O Estado de S. Paulo
Lula quer mantê-lo, mas José Múcio pode deflagrar a reforma ministerial no governo
A última reunião ministerial do ano, nesta sexta-feira, terá várias peculiaridades, no Alvorada, com o presidente Lula em recuperação e o País pegando fogo. A principal delas, porém, é que também poderá ser a última para alguns dos presentes, a começar de uma peça-chave do governo, o ministro José Múcio, da Defesa. Não que Lula esteja doido para demiti-lo, pelo contrário, mas porque Múcio acha que já deu sua cota de sacrifício, fez tudo o que podia para acalmar as relações entre civis e militares e, mais do que isso, ele está cansado.
Aos 76 anos, Múcio sente falta da sua casa,
da mulher, dos netos e da música. Homem afável, bem-humorado, com um talento
político conhecido em Brasília, é lembrado por Lula para missões espinhosas,
que exigem paciência, ouvido e malabarismo. Foi articulador político no segundo
mandato do petista, apesar de vir da Arena e do PDS que tinham dado suporte à
ditadura militar. E agora, depois de se virar com os políticos tem de tourear
os militares, em tempos difíceis.
Com as Forças Armadas rachadas, submissas a
Jair Bolsonaro, refratárias a Lula, lenientes com acampamentos golpistas em
torno de quartéis, a prioridade de Múcio na Defesa era abaixar o fogo, afastar
a política para bem longe, prestigiar comandantes legalistas e não se envolver
com as investigações da PF e do STF. De um lado, a má vontade de grande parte
dos militares com Lula. De outro, o entorno de Lula embolando preconceitos com
bons motivos contra os militares. No meio, Múcio apagando incêndios,
construindo pontes.
Na primeira fase, deu tudo certo, mas as
coisas foram se complicando. Não é fácil para os três comandos e as tropas,
particularmente do Exército, conviver com revelações tenebrosas sobre oficiais
articulando um golpe de Estado e até a prisão e o assassinato de Lula, do vice
Geraldo Alckmin e do ministro do STF Alexandre de Moraes. Vergonha,
constrangimento.
A isso some-se a inclusão – adequada, diga-se
– dos militares no pacote de corte de gastos. Ninguém gosta de cortes, mas por
que todos têm de se adaptar, não os militares? Múcio passou a conviver com um
turbilhão de sensações, insatisfações, irritações e desconfianças mútuas,
regado com as revelações do golpe. O ambiente azedou e, enquanto não forem
todos julgados, os culpados condenados, não vai melhorar. Parecia ir tudo bem
na Defesa, devagar e sempre, mas voltou “à estaca zero”. É hora de Múcio jogar
a toalha? Lula diz que não, mas o próprio Múcio acha que sim e pode deslanchar
a reforma ministerial. •
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