terça-feira, 5 de novembro de 2024

Bancada de Musk busca comando da Câmara - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Bancada de Musk busca uma reeleição com musculatura e pode impactar a atuação do Legislativo e o Supremo brasileiros no embate com o golpismo e pela regulação das redes

Em 17 de abril, o deputado republicano por Ohio, Jim Jordan, publicou um relatório de 541 páginas com 90 despachos do Supremo Tribunal Federal determinando ao X a retirada de postagens e perfis da plataforma. O texto, que tem a assinatura de Jordan, empurra as fronteiras americanas ao sul e acusa Alexandre de Moraes. Por censurar a oposição e atacar a liberdade de expressão estaria sujeito ao impeachment.

O deputado divulgou este relatório na condição de presidente da Comissão de Assuntos Judiciários da Câmara dos Deputados dos EUA, o equivalente à Comissão de Constituição e Justiça no Brasil. Nesta terça-feira, Jordan não busca apenas a reeleição ou mais uma comissão poderosa. Fez campanha além de seu distrito, com doações para colegas, em busca de apoio para se tornar o líder de seu partido na Câmara. Com isso, se os republicanos fizerem maioria na Casa, se tornaria o segundo na linha sucessória, atrás apenas do vice.

Jordan não é o único parlamentar da bancada de Elon Musk que busca a reeleição. Se, no Executivo, a contrapartida a ser exigida pelo dono do X, depois se tornar o quarto maior doador republicano (US$ 132 bilhões), passa pela remoção da presidente da Comissão de Comércio Federal (FTC), Lina Khan, e pela revogação do decreto de inteligência artificial de Joe Biden (ver texto à página A18), no Congresso, sua atuação passa por perseguir regulação das mídias digitais do Brasil.

No atacado, o impacto político de uma vitória de Trump para o Brasil é o da normalização do ataque ao Capitólio, de 6/1/21, e uma autoanistia para os 34 crimes pelos quais é considerado culpado. Ambos terão reflexos inevitáveis sobre o discurso da extrema-direita brasileira, tanto sobre a invasão dos três Poderes de 8/1/23, quanto sobre uma pressão pela anistia aos golpistas, notadamente ao ex-presidente.

Aguarda-se até o fim deste ano a conclusão da investigação da Polícia Federal sobre o envolvimento de Bolsonaro e militares na tentativa de golpe, bem como daquela sobre as milícias digitais. Concluídas as investigações, caberá à Procuradoria-Geral da República se manifestar com denúncias a serem analisadas pelo STF.

No varejo, o impacto se dá pela atuação da bancada de Musk. É majoritariamente republicana, ainda que nem todos sejam de extrema direita como Jordan. É o caso de Maria Elvira Salazar (Flórida). Nascida em Miami, filha de cubanos, foi uma das poucas republicanas a subscrever a criação de comissão independente para o 6/1.

A deputada apresentou projeto de lei que impede a entrada no país de oficiais estrangeiros que violem a primeira emenda da Constituição. “O ministro Alexandre de Moraes é a vanguarda do assalto internacional à liberdade de expressão contra cidadãos americanos como Elon Musk. Trata-se de um direito inalienável que não conhece fronteiras. Os promotores da censura não são bem vindos na terra da liberdade”, disse Maria Elvira na apresentação do projeto.

O projeto foi subscrito por um correligionário, Darrel Issa. O deputado da Califórnia também é empresário do setor de tecnologia. Voltou ao Congresso em 2021, dois anos depois de interromper uma carreira legislativa de 18 anos, e conseguiu a presidência do subcomitê de internet e propriedade intelectual do Comitê Judiciário. Foi tão incisivo quanto Maria Elvira: “Autoridades estrangeiras estarão avisadas, se negarem aos nossos cidadãos os direitos da primeira emenda, negaremos sua entrada nos EUA ou mostraremos a porta de saída”.

A atuação desta bancada é representativa das mudanças que a eleição americana pode trazer para o Brasil. Depois de a família Bolsonaro passar anos cultivando - sem muito sucesso - uma relação de proximidade com Donald Trump, foi Musk que passou a capitanear as relações entre os dois grupos políticos.

Desde que desembarcou em Miami, neste fim de semana, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) só tem feito postagens sobre o tema no X. Escreve em inglês, mas a quase totalidade dos comentários é em português, o que parece demonstrar que está longe de sensibilizar o eleitor americano em nome de uma solidariedade golpista.

Outros parlamentares brasileiros que devem se juntar ao filho do presidente com a mesma pauta. Não foram capazes de barganhar a anistia antes que o PL declarasse apoio ao deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) na disputa pela Mesa da Câmara e agora farão pressão de fora para dentro.

As chances de Trump nesta eleição não animaram apenas a turma da anistia. A retomada da tramitação do projeto de regulação das redes sociais vinha contando com a boa vontade das plataformas. Com as perspectivas de um embate voto a voto entre Kamala e Trump, os parlamentares mais envolvidos nesta tramitação perceberam um distanciamento na linha “aguardar no que vai dar”.

Um eventual recrudescimento pela anistia e contra a regulação das redes pode vir a aumentar o fosso entre o Congresso e o Supremo. No fim deste mês, o plenário da Corte se reúne para decidir se o artigo 19 do Marco Civil da Internet é constitucional. Este artigo estabelece que a exclusão de conteúdo em redes sociais deve ser feito por ordem judicial. Dependendo da decisão, haverá uma corrida para constitucionalizar a não responsabilização das redes. É possível que, neste momento, já se saiba se a turma do liberou geral terá um aliado na Casa Branca.

 

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