sexta-feira, 27 de junho de 2025

Aumento do número de deputados expõe letargia e faceta danosa da polarização - Felipe Bachtold*

Folha de S. Paulo

Congresso aprova sequência de medidas corporativas sem temer desgastes eleitorais

Virou quase um lugar-comum afirmar que o país está rachado ao meio politicamente, no qual amizades são desfeitas e familiares se desentendem, em um enfrentamento contínuo.

O fenômeno da polarização deveria pressupor que grande parte da população passou a falar como nunca sobre política, ou ao menos de maneira mais intensa do que ocorria nos anos 1990 ou 2000.

aprovação no aumento do número de deputados, nesta quarta-feira (25), mostrou mais uma vez que a premissa tem algumas nuances. O interesse maior no tema não vem significando necessariamente um eleitorado mais vigilante nem uma classe política acuada.

Pautas controversas que não são identificadas nem como "de esquerda" nem "de direita" são articuladas em Brasília quase sem oposição ou reação popular. Passam longe dos grupos de zap ou dos bate-bocas entre petistas e bolsonaristas.

São muitos os exemplos recentes. Em 2021, o Congresso praticamente enterrou a Lei de Improbidade Administrativa, que, ainda que com problemas, vigorava havia três décadas, impondo obstáculos ao mau gestor público.

Posteriormente, o fundão eleitoral dobrou de tamanho para as eleições de 2022, e a dose foi repetida para a campanha municipal de 2024, na qual R$ 4,9 bilhões foram consumidos para financiar candidaturas a prefeito e a vereador.

Os limites para gastos com as emendas parlamentares foram esgarçados a ponto de impactar investimentos corriqueiros da máquina pública.

Todos os temas contaram com ampla adesão parlamentar, da direita à esquerda. Nenhuma das propostas despertou debate acalorado entre expoentes de um lado ou de outro. Não se tornaram hashtag, como ocorre com propostas como a anistia aos réus do 8 de Janeiro ou as chamadas pautas de costumes.

No caso do aumento do número de deputados, o assunto se arrasta há meses com escassa repercussão junto à sociedade —de certa forma insignificante perto do espaço consumido pela discussão sobre bebês reborn.

Motivos não faltavam, já que foi um projeto apresentado com justificativas no mínimo duvidosas, buscando inclusive desacreditar os dados do Censo de 2022, ao afirmar que o cálculo populacional dos estados feito pelo IBGE teria "várias inconsistências".

Além disso, a reviravolta na quantidade de cadeiras na Câmara dilui ainda mais o peso político de estados já sub-representados, como São Paulo, desfigurando a proporcionalidade das bancadas prevista na Constituição.

É uma iniciativa que dificilmente seria tentada na ressaca dos protestos de junho de 2013, quando o Legislativo chegou a temer, de maneira inédita desde a redemocratização, reação diante de medidas impopulares.

A sucessão frenética de assuntos e pautas torna pouco crível que o desgaste dos parlamentares por causa da medida aprovada nesta quarta perdure junto ao eleitorado até a eleição de 2026, daqui a mais de um ano.

Mais do que isso, a ampliação de vagas na Câmara passa a mensagem de que o custo político para a aprovação de medidas corporativas é muito baixo.

E ainda sinaliza que a sequência não vai parar por aí. Projetos de teor igualmente problemático, como as mudanças no Código Eleitoral e a unificação das eleições a cada cinco anos, estão à espreita, na fila para apreciação no Congresso.

*Editor-assistente de Política

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.