quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

‘Não tô nem aí’ é senha para vale-tudo - Vera Magalhães

O Globo

Combate eficiente ao crime se faz com inteligência financeira e operacional, respeitando o devido processo legal

As palavras, na política, têm peso e normalmente implicações práticas. O governador Tarcísio de Freitas foi bastante incisivo em março deste ano ao defender as ações da Polícia Militar de São Paulo, que, já então, chamavam a atenção da própria Ouvidoria da polícia, do Ministério Público e de entidades de defesa dos direitos humanos pela explosão da letalidade e do uso de violência em operações.

— Nós temos muita tranquilidade com o que está sendo feito. E aí o pessoal pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta que eu não tô nem aí.

O dar de ombros orgulhoso daquele que, no fim das contas, é o chefe maior das polícias, foi lido como licença para acelerar. Àquela altura, a Operação Verão, deflagrada na Baixada Santista para combater o crime organizado nas cidades do litoral, havia resultado em 39 mortes de civis por militares. Foi encerrada oficialmente um mês depois, com 56 civis e dois policiais mortos.

Não foi o único episódio rumoroso na política de segurança de Tarcísio e seu secretário da área, o policial militar e ex-deputado do PL Guilherme Derrite. As últimas semanas, no entanto, têm sido marcadas pela revelação de graves casos de envolvimento de policiais com o próprio crime organizado, cujo combate foi usado por Tarcísio para justificar o “não tô nem aí” para as denúncias de abusos.

Na mesma entrevista em que desdenhou as evidências, o governador foi categórico em dizer que não existia “bandido na polícia” do estado. Nesta semana, um ex-integrante de sua própria segurança foi afastado da corporação diante de evidências de envolvimento com o Primeiro Comando da Capital (PCC). Pouco antes, a ousada execução a tiros de fuzil de um delator do PCC em pleno aeroporto de Guarulhos escancarou a infiltração das polícias, no plural, pela principal facção criminosa em atividade em São Paulo.

Licença para matar não é, nem nunca foi, sinônimo de eficiência no combate ao crime organizado. Isso se faz com inteligência financeira e operacional, respeitando o devido processo legal. Sob a justificativa da “defesa da ordem” feita pelo governador no mesmo discurso, se permitiu por longos meses, entre o fim de 2023 e o primeiro trimestre deste ano, que a polícia aumentasse em 400% a letalidade de suas ações no litoral. Nem todos os que morreram nessa escalada eram bandidos. E, mesmo que se trate de suspeitos, a lei determina que sejam presos e que as investigações resultem no enfraquecimento da estrutura das organizações criminosas a que estão ligados.

Nas últimas semanas, casos inadmissíveis de violência gratuita, até mesmo de sadismo puro e simples, têm vindo à tona, com imagens que não foram captadas pelas fardas dos mesmos policiais, como o assassinato de um estudante de medicina, a execução à queima-roupa de uma pessoa com 11 tiros pelas costas ou, o mais recente, a inacreditável cena em que um policial, diante de colegas coniventes, atira um suspeito num córrego na capital paulista.

Diante desses casos, que geraram ampla divulgação e certa comoção, Tarcísio e Derrite reagiram com indignação. Disseram que tais comportamentos são incompatíveis com o que se espera da corporação. Mas de que forma o endosso anterior funcionou como sinalização de que a violência é um expediente aceito e até encorajado? Pesquisas provavelmente captariam apoio de parcela considerável da sociedade ao aumento da violência policial contra o crime organizado. Isso não dá aos governantes e gestores a licença para transigir com a barbárie.

Os casos de São Paulo e também de Bahia e Rio de Janeiro mostram que, a despeito da escalada de violência das polícias, as organizações criminosas avançam em várias frentes, de setores da economia à infiltração no tecido político. É preciso ação coordenada de instâncias de governos e também da Justiça para conter a mexicanização do Brasil, e não a decretação de uma licença geral para o olho por olho, dente por dente.

 

4 comentários:

  1. Respostas
    1. Concordo. Licença para matar geralmente encobre a incapacidade de atuar com inteligência e planejamento, o que, aliás, acontece com o mauricinho da rota e seu chefete carioca.

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  2. Brasil hoje é comandado por um quadrilha de criminosos flagrados no Grande assalto aos cofres públicos brasileiros revelados pela lava jato, aqui onde se prende senhorinha de Bíblia ajoelhada e rezando pedindo melhoras pro Brasil e solta chefe de facção criminosa que sai pela porta da frente da penitenciária
    Só não vê quem não quer, nos governos do PT a violência só aumentou e as facções criminosas se proliferaram
    O Judiciário cada vez mais brando com os criminosos

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  3. Certo,se não ficaremos todos cegos e banguelas.

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