segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Governadores erram ao criticar PEC da Segurança

O Globo

Objetivo da proposta não é tirar poder dos estados, mas implantar combate eficaz ao crime organizado

São equivocadas as críticas dos governadores do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança, uma tentativa bem-vinda do governo federal de ampliar sua participação no combate às organizações criminosas. Reunidos em Florianópolis (SC) no final de novembro, os governantes de sete estados se manifestaram contra o projeto apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, alegando que ele enfraqueceria o poder estadual.

Na Carta de Florianópolis, afirmam que, se aprovada, a PEC trará “incertezas” às gestões estaduais. Dizem ser contra “qualquer proposta que enfraqueça os estados e reduza sua capacidade de agir de forma rápida e adequada às necessidades locais”. Acrescentam que a segurança deve ser implementada com cooperação, respeito às diferenças regionais e fortalecimento das capacidades locais, “e não por meio de estrutura centralizada, que limita a eficiência e amplifica a burocracia”.

Os governadores argumentam que as regiões Sul e Sudeste já têm sistemas de segurança eficientes. E que em breve passarão a construir uma plataforma de ação conjunta e integração dos dados de segurança, Justiça, fiscalização e controle. Claro que é sempre louvável a cooperação, especialmente em relação a bancos de dados que hoje não se comunicam. Mas o Brasil tem 27 unidades federativas. Não custa lembrar que PCC e CV, as poderosas facções do Sudeste, atuam em todo o país e no exterior. Não pode haver integração parcial contra inimigos desse tipo.

Não é razoável afirmar que os estados já têm sistemas de segurança eficientes. O poder das facções não pode ser menosprezado. No mês passado, um empresário que delatara a estrutura criminosa do PCC e corrupção policial foi executado na saída do Aeroporto de Guarulhos (SP), o mais movimentado do país. No Rio, em outubro, uma operação policial no Complexo de Israel, conjunto de favelas na Zona Norte, resultou na morte de inocentes e num dia de caos. O governador Cláudio Castro (PL) cobrou ação federal.

O principal mérito da PEC da Segurança é justamente prever maior participação federal no combate às organizações criminosas. Os estados sozinhos não dão conta de enfrentar facções fortemente armadas, bem articuladas, infiltradas em instituições e empresas formais. A proposta romperia a inércia do Planalto no combate à violência, hoje uma das maiores preocupações dos brasileiros. Entre outros pontos, a PEC amplia as atribuições da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, fortalece o Sistema Único de Segurança Pública e prevê compartilhamento de informações.

É um erro dizer que a PEC tirará autonomia dos governadores. A União não substituirá os estados em sua missão constitucional de tratar da segurança. O plano é somar esforços, integrando ações isoladas, hoje insuficientes. A PEC pode não ser ideal, e nada impede que seja aperfeiçoada com sugestões dos governadores e dos parlamentares. Mas algo precisa ser feito contra a grave crise na segurança. Medidas eficazes devem envolver os três níveis de governo, com cooperação, compartilhamento de dados, inteligência, tecnologia, recursos e um plano de segurança robusto, coordenado pelo governo federal. Sem isso, os estados continuarão sua luta solitária e inglória contra as poderosas multinacionais do crime.

Insistência em usar Petrobras para salvar estaleiros é nociva para o país

O Globo

Estatal repete erro de favorecer indústria naval ineficiente em detrimento de acionistas

Tentativas de usar a Petrobras para reerguer a indústria naval já deram errado no passado. Mesmo assim, a estatal acaba de anunciar novos investimentos com a mesma intenção: seis contratos de R$ 16,5 bilhões para construção e afretamento de 12 embarcações. Desses, R$ 5,2 bilhões serão destinados a estaleiros nacionais, a maior encomenda nos últimos dez anos. As empresas Bram Offshore e Starnav Serviços Marítimos operarão as 12 embarcações, construídas por seus próprios estaleiros em Santa Catarina. A presidente da estatal, Magda Chambriard, afirma que serão criados 11 mil empregos diretos e indiretos.

O novo plano de negócios da Petrobras prevê investimentos de US$ 111 bilhões até 2029, com contratação de 11 plataformas de produção de petróleo e gás, 30 novas sondas de exploração e 90 equipamentos submarinos de apoio às operações em alto-mar. É um vasto manancial de recursos, que o governo tem tentado dirigir com o intuito de reerguer a indústria naval.

Em julho, a Transpetro, subsidiária da Petrobras, anunciou a licitação de quatro petroleiros de pequeno porte para navegação de cabotagem, também com reserva de mercado e subsídios. Está previsto para 2026 o lançamento ao mar do primeiro. Ao todo, serão 25, para transportar combustíveis pelo litoral (com investimento entre US$ 2 bilhões e US$ 2,5 bilhões). Há ainda proposta para 12 embarcações de recuperação de óleo derramado no mar e mais dez de apoio.

O financiamento ao setor naval vem do Fundo de Marinha Mercante, administrado pelo BNDES. Os juros, subsidiados com recursos públicos, variam de 2,3% a 3,3% ao ano. Podem cair ainda mais para quem se comprometer a entregar navios com no mínimo 65% de conteúdo nacional.

No auge da última tentativa fracassada de usar encomendas da Petrobras para financiar a indústria naval, no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na gestão de Dilma Rousseff, os estaleiros empregavam 85 mil funcionários. Hoje restam 26 mil. O plano desabou em meio à ineficiência crônica dos estaleiros nacionais diante dos competidores externos e a denúncias de corrupção. A Sete Brasil, subsidiária da Petrobras criada para arrendar sondas à estatal, não recebeu uma sequer das 29 que havia encomendado aos estaleiros. Sua falência foi decretada em 2019.

Em seus planos, Chambriard confirma estar de acordo com a visão do governo para a Petrobras: usá-la como “indutora do desenvolvimento”. Trata-se de uma visão anacrônica da política econômica, baseada em reservas de mercado, deixando em segundo plano a busca pela eficiência no uso dos recursos. A experiência demonstra que as empresas nacionais não conseguem ser competitivas diante dos fornecedores externos, mas insiste-se no erro, como se a insistência em algum momento pudesse gerar resultado diferente. Não há preocupação com o custo para os acionistas da Petrobras — o maior é a própria União — nem com as consequências que a má alocação do capital trará para a economia brasileira.

Senado consegue avanços em marco regulatório da IA

Valor Econômico

Câmara deve fazer adequações e marco aprovado pelo Senado protege direitos fundamentais sem comprometer a inovação

A regulação da inteligência artificial (IA) começou a ganhar corpo no Brasil com o marco aprovado pelo Senado para ditar regras para a nova tecnologia, uma prioridade para o país. Ainda que sejam necessárias melhorias pontuais, o texto traz avanços ao prever a remuneração de direitos autorais de conteúdos usados no treinamento dos modelos e ao estabelecer uma classificação de riscos para os diferentes sistemas. É preciso agora que a base do projeto seja mantida sem grandes alterações na Câmara dos Deputados, onde haverá maior pressão das big techs, com apoio da bancada bolsonarista, para afrouxar importantes garantias incluídas pelos senadores.

A aprovação por votação simbólica foi possível graças à atuação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MBD-MG), que entrou em campo para conter manobras da oposição para protelar a tramitação do projeto, cujos meandros técnicos vêm sendo discutidos com ampla participação da sociedade civil desde março de 2022. Houve acordo para a retirada de destaques por parte do governo e da oposição, dando pequenas vitórias aos dois lados, o que permitiu que o texto final fosse classificado como nem “de direita” e nem “de esquerda” pelo senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator do projeto.

O marco estabelece as bases para o desenvolvimento e o uso da IA no Brasil pelos setores público e privado, além de criar um mecanismo de supervisão da tecnologia. O Sistema Nacional de Regulação e Governança da Inteligência Artificial (SIA), que será criado sob a coordenação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANDP) com participação de outros órgãos do Executivo, ficará responsável por fiscalizar o cumprimento das regras e estabelecer regulações posteriores. Em caso de violações, o SIA poderá advertir ou multar os infratores, com punições que podem chegar a R$ 50 milhões ou 2% do faturamento bruto da empresa em questão.

Um dos acertos do texto-base do Senado é a adoção de uma classificação das IAs por diferentes níveis de risco, um padrão já adotado pela União Europeia (UE), pioneira na regulação de tecnologias emergentes. Segundo o projeto, haverá sistemas considerados de risco excessivo, cujo desenvolvimento será proibido - é o caso, por exemplo, de armas autônomas -, e os de alto risco, categoria que inclui, entre outros, os sistemas usados na seleção de estudantes, no recrutamento de vagas de emprego e na concessão de serviços públicos. Nestes casos, as empresas terão de seguir uma série de obrigações, como a realização de testes para avaliação de segurança, além de implementação de medidas para prevenir vieses e a discriminação de grupos minoritários.

Outro ponto de destaque é a proteção dos direitos autorais, uma reação aos inúmeros casos de violação da legislação já ocorridos no Brasil e no mundo com o uso indevido de conteúdos para o treinamento de sistemas generativos, popularizados com o ChatGPT, capazes de criar textos, imagens, fotos e vídeos. Em vitória governista, apesar da apresentação de diversas emendas por parte de deputados bolsonaristas para defender a posição das big techs, que alegam que a cobrança pode “inviabilizar o desenvolvimento da IA no Brasil”, o texto-base prevê a remuneração dos titulares das obras, levando em consideração o porte da empresa desenvolvedora e o impacto na concorrência. Também será preciso que as companhias informem publicamente que materiais foram utilizados para alimentar os modelos.

Mas as negociações para permitir que o projeto avançasse no Senado também resultaram em retrocessos em relação ao texto original. A versão final votada no plenário estabeleceu que será obrigatória apenas para os modelos generativos a necessidade de realizar avaliações preliminares que determinarão o grau de risco do novo modelo. Na opinião de entidades de defesa dos direitos digitais dos cidadãos, a lei deveria exigir que tais medidas de segurança sejam obrigatórias, não de caráter facultativo, conforme o risco de cada sistema.

Outra mudança que deve ser revertida é a exclusão dos algoritmos das redes sociais da lista de sistemas considerados de alto risco, um triunfo da aliança entre a oposição bolsonarista e as grandes empresas de tecnologia. Já não resta dúvida de que estas ferramentas de recomendação de conteúdo deveriam estar submetidas a regras mais rígidas e sob maior escrutínio da sociedade, considerado o já conhecido impacto das plataformas sobre o fluxo de informação e o debate público.

Mesmo que haja espaço para aprimoramentos, o marco aprovado pelo Senado cumpre a missão de proteger os direitos fundamentais sem comprometer a inovação, essencial para uma tecnologia em rápida evolução e cujo futuro é imprevisível. Caberá à Câmara fazer as devidas adequações, sem se submeter aos interesses de grandes grupos econômicos, para que o país possa sair na frente na regulação e obter vantagem entre países em desenvolvimento para a atracão de investimentos em IA.

A Justiça é para todos, inclusive generais

Folha de S. Paulo

Pesam sobre Braga Netto, que está preso, suspeitas gravíssimas de golpismo; evitar impunidade depende de acusação sólida

A prisão preventiva do general da reserva Walter Braga Netto, levada a cabo no sábado (14), traz de imediato a percepção de ineditismo. Trata-se, afinal, do oficial de mais alta patente a ir para detrás das grades, ainda que temporariamente, desde o restabelecimento da democracia há quase 40 anos.

Mais que isso, toda a investigação em torno das maquinações golpistas encabeçadas por Jair Bolsonaro (PL), de quem Braga Netto foi vice na chapa presidencial de 2022, alimentam a expectativa de que a Justiça vá prevalecer sobre a impunidade.

O trabalho pela frente, porém, é mais complexo do que pode sugerir algum efeito catártico agora —assim o demonstra a experiência da Lava Jato, que apesar de avanços notáveis na responsabilização de políticos e grandes empresários, amargou não poucos malogros, seja por apurações inconsistentes, abusos de poder, impropriedades processuais ou, não menos importante, conveniência de autoridades.

Se não há dúvida de que Bolsonaro e auxiliares desejaram afrontar a ordem democrática, como o ex-presidente nunca fez questão de esconder, cumpre ao Estado de Direito, por meio do devido processo legal, apontar até onde foram as tratativas e o papel de cada personagem.

Por ora, os 37 indiciados pela Polícia Federal são suspeitos formais. Há pela frente ainda a esperada acusação por parte da Procuradoria-Geral da República, que pode também demandar investigações adicionais, e o julgamento no Supremo Tribunal Federal, caso a denúncia seja aceita como se imagina.

Pesam sobre Braga Netto, no inquérito da PF, afirmações gravíssimas e chocantes. Ele teria participado de um plano para nada menos que assassinar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e o ministro Alexandre de Moraes, que em 2022 comandava a Justiça Eleitoral.

Não se deveram a tais suspeitas, ainda a serem examinadas pelo sistema de Justiça, a prisão do general —esta se deu em razão de indícios de que ele procurava obstruir a apuração em curso, o que sua defesa nega.

Qualquer que seja a evolução do caso, as Forças Armadas, e o Exército em particular, cumprirão seu dever se reagirem com serenidade e disposição de colaborar com o esclarecimento dos fatos, como ocorreu até aqui.

A passagem de Bolsonaro pelo Planalto resultou em dano reputacional indelével para a corporação. Quadros importantes se deixaram cooptar pelo capitão reformado, da ocupação anômala de cargos de governo até a politização com ambições autoritárias.

A conspiração golpista se esvaziou na origem, especialmente, porque o comando do Exército optou por se manter fiel à Constituição —alento para um país que vive seu período mais longo de democracia plena. O processo de pacificação não prescinde do rigor na punição das transgressões, que não podem se repetir.

Brasil vai mal em mais uma avaliação global da educação

Folha de S. Paulo

Resultado pífio no TIMSS soma-se aos do Pisa e do Pirls; governos precisam ampliar ensino integral e combater a evasão

A ineficiência histórica de sucessivos governos nas três esferas com a educação brasileira produz mais um indicador internacional vexatório. Trata-se de novo alerta para a necessidade de melhorias em gestão, ainda mais com a situação precária dos Orçamentos federal, estaduais e municipais.

Em 2023, o Brasil participou pela primeira vez do Estudo Internacional de Tendências em Matemática e Ciências (TIMSS), sondagem realizada desde 1995 pela Associação Internacional para a Avaliação do Desempenho Educacional (IEA). Alunos de 64 nações foram avaliados.

Na prova de matemática para o 4º ano do ensino fundamental, os estudantes do Brasil obtiveram na média 400 pontos, numa escala de 0 a 1000.

Segundo a IEA, tal nota corresponde ao conhecimento mínimo. Mas 51% dos brasileiros não conseguiram alcançá-lo, o que significa, por exemplo, que não sabem fazer adição ou subtração com números acima de três dígitos.

Ficamos à frente só de Marrocos, Kwait e África do Sul. O Chile, único vizinho sul-americano no TIMSS, teve 444 pontos. A média global foi de 503 e o primeiro colocado, Cingapura, chegou a 615.

No 8º ano, na mesma disciplina, foi ainda pior. O país ficou na última colocação, empatado com Marrocos, ao obter 378 pontos. Somente 38% dos nossos alunos alcançaram o mínimo necessário, ante 81% na média internacional.

Nos testes de ciências, o Brasil vai ligeiramente melhor, com 425 no 4º ano e 420 no 8º, mas ainda longe das médias dos outros países (494 e 478, respectivamente).

O resultado pífio no TIMSS soma-se ao mau desempenho no Pisa, que avalia o aprendizado de matemática, ciências e leitura de jovens de 15 anos em 81 países, e no Pirls, que testa a alfabetização de crianças de 9 ou 10 anos.

O problema mais premente não é falta de verbas públicas. No Brasil, o montante direcionado para a educação em relação aos serviços totais do Estado (11%) está um pouco acima da média da OCDE (10%), que reúne os países mais desenvolvidos, e gasta-se relativamente muito no ensino superior, que no arranjo federativo nacional fica a cargo principalmente do governo federal.

Dado o envelhecimento da população, o número de matrículas na educação básica —a etapa a ser priorizada pela política pública— está em tendência de queda, o que facilita aumentar o gasto por aluno. Estados e municípios precisam ampliar o ensino integral, premiar a qualidade do aprendizado e combater a evasão. Sem isso, o Brasil continuará a passar vergonha.

A Lula o que é de Lula

O Estado de S. Paulo

O petista diz que o governo falha ao comunicar suas conquistas à população e avisa que vai ‘falar mais’. Mas esse é precisamente o problema: sempre que Lula fala, os problemas se agravam

Ao participar do encerramento de um seminário do PT destinado a debater os rumos do partido – aquele tipo de encontro em que o comissariado petista costuma reafirmar vícios do passado para aprimorá-los no futuro –, o presidente Lula da Silva fez uma crítica contundente à comunicação do governo. “Há um erro do governo na questão da comunicação e sou obrigado a fazer as correções necessárias”, disse o presidente, em declaração interpretada como um prenúncio de que em breve trocará o responsável pela área, o desgastado ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República. “Quero começar a resolver no começo de ano”, avisou. Apoquentado com o que considera um abismo entre suas grandes realizações e a tépida aprovação popular, Lula endossou e inflamou as queixas já recorrentes num tema que ganha evidência toda vez que o demiurgo sente que seus poderes divinos não estão sendo bem compreendidos.

A fala amuada de Lula contra a comunicação do seu governo até adquiriu contornos inéditos pelas palavras duras que escolheu, mas na prática ele só repetiu o velho hábito de terceirizar a responsabilidade por problemas que nascem, no fundo, no próprio gabinete presidencial. A Lula o que é de Lula: a despeito da inquestionável má qualidade da comunicação no atual mandato e do baixo nível de conhecimento dos seus artífices sobre as dinâmicas do ambiente digital, o defeito de origem está no produto, não no marketing destinado a vendê-lo. O fato é que não há ministro, marketing político ou estratégia de qualidade capaz de vender um produto ruim.

Ocorre que, com a fritura pública de Pimenta, a bolsa de apostas para substituí-lo já tem até favorito: o marqueteiro do presidente na eleição vitoriosa de 2022, Sidônio Palmeira, ideia que teria ganhado corpo após o ruidoso anúncio que misturou, em rede nacional de rádio e TV, o pacote de ajuste fiscal e a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. Coube a Sidônio a ideia de combinar as duas coisas e adornar a fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, convertida no primeiro ato de uma campanha institucional, lançada com slogan marqueteiro e consistência duvidosa. A mistura, o timing e a forma do anúncio provocaram estragos adicionais em um pacote que deveria comprovar a alegada sobriedade econômica do governo, mas foi levado adiante como peça de propaganda eleitoral. Ao que parece, contudo, Lula considerou a operação um sucesso.

Não faltou nem mesmo a velha tática de afetar humildade, quando Lula se incluiu entre os responsáveis pelos problemas de comunicação: “Há um equívoco meu na comunicação. O Stuckert (referência a seu fotógrafo oficial, Ricardo Stuckert) costuma dizer ‘presidente, o senhor é o maior comunicador do nosso partido, o senhor tem que falar mais’. E a verdade é que não tenho organizado as entrevistas coletivas”. Então estamos combinados: Lula, que já fala pelos cotovelos, avisou que vai “falar mais”.

E talvez seja exatamente esse o problema. Quando Lula fala, quase sempre de improviso, ou cria expectativas incompatíveis com a capacidade do governo de realizá-las, ou constrange a equipe econômica com discursos demagógicos que contrariam o compromisso com a saúde das contas públicas. O resultado é a crescente falta de credibilidade do governo.

Mas Lula está convencido de que seu governo é um primor e que a maioria dos brasileiros se convenceria disso se o presidente concedesse “mais entrevistas” – sobretudo para meios escolhidos a dedo pelo Palácio por deixarem Lula à vontade.

Enquanto isso, Lula não comenta sobre os problemas de coordenação política (liderada por ele mesmo), ou sobre a falta de um núcleo dirigente no Planalto capaz de corrigir os rumos ditados pelo presidente, ou ainda sobre a malaise provocada por um governo que chega envelhecido à metade do mandato. Como se vê, o que o presidente espera da comunicação do seu governo é algo que diz respeito mais a ele próprio. Uma certeza que só escancara a inutilidade do debate proposto na reunião do PT.

Justiça companheira

O Estado de S. Paulo

Se fosse estadista, Lula se empenharia em desarmar o círculo vicioso de politização da Justiça e judicialização da política. Como não é, está colonizando a Justiça com leais servidores

Há tempos as pesquisas de opinião registram que a credibilidade do Judiciário junto à população, em especial a do Supremo Tribunal Federal (STF), diminuiu na exata proporção em que cresce a percepção de seu protagonismo político. Há pelo menos dez anos está em curso um círculo vicioso e antirrepublicano que não dá sinais de arrefecer: a judicialização da política retroalimentada pela politização da Justiça.

Há razões estruturais para isso. A Constituição de 1988 é um documento excessivamente abrangente e prolixo que, como já notou o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, “constitucionalizou inúmeras matérias que, em outras partes do mundo, são deixadas para a política”.

Mas há razões conjunturais. Os freios e contrapesos estão estiolados. Sob chefes do Executivo fragilizados, o Congresso assumiu para si prerrogativas exorbitantes, mormente sobre o Orçamento, gestando uma espécie de parlamentarismo bastardo, em que os caciques têm muito poder e pouca responsabilidade. Com o colapso do presidencialismo de coalizão, ante um Legislativo indócil, o Executivo tem buscado no Judiciário um fiador da governabilidade.

Chamada para a dança política, a Suprema Corte não se fez de rogada, e tomou gosto em atuar ora como poder moderador da República, ora como poder tensionador, seja ditando políticas públicas às instâncias executivas, seja legislando a pretexto da “omissão” das Casas Legislativas. Na Lava Jato, instâncias inferiores do Judiciário se auto-outorgaram uma espécie de “competência universal de combate à corrupção”. Hoje, é o STF quem assume para si uma “competência universal de defesa da democracia”.

Os próprios representantes eleitos contribuem para a politização da Justiça. Partidos nanicos, sobretudo de esquerda, abusam do tapetão judiciário para reverter ou impor nas cortes causas que perderam no voto. “Nós temos culpa de tanta judicialização”, confessou ninguém menos que o presidente Lula da Silva, no início de seu mandato, num raro surto de sinceridade. “A gente perde uma coisa no Congresso Nacional e, ao invés de a gente aceitar a regra do jogo democrático de que a maioria vence e a minoria cumpre aquilo que foi aprovado, a gente recorre a uma outra instância para ver se a gente consegue ganhar.”

Se fosse o estadista que finge ser, Lula teria buscado sanear esse estado de coisas, desestimulando seus partidários de recorrerem ao tapetão sempre que perdem no voto e fazendo indicações técnicas para a Justiça. Ao contrário, Lula mandou às favas o pudor e o notório saber jurídico e indicou para o STF seu amigo e advogado Cristiano Zanin e o também amigo e correligionário Flávio Dino, realizando um “sonho antigo” de instalar nele alguém com “cabeça política”.

A colonização da Justiça não para por aí. Como mostrou reportagem do Estadão, Lula tem se dedicado com afinco a forrar não só o Executivo, mas tribunais superiores e regionais, além de órgãos e autarquias com leais servidores. As nomeações ligadas ao grupo de advogados militantes de esquerda Prerrogativas chegam às dezenas.

Respeitadas as prioridades técnicas, seria natural indicar figuras que compartilhem de uma visão progressista sobre a coisa pública. Mas não se trata apenas de alinhamento ideológico. Se fosse, a indicação de Joaquim Barbosa ao STF, em 2003, não seria considerada “desastrosa”, como disse um interlocutor próximo ao presidente à reportagem. Do que se sabe de suas manifestações públicas, Barbosa comunga dos ideais progressistas, mas seu pecado foi ter aplicado a lei no julgamento do mensalão petista.

“Estou convencido que tentar mexer na Suprema Corte para colocar amigo, para colocar companheiro, para colocar partidário é um atraso”, disse o então candidato Lula na disputa presidencial de 2022. Já o presidente Lula parece convencido de que se trata de um avanço. “A gente ganhou mais malícia”, disse o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Prerrogativas e amigo de Lula. Quando a malícia é critério para indicações na Justiça, o corolário, por necessidade lógica, é um só: más escolhas e más consequências para a legitimidade do Judiciário.

Coração de mãe

O Estado de S. Paulo

Ao que parece, sempre cabe mais um custo na conta de luz para satisfazer lobbies

Originalmente elaborado no Senado, o projeto de lei que torna viável o programa de instalação de usinas eólicas em alto-mar (offshore) ganhou oito emendas na passagem pela Câmara dos Deputados, com potencial para encarecer o custo da energia em R$ 25 bilhões ao ano, calculou a PSR Energy. De volta ao Senado, uma emenda foi retirada, a consultoria refez os cálculos e chegou à conclusão de que o estrago diminuiu, mas ainda é de R$ 21 bilhões ao ano, o que representa acréscimo de 9% nas contas de luz. E foi incorporando esse adicional aos consumidores que o projeto foi aprovado.

O pior, como lembrou reportagem do Estadão, é que as emendas são jabutis, ou seja, nada têm a ver com as usinas offshore que aproveitarão a força dos ventos para produzir energia. Algumas, ao contrário, têm como objeto beneficiar geradoras fora do escopo de fontes renováveis e limpas do processo de transição energética, como o acionamento de térmicas a gás mesmo que não haja necessidade – os chamados contratos inflexíveis –, e a extensão do subsídio para geração a carvão, a mais poluente de todas, até 2050. Tudo financiado com o dinheiro extra pago nas tarifas.

Virou rotina enxertar nas contas de luz custos que os usuários de eletricidade nem imaginam estar bancando, todos autorizados por lei. De vez em quando alguns são barrados no Congresso. Recentemente, a Câmara abateu outro jabuti pendurado no projeto do “combustível do futuro” por um senador interessado em estender desnecessariamente os subsídios à energia solar. No Senado, o “jabuti solar” retornou, agora inserido no projeto das eólicas, e a prorrogação foi aprovada.

Os “jabutis elétricos” atendem grupos com grande influência entre os parlamentares e, em muitos casos, com interesses conflitantes entre si. A declaração do relator do projeto, senador Weverton Rocha (PDT-MA), chega a surpreender pela naturalidade com que trata a matéria. “Todos competem com o outro setor de forma muito dura, mas nenhum veio me pedir para abrir mão dos subsídios que tem. Nenhum!”

A forma como os variados lobbies do setor elétrico atuam e a receptividade que encontram entre os parlamentares aviltam o Congresso e achincalham todos os usuários de eletricidade. Por vezes, até parecem fazer sentido, como o incentivo à geração solar, justificável de início, mas não agora, com o mercado consolidado. Com a marca histórica de 50 gigawatts (GW) de potência instalada de energia solar, o Brasil passou a integrar o grupo dos seis países com maior produção fotovoltaica do mundo. Os subsídios não fazem mais sentido, muito menos aqueles custeados pelos consumidores.

Há dois anos, em coluna publicada neste jornal, a economista e advogada Elena Landau, especialista no setor de energia, já atestava que a tarifa de energia elétrica, naquela época, não refletia “nem a abundância de fontes nem o avanço tecnológico e de produtividade que as renováveis atingiram no País”, mas sim o poder de lobbies setoriais.

E com isso o consumidor paga um adicional dobrado: pela energia limpa e também pela poluente.

Remuneração e competitividade

Correio Braziliense

Com uma economia evoluindo rapidamente, concomitantemente aos impactos que esse avanço ocasiona, estar atento ao bem-estar dos colaboradores é uma prática fundamental nos tempos atuais

A tecnologia impacta de forma contínua e acelerada os modos de produção e o mercado de trabalho. Nesse quesito, a gestão de remuneração torna-se uma estratégia essencial dentro das empresas, já que visa valorizar, reconhecer e atrair os talentos. No Brasil, a implementação desse tipo de organização ainda é um desafio que precisa ser superado para que o país permaneça competindo no mundo dos negócios.

Com uma economia evoluindo rapidamente, concomitantemente aos impactos que esse avanço ocasiona, estar atento ao bem-estar dos colaboradores é uma prática fundamental nos tempos atuais. Diante de um cenário complexo, reter funcionários qualificados é um diferencial que vem se mostrando condição de sucesso dos grandes conglomerados.

Na realidade dos empregadores brasileiros, em que alguns setores por vezes sentem a escassez de determinados profissionais, a diretriz de gestão de remuneração precisa ser desenvolvida, encarando, inclusive, ações corretivas sobre a equidade salarial de gênero e de raça.

Nesse campo, novamente a tecnologia aparece de maneira determinante. A inteligência artificial (IA), com sua capacidade precisa de levantamento de dados, é uma ferramenta que faz a diferença no amplo processo de busca de soluções personalizadas de remuneração.

Hoje, o engajamento da força de trabalho é cada vez mais dinâmico e reúne uma gama de especificidades por parte dos colaboradores, indo muito além da relação entre produtividade e salário. A expertise dos parceiros encabeça essa equação, mas é preciso considerar muitos outros aspectos para motivar e cativar as aspirações dos novos profissionais.

Em um ambiente de ampla concorrência proporcionada pelo trabalho remoto, no qual o empregador pode estar em qualquer lugar do planeta, modelos eficientes de remuneração são atrativos para os talentos, já que eles têm a oportunidade de escolher globalmente.

No Brasil, assim como em outros países latino-americanos, empresas internacionais recrutam cada vez mais pessoas para ocupar posições importantes em seus quadros, estendendo as possibilidades para o trabalho realizado a distância até mesmo em funções de CEO. Essa mudança transforma também a expectativa dos funcionários sobre a política que define como serão recompensados, determinada pela crescente valorização de estruturas salariais personalizadas e flexíveis. Componentes variáveis, como bônus ou prêmios vinculados a ações, são condições que ocupam espaço crescente em diversas áreas. Sem contar a garantia da qualidade de vida, com a adequação de jornadas e a entrega da estrutura ideal para a execução do serviço.

Com pressões diárias sobre o resultado final e uma concorrência sem fronteiras, as empresas no país têm de ser mais criativas no plano da recompensa salarial, construindo laços diferenciados com os funcionários. A busca por incentivos deve ser uma rotina na gestão de remuneração, assim como a introdução de planos capazes de dar respostas rápidas às demandas do trabalhador. Para não perder seus talentos, o empregador no Brasil precisa criar mecanismos de maior velocidade e flexibilidade, assegurando a satisfação do funcionário. A geração que está entrando no mercado demonstra determinação para decidir os próximos passos sem abrir mão dos seus anseios. As empresas não podem ignorar esse fato se quiserem ter habilidades no quadro de pessoal que aumentem a competitividade em âmbito global.

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