Pela insistência em confrontar a escalada da reciprocidade estabelecida inicialmente em 35%, os produtos chineses foram taxados em 145 %. O Governo da China aventou inclusive proibir a entrada de produtos norte-americanos em seus mercados. É o que pode acontecer também nos EUA com os produtos chineses, cujos gravames tornam competitivos aos similares norte-americanos. São eles acusados de principais responsáveis pelo déficit comercial dos Estados Unidos, situado entre 2 a 3 trilhões de dólares. O PIB dos chineses vem crescendo em torno de 5 % ao ano, em média, enquanto o dos EUA ficam entre 1,5% a 3%. A remuneração do produtor chinês, ao contrário, cai 2,2 % por cento ao ano, e os preços internos aumentam ao redor de 0,2% (Patrick, Igor, FSP 12.04.25). A China tem investidos US$ 760 bilhões em títulos do governo americano.
"Todos querem fazer suas reservas em dólar
norte-americano, vendendo para os Estados Unidos, mas não estão dispostos a
comprar nossos produtos", diz Trump. A maioria dos países que
colocam seus produtos nos Estados Unidos aplicam tarifas de até 97% sobre as importações
norte-americanos. É o caso dos asiáticos, que operam com baixas
remunerações do trabalho e fazem uso de tarifas depreciadas,
tornando os produtos fabricados por eles altamente competitivos nos Estados
Unidos. O mercado norte-americano consumiria cerca de 38% da produção
mundial.
O propósito do tarifaço, anunciado por
Trump, é, segundo ele, proteger a indústria dos Estados Unidos, retomando
os velhos níveis de produção e de produtividade, atraindo de volta as empresas
nacionais que migraram, assim retomando os empregos no setor
manufatureiro que migraram, sobretudo para a China. Desta maneira, espera,
reduzir o déficit comercial norte-americano, que varia entre um a 3
trilhões de dólares anuais. Para essas empresas que migraram para o exterior seduzidas
por incentivos e encargos tarifários e não tarifários mais amenos,
Trump está oferecendo isenções fiscais e até financiamentos para o
seu retorno ao país. Os opositores o acusam de quebrar as regras da Organização
Mundial do Comércio (OMC), estabelecidas para regular o livre comércio. Lembra,
entretanto, que os chineses, mesmo depois de abrigados pela OMC como
"economia de livre mercado”, mantém uma superprodução voltada para a exportação
sustentada por baixos salários, outras desonerações e facilidades financeiras.
Os EUA projetam também corrigir uma dívida
externa que se aproxima dos US$ 38 trilhões (para uma economia que movimenta
anualmente US$ 36 trilhões). Revela Trump que uma auditoria nas ajudas
humanitárias, ambientais, apoios financeiros para organizações não
governamentais e financiamento para instituições internacionais, constatou
que os EUA alimentam no mundo campanhas contra si próprio. Desvios
de finalidades e fraudes com as doações consomem um trilhão de dólares. Estão
suspendendo tudo, e investigando.
Mas, Trump vai mais além. Trata essas
questões como de segurança nacional. Geopolíticamente, constatou-se um cerco
se fechando sobre os Estados Unidos que, com a globalização, rotas de
transporte mundiais sob controle (Seda, Artico, Mar Vermelho, mar Negro, até o Panamá)
e algumas de suas principais empresas estratégicas migrando para fora. Tudo tem
levado os EUA a depender da importação de produtos, insumos e componentes
eletro eletrônicos produzidos no exterior, quando, de acordo com Trump, o
território norte-americano tem tudo isso disponível, mas compra de outros para compensar
relações comerciais assimétricas. "Estamos sendo roubados", afirma.
Trump é acusado de quebrar as regras da OMC,
condicionantes contornadas pelos chineses por meio de artifícios tributários,
baixos salários e amplas desonerações. O certo é que o
"tarifaço" de Trump gerou uma imprevisibilidade na economia mundial
com perspectivas de uma “recessão" e até, segundo o ex-ministro da Fazenda
do Brasil, Maílson da Nóbrega, uma "depressão". Embora a economia de
mercado tenda para uma estabilização, mesmo num patamar como esse, " os efeitos
permanecerão por anos". De acordo com a revista The Economist,
praticam-se no mundo mais de dois milhões de tarifas diferenciadas: "É o
caos completo." Com o "tarifaço", a economia mundial tende a
passar por uma profunda reestruturação.
De maneira oportunista, navegando na vertente
das "retaliações", o Presidente Brasileiro sancionou "sem vetos”
- está entendendo tudo - a Lei de Reciprocidade Tarifária. A medida
tem um caráter genérico perigoso. Não se limita a retaliar iniciativas
hostis somente do governo dos Estados Unidos. Estende seus efeitos para
qualquer país que negocie comercialmente com o Brasil, e atribui ao governante
de plantão, unilateralmente, autonomia para adotar iniciativas semelhantes,
inclusive suspender concessões comerciais e até mesmo deixar de cumprir
obrigações com a chamada “propriedade intelectual".
A iniciativa retaliatória, temperada com uma
autonomia tarifária, longe da orientação acordada na Organização Mundial do Comércio,
teve a ratificação do Congresso Nacional. Deu-se legitimidade ao governo
brasileiro para impor, unilateralmente, tarifas adicionais e barreiras não tarifárias.
A lei estabelece, contudo, que as ações do Governo Brasileiro deverão ser
precedidas sempre de consultas públicas e avaliação técnica, embora, em casos
excepcionais, o governo possa adotar contra medidas provisórias de forma
imediata.
O bom senso recomenda que, antes de qualquer
ação prática, o governo brasileiro abra uma discussão com os EUA sobre a
questão. Embora os chineses liderem as importações do Brasil em mais de
30 por cento, os EUA com seus 19 por cento, somados às tarifações de aliados
(52%), podem criar um problema grande para os brasileiros até por meio de medidas
não tarifárias: direitos humanos, por exemplo. Com a Conferencia Mundial
do Clima batendo às portas, conversa fiada não ajuda em nada. Mesmo porque o
Brasil tende a ser induzido a importar os excedentes chineses que vão ser disponibilizados
pelo "tarifaço" de Trump, e ter de conviver com inflação e juros
estratosféricos, bem como com a quebra empresas brasileiras e a elevação das
taxas de desemprego, como efeito da incapacidade de competir internamente com
as desovas de mercadorias chinesas pelo mundo.
* Jornalista e professor
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