “Quando uma
startup está no início das atividades, elas têm mais despesas em equipamento,
em pesquisa e desenvolvimento e geralmente não têm nenhuma saída, nenhuma
operação tributária”, disse. “A reforma garante que todo o IBS, mesmo em fase
pré-operacional, de investimento, ou na fase em que a empresa está com mais
despesas, poderá ser recuperado como crédito.”
No momento, o Congresso Nacional discute dois
Projetos de Lei Complementar (PLPs) que detalham o funcionamento do novo
sistema tributário sobre o consumo (PLP 68) e o comitê gestor (PLP 108) que o
administrará.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator do
PLP 68, pretende concluir o texto para que seja votado no plenário até o início
de dezembro. Depois disso, o texto será submetido à Câmara dos Deputados. Há
coordenação entre as duas casas legislativas para concluir a tramitação ainda
este ano.
Pode não parecer, mas a reforma tributária
tem muito a ver com o empreendedorismo.
Claro.
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