quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

BC quer ajuda do governo para esfriar economia - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Juros sobem sem limite, a espera de notícia fiscal boa; BC alerta bancos sobre crédito

Banco Central quer ajuda do governo Lula a fim de esfriar a economia —diminuir consumo e investimento. Diz ainda que bancos precisam tomar cuidado com a concessão de crédito.

O pedido ao governo foi explícito, de modo não muito comum, e está na exposição de motivos da decisão sobre a taxa Selic, na semana passada, conhecida como "Ata do Copom (Comitê de Política Monetária)".

A "desaceleração" é necessária para um "reequilíbrio" da economia (evitar superaquecimento, inflação, alta daninha do déficit externo etc.). Para tanto, política monetária (juros "do BC") e fiscal (gastos do governo), precisam ser "harmoniosas". É o óbvio, mas dito de modo enfático.

Além de providência necessária a fim de conter a inflação, um anúncio do governo quanto a despesas seria um modo também de conter a alta ora descontrolada de dólar e de taxas de juros, segundo pessoas que operam negociações grandes no mercado de câmbio e juros. É possível que a aprovação integral do plano fiscal do governo, ora no Congresso, diminua um tanto a tensão. Mas a situação tenderia a se estabilizar em um nível alto de degradação.

As intervenções do BC no câmbio servem apenas para conter altas súbitas, exageradas, pontuais, do dólar (por falta de "liquidez").

Na ata, o BC escreveu ainda que os bancos precisam ter "cautela": a situação é de alta de juros, além de inadimplência elevada, assim como é alta a parcela da renda dedicada a pagar dívida e suas parcelas.

Déficit e a dívida crescendo sem limite deixam juros e dólar sem chão. E tal descontrole contribui para aquecer a economia de modo inflacionário, segundo o BC. "Com relação à política econômica de forma mais geral, o Comitê manteve a firme convicção de que as políticas devem ser previsíveis, críveis e anticíclicas", escreveu a direção do BC no item 10 da ata.

A "Ata do Copom" envelheceu em uma semana, mas não perdeu a razão. Envelheceu pelos fatos da vida: as taxas de juros no mercado e o preço do dólar estão ora sem controle. A inflação corrente cresce. A expectativa quanto à evolução de preços cresce ora sem limite. O governo para taxas de juros cada vez mais altas para financiar seus déficits, os juros da dívida e a dívida que vence.

O motivo de fundo apareceu em maio, quando o governo mudou sua meta fiscal. No início de abril, a taxa de juros de um ano no mercado era de 9,86% ao ano (descontada a inflação esperada, uma taxa real de 6,2%). Nesta segunda, estava em 14,92% (taxa real de 9,8%). Nesta terça, o governo tomando dinheiro emprestado, com vencimento em maio de 2027, com a taxa de juros de 8,27% mais a inflação.

O anúncio de um plano mirrado de contenção de despesas, em novembro, não contribuiria para conter a degradação financeira. Para piorar, foi anunciado ao lado de um plano de isenção de IR, que poderia agravar ainda mais a situação e indicou que o governo não estava lá muito cônscio do tamanho do problema. O risco de que o pacote ainda seja diminuído por um Congresso indócil, no atropelo, jogou mais sal na ferida.

Os juros estão nos níveis mais altos desde o colapso de 2015-2016.

Dezembro é um mês propício a variações frequentes e grandes do dólar: menos dinheiro na praça, mais remessas de empresas estrangeiras. Com a desconfiança na intenção do governo de ajustar as contas, o caldo entornou.

 

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