Folha de S. Paulo
Trazer tema à tona em ano ímpar, quando é
possível aprovar mudanças para próxima eleição, virou rotina
No último dia 7 de abril, o presidente
da Câmara
dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB),
defendeu a volta do debate sobre a mudança do sistema eleitoral, propondo um
modelo misto que combina dois métodos de escolha de deputados: o majoritário e
o proporcional.
Trazer esse tema à tona em ano ímpar —quando
ainda é possível aprovar mudanças com validade para a próxima eleição— virou
rotina no anedotário político nacional.
Até pouco tempo atrás, discutia-se o "distritão", sistema esdrúxulo apoiado por nomes como Eduardo Cunha e Arthur Lira. Agora, Motta resgata o modelo preferido dos tucanos: o misto.
Mas qual "sistema misto"? O modelo
mexicano, mais fácil de entender e popular entre leigos? O alemão, o único
verdadeiramente proporcional, mas que permite flutuação no número de cadeiras
no Parlamento? Ou o escocês, que evita flutuação mas não corrige totalmente as
distorções do voto distrital?
Se você não sabe, provavelmente o nobre
deputado também não.
Chamados pela bibliografia especializada de
"sistemas de membro adicional", esses modelos buscam unir o melhor
dos dois mundos: a proximidade entre eleitos e eleitores proporcionada pelo
voto distrital e a justiça na distribuição de cadeiras entre os partidos,
oferecida pela regra proporcional. Essa combinação também reduz a fragmentação
partidária quando comparada a um sistema exclusivamente proporcional, mas
manteria incentivos para que os partidos se organizem nacionalmente,
apresentando plataformas claras.
O componente proporcional também cumpre um
papel fundamental na representação de eleitores cujas preferências não se
baseiam em questões localistas, mas em valores ou causas programáticas —como
foi, por exemplo, o caso dos partidos verdes na segunda metade do século 20,
que conseguiram eleger representes graças a esse tipo de sistema.
Ainda assim, os sistemas mistos não são
simples. Num país em que muitos dizem que os eleitores não entendem nem o
sistema proporcional atual, será essa a reforma mais urgente?
Além disso, sua adoção exigiria mudança
constitucional —exceto, talvez, no modelo alemão, que respeita a
proporcionalidade final.
Mais importante que o modelo, cabe perguntar:
qual o problema que se quer resolver, a suposta distância entre representantes
e representados? Ora, a política brasileira é justamente criticada pelo seu
excessivo personalismo.
Por outro lado, a reforma aprovada em 2017
—que acabou com coligações proporcionais e instituiu cláusulas de desempenho—
já vem combatendo a fragmentação. Em apenas um ciclo, a queda no número de
partidos foi expressiva. Com o aumento da cláusula para 2,5% em 2026 e 3% em
2030, a tendência é cair ainda mais.
Enquanto isso, temas centrais seguem
ignorados, como a aprovação do novo código eleitoral e as regras de
distribuição dos recursos públicos eleitorais. Por que continuar permitindo que
a cúpula dos partidos controle sozinha o destino dos bilhões do fundo público
eleitoral? Em
2022, foram R$ 4,9 bilhões.
Por que não discutir uma regra mista também
aqui, combinando a vontade das direções partidárias com alguma influência da
sociedade? O modelo alemão, mais uma vez, pode inspirar.
*Professora na Escola de Economia de São
Paulo (FGV-EESP) e pesquisadora do Cepesp. Doutora em ciência política pelo
IESP-UERJ
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