Folha de S. Paulo
Festa do risco não tem hora para acabar,
cenário indica Selic bem maior, bola está com governo
Não houve grande novidade no comunicado em
que o Banco
Central informou ao público sua
decisão de elevar a Selic de 12,25% para 13,25%. Mas houve alguma novidade:
1) menção enfática ao risco de danos da política econômica de Donald Trump; 2) menção explícita do risco de o desemprego baixo no Brasil acabar em mais inflação; 3) a projeção de inflação do BC para o "horizonte relevante" de sua atuação continuou em 4%. Quer dizer, nem a promessa de arrocho refrescou o IPCA anual previsto para o terceiro trimestre de 2026.
As
expectativas de inflação continuam em alta, a inflação de serviços continua
pressionada, o PIB estaria em ritmo acima do que a economia aguenta sem
produzir inflação. A economia "externa" (EUA) e interna (gastos do
governo) podem desvalorizar o real ainda mais.
O que era ruim, ficou algo pior. Não há dica
quanto ao futuro da Selic: decisões
serão ditadas pelo compromisso de cumprimento da meta. Inflação perto de 3% em
2026? Nesse cenário atual ruim? Selic a 15% ficaria barato.
O comunicado do BC não inventou moda. Mas
repete e enfatiza que a bola está com o governo.
O
Fed não tem pressa para "ajustar a política monetária". A taxa
básica de juros está
acima do nível neutro. Ainda é preciso haver sinais de folga no mercado de
trabalho e/ou que a inflação irá para a meta até o ano que vem (a medida de
inflação preferida pelo Fed está 2,6%;
a meta é de 2%; se cair para uns 2,3% até meados do ano, haveria relaxamento
nos juros, estima-se).
Foi o que disse Jerome Powell, presidente do
Fed com mandato até maio de 2026, nesta quarta. Powell fez questão de insinuar,
por assim dizer, que o Fed é independente. Trump não gosta de nada disso.
A taxa básica está em 4,5% ao ano. No início
de Trump 1, em 2017, estava em 0,5%. Foi a 2,5% em 2019, antes de ser talhada a
zero, de novo, por causa da epidemia. Na maior inflação das últimas quatro
décadas, chegou a 5,5% em 2023-2024, taxa mais alta desde o início do século,
próxima dos 5,25% de 2006-2007, antes da explosão da crise de 2008.
Por causa desse desastre financeiro, a taxa
de curto prazo baixara a zero. O Fed teve de intervir para diminuir também as
taxas de longo prazo e, no fim das contas, subsidiou o custo de financiamento
(juros) do governo e do setor privado.
E daí? Haverá mais 7 reuniões do Fed neste
ano. Pelos chutes informados e pelos preços de "o mercado", haveria
no máximo dois cortes de juros básicos.
Tal talho ainda está sub judice, não apenas
por causa do ritmo ainda forte de atividade econômica. Não se sabe o que vai
ser da política econômica dos EUA. Nada se sabe do que será feito dos déficits
e dívida gigantescos: da pior situação fiscal geral em 50 anos e dos piores
déficits afora aqueles dos anos da crise pós-2008 e da epidemia.
Não se sabe se Trump vai piorar tal situação,
provocando ainda aumentos de custos com política comercial protecionista e caça
a imigrantes.
Durante quase o século inteiro, as taxas de
juros foram baixinhas nos EUA. Não será mais assim, por um bom tempo. Não há
mais o crescimento disparado da China ou do preço de commodities. Há o risco
Trump. Para variar, estamos de fora de mais uma revolução tecnológica, que é
uma daquelas profundamente transformadoras.
O que temos discutido? Se é preciso importar
milho e o bagaço da laranja, como no velho pagode.
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