O Globo
Em entrevista recente, Jair Bolsonaro admitiu
que deve ser condenado, disse que teme morrer na cadeia e comparou a Primeira
Turma do Supremo a uma “câmara de gás”. O desespero ajuda a entender as
cambalhotas de sua defesa na Corte.
Antes de se manifestar sobre a denúncia da
Procuradoria-Geral da República, o capitão apresentou uma extensa lista de
pedidos. Queria anular a delação de seu ajudante de ordens e afastar três dos
cinco ministros que devem julgá-lo.
O advogado de Bolsonaro sustentou que Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin deveriam ser declarados impedidos. Na véspera do carnaval, o ministro Luís Roberto Barroso frustrou a manobra por falta de amparo na lei.
Nesta quinta, Bolsonaro apresentou a resposta
preliminar à denúncia da PGR. O texto mostra que sua defesa optou pelo ataque.
Em 129 páginas, dispara contra a Polícia Federal, o Ministério Público e o
tenente-coronel Mauro Cid.
O documento acusa a PF de promover “pescaria
probatória” contra o ex-presidente. Classifica a denúncia da PGR como uma “peça
de ficção”. Chama Cid, que Bolsonaro dizia tratar como um filho, de mentiroso e
“duvidoso delator”.
Num surto de lucidez, o capitão substituiu o
espalhafatoso Frederick Wassef por uma tropa de medalhões da advocacia,
chefiada pelo criminalista Celso Villardi. A troca elevou o nível da conversa,
mas produziu situações curiosas.
Para cortejar o Supremo, a defesa elogiou um
voto “impecável” de Edson Fachin e exaltou uma “inesquecível lição” de Celso de
Mello. Bolsonaro já abriu fogo contra os dois ministros. Ameaçou descumprir
decisões do ex-decano e acusou Fachin de favorecer “o narcotráfico e a
bandidagem”.
Em outro trecho, os advogados descrevem o
capitão como um democrata que respeita a lei e as instituições. Acrescentam que
ele “aceitou sua derrota eleitoral” e “conclamou seus apoiadores a aceitar a
transição para o novo governo de forma pacífica”.
As palavras soam bonito, mas não correspondem
aos fatos. Na vida real, Bolsonaro questionou o resultado das urnas, tentou
deflagrar um golpe de Estado e abandonou o país antes do fim do mandato para
não entregar a faixa ao sucessor.
A lista de Jair
O capitão pediu que o Supremo ouça 13
testemunhas antes de julgá-lo. A lista inclui bolsonaristas de carteirinha como
o senador Ciro Nogueira e o deputado Eduardo Pazuello (“um manda, outro
obedece”).
A defesa também arrolou o ex-vice-presidente
Hamilton Mourão, o general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Júnior. Das
duas, uma: ou Bolsonaro não tem medo do perigo ou tem motivos para acreditar
que será protegido por quem pode incriminá-lo.
Num descuido dos advogados, a lista de
testemunhas cita um certo “senador Gilson Machado”. O sanfoneiro sonha com um
mandato eletivo, mas perdeu as duas eleições que disputou: para o Senado, em
2022, e para a Prefeitura do Recife, em 2024.
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