O Globo
No final de fevereiro, Eduardo
Bolsonaro (PL-SP) foi
para os Estados
Unidos e, mesmo sem ser alvo de nenhuma acusação ou processo no Brasil, disse que
pretende ficar lá e pedir asilo político a Donald Trump.
No carnaval do ano passado, tinha sido a vez de Jair
Bolsonaro passar um final de semana entocado na embaixada da Hungria em Brasília depois
de seu passaporte ser apreendido pela Polícia
Federal (PF). Ele nunca explicou o que foi fazer lá, mas está na cara
que pretendia evitar a prisão ou mesmo tentar fugir.
Agora foi a ex-primeira-dama do Peru Nadine
Heredia quem entrou na embaixada brasileira em Lima pouco
antes de ser condenada por lavagem de dinheiro e pediu asilo no Brasil. Com o
marido, o ex-presidente Ollanta Humala, que se entregou e está preso, Nadine
pegou 15 anos de prisão por receber US$ 3 milhões da Odebrecht durante a
campanha presidencial de 2011.
Tanto ela quanto os Bolsonaros se dizem perseguidos políticos, única condição pela qual a Constituição brasileira e as convenções internacionais admitem dar guarida a um estrangeiro. Elas são claras ao dizer que os condenados ou processados por crime comum não se qualificam para esse tipo de asilo e têm de ser devolvidos ao país de origem.
Na História brasileira, essa regra vale tanto
quanto uma nota de R$ 3. Nadine, como o próprio Lula,
foi condenada por receber dinheiro da Odebrecht em investigações derivadas
da Operação
Lava-Jato. Como ela, Lula também sempre se apresentou como perseguido
político, até suas condenações serem anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Não há dúvida, portanto, sobre a posição do governo, que mandou um jato da FAB
buscá-la em Lima.
No Itamaraty,
a justificativa-padrão é que conceder asilo político é da tradição brasileira e
está previsto na Constituição como princípio nas relações internacionais.
É verdade, e a prova são os casos do
ex-ditador paraguaio Alfredo Stroessner— que veio para o Brasil depois de
deposto durante o governo José Sarney e
aqui ficou até morrer — ou do senador boliviano Roger Molina, opositor de Evo Morales trazido
clandestinamente por um diplomata depois de mais de um ano refugiado na
embaixada de La
Paz.
A diferença é que nenhum desses dois
episódios ocorreu sob Lula. Nas gestões dele, a noção de asilo político obedece
a outra lógica. Em 2007, quando os boxeadores cubanos Erislandy Lara, que tinha
24 anos, e Guillermo Rigondeaux, com 26, abandonaram a delegação de seu país
nos Jogos Pan-Americanos do Rio e pediram asilo no Brasil, a Polícia Federal os
prendeu e os enviou de volta para Fidel Castro num avião venezuelano.
O então ministro da Justiça, Tarso
Genro, disse que eles tinham pedido para voltar. Balela. Um ano depois, os dois
fugiram para Miami e
lá ficaram como refugiados.
Em 2010, também sob Lula 2, o governo negou a
extradição de Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua pela Justiça
italiana por participação em quatro assassinatos na década de 1970, quando
integrava um grupo armado de esquerda.
Battisti estava preso em Brasília, e sua
extradição já havia sido autorizada pelo STF. Mas Lula usou sua prerrogativa de
presidente e o manteve no Brasil — em liberdade. Battisti só voltou para
a Itália em
2019, deportado da Bolívia, para onde
fugiu depois da eleição de Bolsonaro.
Por uma coincidência caprichosa, no mesmo dia
em que o Brasil recebeu Nadine, a mais alta Corte da Espanha se
recusou a extraditar o blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio a pedido do
STF. Eustáquio, que está na Espanha desde 2023, é investigado por crimes de
ódio e participação na trama golpista que redundou no 8 de Janeiro.
A Justiça espanhola considerou o caso
político e manteve o blogueiro por lá. Em represália, Moraes barrou a
extradição de um cidadão da Bulgária procurado
pela Interpol por ter transportado malas com 52 quilos de cocaína em Barcelona.
Ordenou que o búlgaro fique no Brasil de tornozeleira eletrônica.
Por ora, não se sabe se Eduardo Bolsonaro
continuará nos Estados Unidos, mas parece óbvio que Donald Trump o abrigará
como asilado sem problemas. Viktor Orbán,
claro, também receberia Jair de braços abertos na Hungria. Quem poderia
criticar? Tantas idas e vindas sem critério só provam que, às vezes, o conceito
de perseguido político varia conforme o gosto do freguês. E, se é assim, cada
um que fique com o asilado que merece.
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