Valor Econômico
Se a derrota da extrema direita em 2022 foi creditada na conta do presidente Lula, a de 2024 pingou na do governador paulista
Se a derrota da extrema direita em 2022 foi
creditada na conta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a de 2024 pingou na
de Tarcísio de Freitas. É o que há de impacto nacional, neste início do segundo
turno, da eleição de domingo. Se o governador de São Paulo confirmar a eleição
de Ricardo Nunes (MDB), esta vitória fará dele a principal liderança da metade
à direita do país.
No início da campanha lhe foram mostradas as pesquisas com os prognósticos de Nunes e Pablo Marçal. A despeito de o prognóstico do candidato do PRTB parecer mais auspicioso, o governador apostou na reeleição do prefeito. Saiu da planilha, foi para a política e agora parte para consolidar sua liderança. Quanto mais for capaz de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro fora da disputa paulistana, mais esta hegemonia se consolidará.
Não será fácil. O apelo da extrema direita se
recicla e se consolida a ponto de abrigar dois nomes, Bolsonaro e Marçal. Ambos
mantêm 2026 na mira e oferecem seu apoio a Nunes. Um para marcar Tarcísio de
Freitas de perto e o outro, para se blindar da Justiça. Se um está inelegível e
o outro, a caminho de se tornar, o apelo do qual se fazem portadores aí
permanece.
Para evitar que este apelo dê alento a um
terceiro nome, Tarcísio e Nunes acolhem iniciativas como as escolas
cívico-militares, a recusa ao aborto legal, a rejeição da vacina obrigatória e
a letalidade policial e as calibram ao sabor das circunstâncias. O risco é o
de, a pretexto de derrotar a extrema direita, assumirem-se como tal.
O campo da direita, como mostra seu
desempenho nas eleições municipais, agiganta-se a um ponto que as fraturas
parecem inevitáveis. Tome-se, por exemplo, o PL. O partido cresceu 48% em
número de prefeituras e 42% em vereadores, dado mais primário da força da
legenda na eleição para a Câmara dos Deputados em 2026.
A Bolsonaro não interessa que o PL ofereça
legenda ao governador na disputa presidencial. Ele poderia se lançar pelo
partido e, ainda que sua candidatura seja indeferida, faria de Tarcísio de
Freitas um refém de seu destino, tornando sua desincompatibilização do governo
uma opção arriscada. E, então, com o provável indeferimento de candidatura, em
agosto de 2026, a dois meses da eleição, como o fez Lula com Fernando Haddad em
2018, apoiaria Freitas - ou lançaria Eduardo Bolsonaro, o 03.
É isso - mais do que a necessidade de uma
ponte com o presidente da legenda, Valdemar Costa Neto, impedido pelo ministro
Alexandre de Moraes de se comunicar com Bolsonaro -, que leva o ex-presidente a
tentar emplacar o 03 no comando do PL. Como não quer perder o controle sobre os
fundos eleitoral e partidário, Costa Neto resiste e apresenta um aliado, o
senador Rogério Marinho (PL-RN), como seu sucessor.
O acirramento das disputas internas distrai a
direita mas não resolve a falta de foco do outro lado. O PT não foi derrotado.
Cresceu em número de prefeituras (36%) e de vereadores (16%). A base diminuta a
partir do qual esse crescimento se deu, a menor em décadas, autoriza a
percepção de que houve uma relativa recuperação do partido.
Os porta-vozes do Palácio do Planalto buscam
convencer de que, além das 13 cidades que o PT disputa neste segundo turno como
cabeça de chapa, o governo também estará representado pelas candidaturas que se
opõem ao PL, como Igor Normando (MDB), em Belém, e Fuad Noman (PSD), em Belo
Horizonte.
É em São Paulo, porém, que se concentram as
atenções e as dificuldades de convencimento de que é possível, para Guilherme
Boulos (Psol), bater Nunes. Sua contabilidade soma o apoio de Tabata Amaral,
cuja resistência ao voto útil a valorizou ainda mais aos olhos petistas, a
paridade na TV e a vantagem de Boulos nas redes sociais, além do encolhimento
do exército de cerca de 600 candidatos à vereança da coligação do prefeito.
Lança-se mão, ainda, de um histórico de
viradas em São Paulo, que, em 2012, por exemplo, permitiu que Fernando Haddad
chegasse no segundo atrás de um outro prefeito candidato à reeleição, José
Serra, e conseguisse virar. Recusa-se a aritmética da soma dos votos de Marçal
àqueles de Nunes. Tanto pela expectativa de atração do eleitor do candidato do
PRTB de periferia quanto pela convicção de que o eleitorado de Marçal esteja
mais propenso à alienação eleitoral, conceito que soma abstenção, votos em
branco e nulos, no segundo turno.
Excluído 2020, eleição da pandemia, a
abstenção deste ano no país e, também em São Paulo (27%) é um ponto mais alto
de uma escadinha que tem como o degrau de partida a eleição de 2004, que
registrou 15%. Além da natural abstenção maior no segundo turno e da propensão
à antipolítica do eleitor de Marçal, contribuiria para isso a possibilidade de
justificar o voto no aplicativo da Justiça Eleitoral.
São alterações no “hardware” da campanha. E o
“software”? “Mudança x continuidade”. Não se trata de uma alteração, visto que
já estava dado no primeiro turno. As primeiras declarações do candidato, de que
será uma disputa de biografias, não favorecem uma ampliação.
Está claro que o avanço da direita no
primeiro turno se deu com base em gestões que se apropriaram de políticas
públicas outrora lideradas pela esquerda. Foi capaz de fazê-lo graças a caixas
cheios de emendas parlamentares e um aumento de arrecadação proporcionado pelo
bom momento da economia. Sem uma reciclagem mais audaciosa de políticas
públicas parece difícil a conquista deste voto.
A biografia de Boulos é mais interessante,mas ele não tem chance de vencer.
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