Folha de S. Paulo
A porcentagem de brasileiros que declararam
ter pago propina (a policiais, fiscais, provedores de serviço etc.) aumentou
entre 2011 e 2019
Como mensurar a corrupção em um país? Através de pesquisa de opinião sobre a extensão da corrupção, como muitos alegaram após a divulgação do desempenho pífio do país no Relatório Anual da Transparência Internacional 2025? Elas aferem a centralidade do tema na opinião pública, tema obviamente de grande interesse, mas não a extensão da corrupção real. Aqui a distinção entre o que a literatura chama de pequena (petty) e de grande (grand) corrupção. A pequena corrupção envolve transações singulares, individualizadas, e não institucionalizadas de pequeno valor; a grande, é institucionalizada, envolvendo burocracias públicas, partidos políticos, estatais, sendo recorrente e de elevado valor.
As pesquisas de vitimização são as mais
relevantes sobre a extensão da corrupção. As perguntas relevantes típicas referem-se a se
no último ano o/a respondente pagou propina. Há técnicas para mitigar o
problema de respostas em temas sensíveis: além do anonimato, a pergunta pode
ser feita com referência a tentativas de se cobrar propina em vez de pagamento
efetivo.
E mesmo aqui há viés. As pessoas têm
experiência direta —mas seletiva— apenas da pequena corrupção. Ela vem de sua
experiência com a polícia, o serviço de saúde, fiscais, alfândegas,
prefeituras. Ela não envolve experiência em participar de licitações, emendas
parlamentares, investimentos de fundos de pensão etc. E mesmo esta experiência
deve ser calibrada. A opinião sobre quem não usa diretamente um serviço —por
exemplo, o SUS— é desconsiderada, ou as respostas ponderadas pela
frequência do uso (maior frequência, maior peso).
No caso da grande corrupção —aquela que efetivamente impacta a economia e subverte a
democracia ao garantir vantagens aos incumbentes—, os envolvidos são o alto escalão de empresas
multinacionais e altos funcionários. Eles são os principais agentes envolvidos
e suas respostas são uma das fontes mais importantes. O tamanho das amostras e
pesquisas utilizadas —em geral milhares de observações e agregação de
resultados de pesquisas para a maioria dos países— permite que as respostas
extremas (outliers) sejam controladas. As opiniões de especialistas que
monitoram a corrupção nos
países são outra fonte de dados para os índices internacionais utilizados.
A pequena corrupção no país é similar à média
da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico) e à menor da América
Latina. A porcentagem de brasileiros que declararam ter pago propina (a
policiais, fiscais, provedores de serviço etc.) aumentou de 2011 a 2019. Passou de 4% (12% na Argentina, 21% no Chile e 31% do México)
para uma média de 11%. Quanto aos dados sobre "tentativas de obtenção
de propina", as mais recentes (2021). As percentagens de pessoas que
responderam positivamente à pergunta "alguma vez nos últimos 12 meses
algum funcionário público lhe pediu uma propina" foram de 4.8% (Brasil), 26,2% (México), 19% (Paraguai), 13,9% (Peru) e
7,7% (Argentina).
A grande corrupção vem à tona através da
exposição pública de casos como o da leniência da Odebrecht, nos EUA, que permitiu comparações
sobre a distribuição das propinas entre 11
países na região e a razão entre propina/vantagem obtida. Aqui o Brasil ocupou a segunda razão mais baixa (18%), após a
Argentina. Mas em valores absolutos somos o campeão absoluto.
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