domingo, 15 de dezembro de 2024

Sobre “putas”, “quadros” e “crioulos” – Alfredo Maciel da Silveira

Outro dia postei fazendo elogios, recente discurso da Ministra Simone Tebet, que adjetivei como “carismática”. Minha vontade fora dizer que a Ministra é “uma puta quadro”!

Mas “puta”?...

Vacilei e omiti!

Desculpem-me os etnólogos, antropólogos e sociólogos. Mas vou entrar em seara alheia.

Pra começar. Conheci há décadas o significado de “cadre” na etimologia francesa. E posso afirmar, nesta altura da vida, que eu sou um “quadro”, ainda que, parodiando Marx, pertenço ao “EIR- Exército Intelectual de Reserva”.

Em fins dos anos 70, não sei se antes ou depois da Anistia, vi Betinho pela primeira vez, discursando num daqueles encontros históricos no auditório da ABI. E de um companheiro ao meu lado na plateia, ouvi pela primeira vez: “É um puta quadro”!...

Dos tempos da escravatura, dizia-se do escravo fujão, chamar-lhe “crioulo safado”. Daí me parece que vem a imputação negativa, no Brasil do significado de “crioulo”.

Mas já dizia João Saldanha, quando a seleção brasileira ia mal das pernas: “Tá faltando crioulo na seleção”! O significado era claríssimo. Tratava-se da ginga, da inteligência, tenacidade, adrenalina, alegria e malícia, da nossa África, da capoeira, samba, sincretismo da Umbanda, e futebol!

Sempre bom lembrar, na seleção brasileira de 1970, havia muitos negros. Mas no tratamento entre os companheiros, “o crioulo”, e até hoje, havia um só”!...

Quando em Moscou, início dos anos 80, assisti a uma dança coreográfica, espontânea, amadora, de camaradas sul-africanos, do partido “Congresso Nacional Africano” (isto antes da libertação). Éramos colegas numa Escola de Quadros onde nós brasileiros até batíamos um sambinha. Mas quando vi aqueles sul-africanos, pensei emocionado: “Meu Deus! Isto é Brasil!”

Dos EUA, impossível ignorar o irradiado “soft-power” cultural com suas raízes no “Soul” das “plantations”, no “Blues”, no “Rock”, nos corais Gospels, no canto e dança do “Charm”, do “Rap”, do "Funk", tudo isso antropofagicamente metabolizado pela cultura popular brasileira!

O que não dá pra engolir vindo de lá é esse tal “racialismo”, do tipo “African Americans”, muito próprio talvez, se tanto, pra eles, minoritários lá. Mas aqui, pelo que me dizem, já não se pode dizer “negro”, mas sim “preto”.

E nossas brasileiríssimas “mulatas”?

E índio? Agora “indígena”...

Pra terminar, uma tristeza.

Numa viagem de trem pelo subúrbio carioca, sentados ao meu lado, um casal de negros discutia acaloradamente sobre o tratamento dispensado por clientes brancos do Leblon ao “faz-tudo” negro que se dizia respeitado. A mulher, fazendo caras e bocas da malandragem, exclama:

”Tu é preto, mas não é o Pelé”!...

6 comentários:

  1. Conheço muitas pessoas que acham que designar alguém de preto é racismo.

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  2. Verdade. Muitos dizem "escuro".
    Mas o identitarismo imitativo vindo dos EUA, adota o "preto" ("black"), e condena " negro"...
    Ridículo!

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  3. Meu saudoso amigo Jorge da Silva, preto, coronel da PMRJ, advogado e professor de língua inglesa, usava "preto", mesmo. Usava crioulo, etc. Escreveu um livro, cujo nome me escapa, premiado pela OAB no centenário da Abolição.

    O identitarismo pode ser útil quando serve para despertar a consciência e danoso quando adota a via do maximalismo, da excusão de outro.

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    1. Sim. Mas espero que seja passageira a histeria maximalista.

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  4. Preto, negro, crioulo, etc., são apenas jeitos de chamar uma pessoa de pele escura. Isto pode ser feito num contexto de respeito, amizade, carinho, gozação, descontração ou tb desrespeito, afronta, ameaça, desprezo. O mesmo se dá com os termos branco, branquela, gringo, alemão, embora menos usados em geral. O simples uso não deveria ser motivo de discórdia ou problema, se ocorresse num contexto de claro respeito.

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  5. Sim. E na Bahia, mesmo sendo branco, poder ouvir: ___" Se achegue meu nego"!...

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