terça-feira, 19 de novembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lei Antiterrorismo deveria incluir motivação política

O Globo

Omissão, resultado de pressão de movimentos sociais, torna legislação mais branda com a barbárie

Investigações sobre o atentado na Praça dos Três Poderes na semana passada mostram que o autor premeditou meticulosamente suas ações. Saiu de Rio do Sul (SC), alugou uma quitinete onde foram encontrados explosivos, instalou um trailer perto das sedes dos Poderes, comprou fogos de artifício, anunciou nas redes sociais seu intuito e se explodiu na frente do prédio do Supremo Tribunal Federal. Em suas redes, foram encontradas críticas ao Supremo, aos presidentes da República, da Câmara e do Senado. Foi um ato com todas as características de terrorismo. Mas não para a legislação brasileira.

O diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirma que não há respaldo jurídico para enquadrar o caso como ato terrorista. Isso porque a Lei Antiterrorismo não prevê motivação política ou ideológica. Aprovada pouco antes da Olimpíada do Rio em 2016, ela define terrorismo como prática que visa a atingir um grupo em razão do preconceito de raça, etnia, cor, religião ou xenofobia. “Não se aplica a conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe, ou de categoria profissional, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais”, diz o texto.

O mundo multipolar das potências médias - Dani Rodrik*

Valor Econômico

Cenário mais provável é um mundo em que as potências médias exerçam uma força compensatória considerável, impedindo assim que EUA e China imponham seus interesses aos outros

A ascensão da China desafiou a hegemonia incontestável dos Estados Unidos sobre a economia mundial - status do qual os EUA desfrutam desde o colapso da União Soviética. Enquanto algumas elites americanas de segurança nacional buscam manter a primazia dos EUA, outras parecem resignadas a um mundo cada vez mais bipolar. Um resultado mais provável, no entanto, é um mundo multipolar em que as potências médias exerçam uma força compensatória considerável, impedindo assim que EUA e China imponham seus interesses aos outros.

As potências médias incluem a Índia, a Indonésia, o Brasil, a África do Sul, a Turquia e a Nigéria - todas grandes economias com presença significativa na economia global ou em suas regiões. Elas estão longe de ser ricas - na verdade, representam uma parcela significativa das pessoas mais pobres do mundo -, mas também têm classes médias grandes e voltadas para o consumo e capacidades tecnológicas consideráveis. O PIB combinado (em termos ajustados pelo poder de compra) dos seis países mencionados acima já supera o dos EUA e a projeção é de que cresça 50% até 2029.

‘O mundo está pior’? - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Mesmo envolvendo o combate à fome, tema impossível de divergir, cenário internacional é desafiador

O presidente Lula, presidindo a cúpula do G20 num maravilhoso dia de sol no Rio de Janeiro e com a presença dos principais líderes mundiais, inaugura uma nova aliança global de combate à fome. Uma notícia assim, 20 anos atrás, seria a consagração máxima de um líder que ruma para a apoteose.

Neste fim de 2024, no entanto, o sentimento é outro. Apesar do dia de sol, o clima é sombrio. Foi o próprio Lula que, com muito realismo, reconheceu em seu discurso de abertura: "Estive na primeira reunião de líderes do G20, convocada em Washington no contexto da crise financeira de 2008. Dezesseis anos depois, constato com tristeza que o mundo está pior."

E por que piorou? Em primeiro lugar, porque está mais dividido. Isso faz com que seja difícil chegar a consensos sobre qualquer tema. Como falar algo relevante sobre guerras num grupo que reúne RússiaChinaEUA Europa? Melhor manter apenas um genérico apelo pela paz. Lula tem o mérito de abraçar um dos poucos temas dos quais (ainda) é impossível divergir: o combate à fome.

Salvando o mundo num feriadão - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Com sensação temporária de segurança no feriadão, cúpula internacional discute taxação dos super-ricos

O esquema em vigor no G20, com policiais estaduais e federais e tropas das Forças Armadas, foi usado pela primeira vez na Eco-92. Na época pareceu uma panaceia. Com blindados, metralhadoras e lança-morteiros apontados para a Rocinha, o carioca jamais havia desfrutado de maior sensação de segurança –expressão que virou lugar-comum na imprensa e na boca de políticos.

Depois se verificou que os registros de violência caíram na zona sul e permaneceram altos no resto da cidade. No fundo era só uma sensação regional e com prazo de validade, a qual se repete agora. Se bobear, nem isso: dois carros a serviço da Presidência foram roubados, um na quinta (14), outro no sábado (16). Foi mais ou menos assim na Rio+20, em 2012; na Jornada Mundial da Juventude, em 2013; na Copa do Mundo, em 2014; nas Olimpíadas, em 2016.

Ditos e feitos de Janja - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Atitudes de quem não tem cargo público podem, por vínculos familiares, atrapalhar ações de um governo

Rosângela Lula da Silva, a Janja, soltou um f**k you para Elon Musk, criando uma dor de cabeça para o Itamaraty. O próprio Lula, que tenta driblar vários touros ao mesmo tempo nas negociações para a declaração final do G20, teve de vir a público para pedir que ninguém xingue ninguém.

Estou terminando de ler "O Mundo", de Simon Sebag Montefiori, livro ao qual ainda dedicarei uma coluna. O autor mostra com muitos exemplos que um ponto fraco dos regimes hereditários é a variação geracional. O filho de um grande monarca pode ser e frequentemente é um completo imbecil (casamentos consanguíneos ampliam essa possibilidade).Mesmo quando o contraste não é tão gritante, um bom governante pode ter como herdeiro um sujeito sem gosto ou aptidão para o poder. Sistemas políticos em que o líder é escolhido por um seletorado estão menos sujeitos aos caprichos da loteria cósmica. E quanto mais amplos o seletorado e o rol dos candidatos, menores as chances de interesses individuais, familiares ou setoriais darem as cartas.

Descontração tem limite – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Janja ainda encarna o papel de militante que não condiz com sua atual posição

A informalidade em figuras públicas pode ser um ativo, fator de identificação popular, se bem aplicada. Ou pode deslizar para o terreno da inconveniência quando seus autores não observam os limites da compostura adequada ao lugar que ocupam.

Tem sido o caso de repetidos excessos da mulher do presidente Luiz Inácio da Silva (PT) em situações oficiais. Rosângela da Silva demonstra não ter desencarnado do papel de militante de esquerda do qual precisaria se desvincular antes de criar um problema mais sério para o governo e ao país.

Pragmatismo tomou posse antes de Trump - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Lula e Milei produzem frieza para as redes sociais e acordos para os interesses nacionais

Ao subir a rampa do Museu de Arte Moderna no Rio para ser recebido pelo anfitrião, o presidente argentino protagonizou a troca de cumprimentos mais fria da abertura do G20. Nos 20 segundos em que durou a cena, coube apenas um aperto de mão e uma foto sem sorrisos dos quatro, Javier Milei e a irmã, Karina, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a primeira-dama, Janja da Silva. Contrastou com os demais chefes de Estado. Joe Biden posou de mãos dadas com Lula e Emmanuel Macron deu até uma corridinha na rampa para abraçar o presidente brasileiro. Foi uma frieza moldada para as redes. Milei não apenas assinou tudo o que o Brasil queria como ainda fechou um acordo que Lula não conseguiu arrancar de Alberto Fernandez.

Ufa! A diplomacia venceu – Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

G-20 e Aliança Global contra a Fome e a Pobreza são ‘gol de placa’ do Brasil

Depois de escorregões na política externa e apesar do voluntarismo juvenil da primeira-dama Janja, a cúpula do G-20, que reúne as maiores economias do mundo, e a criação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que nasce com adesão de 82 países, estão sendo um grande momento e uma vitória do Brasil, portanto, do governo e de Lula.

“A Aliança Global e a própria Cúpula são um gol de placa do Brasil”, comemorou o embaixador aposentado Rubens Barbosa, que nunca foi identificado com o PT e o lulismo, mas, sim, como um diplomata profissional e pragmático, que foi embaixador em Washington no governo FHC. O mérito do gol é do Itamaraty, mas é preciso reconhecer o empenho e a habilidade política do presidente.

O pacote quase-lá - Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Falta pouco. Mais um detalhezinho. Mais um mais um detalhezinho. E então será. “Brevemente”, comunica Fernando Haddad, teremos o pacote de corte de gastos estruturais do governo Lula. Uma resposta ao aumento estrutural de gastos que o governo Lula acelerou. Estamos quase lá.

Evoluiu-se. Faltavam “dois detalhes” em 6 de novembro, “coisas realmente muito singelas para decidir” – projetava Haddad. Tinham se encerrado as conversas com os ministros, aquelas das quais saíam disparando, e havia “consenso em torno de um princípio”.

Minha primeira anotação sobre o plano para essa nova rodada de contenção de despesas é de 15 de outubro. Viria depois do segundo turno das eleições municipais. Seria um “pacote relevante”. Simone Tebet definira até a faixa dentro da qual transitaria o corte, entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões – em 2025.

Estava em curso uma blitz de propaganda para acalmar os fazedores de preços. Anunciava-se o anúncio – com o que se esperava segurar o dólar. Negativo.

No dia 17 de outubro, anotei a curiosidade de Lula ser simpático, assim se plantava, a um conjunto de medidas que – estava dito – desconhecia. Não poderia conhecer o que (ainda) inexistia.

O futuro e a Ordem dos Advogados do Brasil - Luiz Antonio Sampaio Gouveia

O Estado de S. Paulo

A OAB deve impor-se em prol da cidadania, do Estado de Direito e da liberdade, porque ela não pode ser uma ONG, um clube de serviços ou um sindicato

Advocacia dever-se-ia grafar com “a” maiúsculo por ser uma instituição constitucional, essencial à concretização da justiça. Equivocam-se os que a redigem com “a” minúsculo porque diminuem sua expressão simbólica no quadro em que concorre para efetivação da Constituição com instituições públicas, como a magistratura, o Ministério Público e a Defensoria Pública, e a reflexão que se pode extrair desse contexto é própria do momento em que se realizam eleições para os quadros dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

As primeiras instituições de ensino do Direito formavam bacharéis a atender à demanda do Estado, como, por exemplo, as escolas de São Paulo e do Recife. A Advocacia enquanto instituição privada não se personificava juridicamente e fora parceira menor da magistratura e da promotoria, enquanto a maior parte dos bacharéis não integrantes do serviço estatal dirigiam-se à política. As entidades de congregação da Advocacia (do século 18 ao início do século 20) nem eram de representação ou disciplina legais para os advogados. Mas eram associações que denominados institutos mais se dedicavam à reunião de seus pares objetivando a cultura jurídica sobretudo livremente do poder.

Discussão necessária - Jorge J. Okubaro

O Estado de S. Paulo

O confronto dos custos dos benefícios dos militares com os dos trabalhadores civis deixa muitas indagações

A discussão sobre a necessidade de mudanças no sistema de proteção social dos militares pode criar mais problemas para o governo. Ao escolher um político com boas relações na cúpula das Forças Armadas para ocupar o Ministério da Defesa, o presidente Lula da Silva recebeu fortes críticas de companheiros do PT. Mas parecia ter aquietado um braço do Estado com o qual seu partido nem sempre mantém entendimento fluente. A comparação dos gastos com “o conjunto integrado de direitos, serviços e ações, permanentes e interativas, de remuneração, pensão, saúde e assistência” dos militares (como a legislação define o sistema de benefícios sociais e previdenciários desses profissionais) com o custo da Previdência dos servidores civis e dos demais trabalhadores, porém, mostrou disparidades tão gritantes que assustam. E podem gerar atritos políticos.

Sementes envenenadas - Merval Pereira

O Globo

Existe um clima violento na política brasileira que precisa ser contido. A tentativa de golpe em 2023 e este atentado agora não podem ser vistos como normais. É preciso uma reação contundente, para evitar repetição e que esse clima tome conta do país

Comparar o atentado a faca sofrido pelo candidato Bolsonaro na campanha presidencial de 2018 com o da semana passada em Brasília, quando o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) foi mais uma vez atacado por bombas caseiras, é misturar alhos com bugalhos. Os dois atentados terroristas foram perpetrados por indivíduos conhecidos como “lobos solitários”, mas os contextos são completamente diferentes. No de Bolsonaro, não havia nenhum clima de radicalização na campanha que estimulasse o assassinato do candidato, ao contrário. Era Bolsonaro quem insuflava a violência durante seus discursos.

O atentado recente, em contraste, está claramente ligado aos acontecimentos de janeiro de 2023, quando hordas de manifestantes, com a conivência das forças policiais, avançaram sobre a Praça dos Três Poderes a fim de depredar os prédios simbólicos da República — Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo —, numa demonstração de força que prenunciaria o golpe de Estado.

A IA chegou a um limite? – Pedro Doria

O Globo

Tudo o que está na internet e pode ser usado para treinar os modelos já se esgotou

Os meses passam, e não há notícia de GPT 5, de Claude 3.5, de Gemini 2. Os atuais LLMs, modelos de linguagem de grande porte, estão na terceira geração. A expectativa da iminência de uma quarta é grande — mas temos poucas pistas de como vai seu desenvolvimento. Ou ao menos tínhamos poucas pistas. Na semana passada, três veículos de imprensa trouxeram a informação de que há dificuldades nas três companhias — OpenAI, Anthropic e Google. Dificuldades que ninguém esperava.

Primeiro foi The Information, o site ultraespecializado que cultiva as melhores fontes no Vale do Silício. Orion, a nova versão do GPT, tem ficado superior à versão atual. Mas numa escala de melhoria bastante inferior. O salto da versão 2 para a 3 foi enorme, da 3 para a 4 maior. Esta 5 parece estar aquém. É razoavelmente melhor em texto, mas para código de programação não parece ser tão superior. Como a informação para o site foi em off, não há muitos detalhes.

Os avanços do Brasil no G20 - Míriam Leitão

O Globo

A soma de avanços globais, como o combate à fome e a citação dos super-ricos, consolida o sucesso da presidência brasileira no G20

A presidência do Brasil no G20 veio construindo consensos e avanços concretos durante o ano todo. Mesmo assim, o dia de ontem foi intenso. A crise provocada pelo ataque russo à Ucrânia levou o G7 a pedir a reabertura da declaração conjunta, já fechada, e o Brasil resistiu. Aceitou depois incluir duas palavras que não alteravam o texto. A Argentina criou problemas em vários pontos que já estavam acordados e não queria fazer parte da Aliança contra a Fome. Depois, recuou e disse que não atrapalharia o consenso. O presidente Lula tinha pedido para manter-se o dia inteiro na sala e ficou até sair o comunicado conjunto.

Lula ri por último na reunião do G20 – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O presidente brasileiro defendeu a taxação de operações financeiras de super-ricos, para financiar o combate às desigualdades

Se não houver nenhum imprevisto grave ou ninguém falar besteira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já pode comemorar o seu sucesso pessoal na reunião do G20, o grupo dos países mais ricos do planeta, com a adesão da Argentina à Aliança contra a Fome e a Pobreza, num documento final que fala em reforma do Conselho de Segurança da ONU, taxação de super-ricos e combate ao aquecimento global. Recalcitrante, o presidente argentino, Javier Milei, havia criticado o texto, mas voltou atrás depois de exaustivas negociações entre os diplomatas que articularam a declaração do grupo.

A unanimidade do encontro a favor do combate à fome e à pobreza é uma vitória pessoal de Lula. São 82 países, entre os quais os mais ricos do mundo, e 148 organizações internacionais, instituições financeiras e ONGs que apoiam a iniciativa, uma bandeira de Lula desde o primeiro mandato.