Folha de S. Paulo
Parece haver exagero em preço de dólar e
taxas de juros, mas os motivos são outros
Há quem tente ganhar dinheiro com a perspectiva
de desvalorização ainda maior do real. Quem invente operações
financeiras engenhosas para tentar faturar com a variação frequente e grande
do dólar ("volatilidade").
Há até operações automatizadas ("robôs") que permitem identificar
essas oportunidades.
É verdade também que, a julgar pelas
condições econômicas do Brasil, dólar a R$
6,27 parece exagero, assim como Selic a 17% ao ano, como se vê no
atacadão do mercado de dinheiro.
Se há exagero, há necessariamente
"ataque especulativo"? Não.
A péssima recepção ao plano fiscal do governo agravou uma situação ruim que vinha desde abril. O impacto do fracasso de público do pacote, que elevou dólar e juros, causou acidentes (perdas de dinheiro, reversão de planos de investir etc.). Que isso tenha acontecido no dezembro seco de dólares piorou a situação. Há um dominó em queda, bola de neve, o nome que se dê: problemas que se realimentam.
O que seria um "ataque especulativo? Uma
tentativa de forçar a desvalorização de uma moeda que está em certo nível, por
decisão de governo ou similar, e que está valorizada além da conta, dado um
contexto ruim.
Qual contexto? O de um país com déficit
externo crescendo rápido e para um nível perigoso. Um aumento
rápido e sem limite da dívida pública. Reservas internacionais
insuficientes para defender um certo nível de cotação da moeda.
Um ataque especulativo seria, grosso modo, um
maciço e variado conjunto de operações com o objetivo de pressionar a
desvalorização de uma moeda, induzindo governo e/ou banco central a vender
dólar, no caso, a preço bom, "barato", de real supervalorizado.
A fim de manter a taxa de câmbio desejada
(tantos reais por dólares), o BC teria de vender dólares baratos, tirados
de seu estoque
de segurança (reservas internacionais).Quando o BC fica quase sem
reservas, joga a toalha. A moeda, no caso o real, se desvaloriza ("o dólar
sobe"). Lucra muito quem montou operações financeiras que ganham com a
grande desvalorização da moeda.
Mas a moeda brasileira, o real, não está
"supervalorizada", por quase qualquer critério, faz tempo —ao
contrário. Chutava-se ainda neste ano que o dólar poderia voltar a algo um
tanto abaixo de R$ 5 (R$ 4,80?) se houvesse perspectiva de limite para o
crescimento da dívida pública, inflação controlada e ambiente mais calmo nos
EUA.
As autoridades econômicas brasileiras também
não estão defendendo, tentando fixar, uma cotação ou uma faixa de flutuação
para a moeda brasileira. O câmbio é flutuante.
O BC não
intervém a fim de evitar a tendência de alta do dólar, mas de evitar
estrangulamentos e altas aberrantes por faltas pontuais de dólares ("pouca
liquidez"). Por ora, nem está vendendo o suficiente ou operando de modo
adequado (via swaps cambiais) para conter o preço do dólar.
Quem procura ganhar com a alta do dólar em
regime de câmbio de fato flutuante, corre muito risco. Por outro lado, se o BC
viesse a intervir a fim de fixar um preço para o dólar, estaria financiando o
eventual especulador ou subsidiando em geral quem quer tirar dinheiro do país
(torrando reservas), com alto risco de fracasso também.
Solução? Lidar com a origem do problema
(fiscal), com o presidente Lula reconhecendo
o motivo da crise e tomando providências.
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