quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

O governo a reboque das redes sociais - Bruno Carazza

Valor Econômico

Recuo no caso da fiscalização das transações de pix gera dúvidas se agora a popularidade digital vai nortear a economia

A primeira polêmica econômica do ano é um indicativo de como pode ser a tônica do governo Lula na segunda metade de seu terceiro mandato: uma administração extremamente focada nas repercussões de suas ações nas redes sociais e, consequentemente, com uma alta tendência ao populismo.

A determinação de Lula para que se revogasse o ato normativo da Receita Federal sobre a fiscalização das transações realizadas por Pix, após as reações negativas nas redes e a onda de fake news que se formou, é mais um episódio de como a condução da política econômica parece estar a reboque dos objetivos políticos.

A regulamentação da Receita, em si, fazia todo o sentido econômico: apertava o cerco contra sonegadores, estendendo às operações via pagamentos instantâneos a mesma atenção dada a outras transações bancárias, imobiliárias, de moeda estrangeira, entre outras.

No entanto, vivemos a era das polêmicas digitais, e logo o sentido da medida foi distorcido numa série de postagens e vídeos compartilhados à exaustação por grupos de direita, anti-Estado e anarco-capitalistas.

O governo até que tentou, com a contribuição da imprensa, explicar melhor a medida e desmentir os boatos de que iria começar a taxar as transações via Pix. A estratégia estava funcionando, e com certeza a repercussão negativa passaria com o tempo, como acontece sempre.

Mas o governo cedeu à pressão e recuou. Preferiu revogar uma medida necessária a continuar sofrendo o desgaste nas redes sociais – e isso é bastante preocupante.

Não por acaso, desde terça (14/01), a Presidência da República tem à frente da sua Secretaria de Comunicação um marqueteiro, Sidônio Palmeira, que tomou posse prometendo melhorar as estratégias de divulgação das ações do governo nos ambientes virtuais.

Pelo visto, a influência de Palmeira irá muito além da conexão do governo federal com o público; suas diretrizes devem moldar as próprias decisões do governo pelas métricas da popularidade digital.

De certa forma, esse episódio da fiscalização do Pix se conecta também com o anúncio das medidas de ajuste fiscal feito pela equipe econômica no início de dezembro, e que desencadeou toda a crise nos mercados verificada nas últimas semanas. Naquele momento, o governo decidiu apresentar as desagradáveis medidas de contenção de gastos embrulhadas com a promessa de ampliação da isenção de imposto de renda para as pessoas que ganham até R$ 5 mil mensais.

Em comum, ambos os episódios revelam que as ações do governo na economia estão sendo condicionadas pela preocupação de Lula e seu entorno com as repercussões na popularidade presidencial.

Se no caso do pacote de medidas fiscais pelo ajuste de gastos a equipe econômica se viu obrigada a dourar a pílula com a promessa de uma isenção tributária, no evento da fiscalização dos pagamentos por Pix o medo da reação negativa nas redes fez o Ministério da Fazenda retroceder. Em ambos os acontecimentos, prevaleceu o interesse político-eleitoral sobre a lógica econômica.

Ao colocar o monitoramento da sua popularidade nas redes sociais como norte para as decisões governamentais, o governo caminha perigosamente rumo ao populismo econômico, ainda mais diante de uma conjuntura externa e interna desafiadora e uma base política frágil no Congresso.

E essa tentação tende a crescer à medida que 2026 se aproxima.

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