O Globo
O estrangeiro não é apenas um intruso ilegal.
Ele é um intrometido que idealiza e admira o país que o acolhe
Espanta-me o signo-lema que elegeu Donald Trump. O mote isolacionista e literalmente reacionário “Make America Great Again” (Torne a América grande novamente) — um slogan agressivo, explicitamente nacionalista e exclusivista no melhor estilo autocrático. O Maga (na sigla em inglês) de Trump é, sem sombra de dúvida, o primeiro degrau de um neofascismo cujo sintoma é a cruel deportação em massa de imigrantes “ilegais”. Como se fosse “legal” largar nosso lugar de nascimento — a terra por onde entramos como atores passageiros neste terrivelmente maravilhoso Vale de Lágrimas. Este vale que a ideologia trumpista quer transformar num inferno, pois imigrar é um movimento dramático, que suplanta escolhas turísticas.
Trata-se de ato contrário ao que
paulatinamente fabricou os Estados
Unidos e está expresso no projeto dos milhões que assim
fizeram, demonstrando justamente o oposto do que Trump proíbe. O “fazer
América” que os pais ou avós da maioria dos meus amigos americanos (os de Trump
eram alemães e escoceses) realizaram, provando (muitos, sem dúvida, ilegais) o
lado mais generoso e tolerante da igualdade como valor difícil de praticar.
O Maga é o dístico expressivo de um perigoso
nacionalismo. É a marca dos movimentos afins de hierarquia de raças e gentes. É
a negação do acolhimento e uma clara exaltação do etnocentrismo que Trump e os
neorrepublicanos transformam em entusiasmo eleitoreiro. Queira Deus que não
vire política de Estado. É um disparate reacionário ao estreitamento solidário
de um mundo globalizado, marcado por teias de mensagens que nos tornam parte de
algo maior que nossas aldeias, grandes não por voltarem a seu passado, mas por
se abrirem a um futuro planetário nivelador de estilos de vida.
Ninguém pode ser contra a legalidade
imigratória, mas a relação inconsciente entre a ilegitimidade e o expurgo
migratório justamente na fronteira sul não pode ser ignorada. Ali — pasmem — se
faz um muro entre povos e humanidades num planeta cada vez mais interligado.
Contra essa aversão, deve-se ressaltar o
poder da esperança que todo imigrante traz dentro de si quando muda de pátria.
O caso da América como república democrática até agora triunfante revela como
os peregrinos que, em 1620, atracaram em Plymouth, Massachusetts, criaram um
pacto de liberdade e igualdade. Essa igualdade foi repetidamente vivida por
milhões de outros “peregrinos”, que reiteraram aos locais a virtude do
acolhimento, não do expurgo.
É um espantoso paradoxo essa pintura
trumpista dos imigrantes como vilões, justamente numa nação construída por
imigrantes. Estrangeiros que lembravam aos americanos a preciosidade de suas
heranças políticas e o valor de sua difícil, arriscada e preciosa experiência
democrática. Muitos eventos foram lembrados e reeditados justamente por
recém-chegados.
O estrangeiro não é apenas um intruso ilegal.
Ele é um intrometido que idealiza e admira o país que o acolhe. Falo disso
porque muitas vezes testemunhei estrangeiros lembrando aos americanos natos a
importância de seus valores e a riqueza de seu estilo de vida. O expurgo de
estrangeiros, mesmo ilegais, ao lado do lema de “tornar a América grande
novamente”, chega a meus velhos ouvidos como toque antidemocrático e
espantosamente isolacionista.
Lembra “América somente para americanos”,
quando sabemos que a experiência dos Estados Unidos é parte de toda a
Humanidade e com ela compartilhada sem as reservas do nós contra vocês.
Excelente! A política fascistoide de Trump foi acolhida pelos eleitores dos EUA, mas isto não a torna menos ruim, já que ela é até imoral, como demonstra o colunista. As tantas e tão repetidas MENTIRAS de Trump sobre imigrantes aumentaram a rejeição a eles e até os preconceitos com que são vistos dentro dos EUA. Mas mentiras tão repetidas NÃO se tornam verdades! São e sempre serão MENTIRAS, ainda que ditas por um ex-presidente (criminoso) e futuro presidente (ainda criminoso). Provavelmente Trump vá ainda ampliar o número de crimes na sua ficha corrida.
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