Correio Braziliense
Para 56% dos brasileiros, o governo atual
está pior do que os dois primeiros mandatos de Lula. Esse número, em janeiro,
era de 45%
A pesquisa mais recente do instituto
Genial/Quaest, divulgada nesta quarta-feira (4/6), revela que a
desaprovação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atingiu
57%, enquanto a aprovação está em 40%. É o pior resultado da série histórica
desde o início do terceiro mandato de Lula. Realizada entre 29 de maio e 1º de
junho, com 2.004 entrevistados em todo o país, tem margem de erro de dois
pontos percentuais, para mais ou para menos, e nível de confiança de 95%.
O caso do INSS, com suas denúncias de fraudes e desvios de recursos, aparece como catalisador dessa erosão de confiança. Para 82% dos brasileiros, a crise foi sentida. E 31% responsabilizam diretamente o governo federal. As fraudes do INSS atingem em cheio a principal base de Lula, as camadas mais pobres da população. Já o aumento do IOF, que pode ser derrubado pela Câmara, amplia o desgaste do governo junto à classe média, ainda mais porque o aumento foi anunciado na última semana de prazo para declarar o Imposto de Renda.
A desaprovação é especialmente alta na Região
Sudeste, onde 64% dos entrevistados desaprovam a gestão petista, enquanto
apenas 32% a aprovam. Além disso, pela primeira vez, a desaprovação supera
numericamente a aprovação entre os católicos: 53% desaprovam o governo, contra
49% que o aprovam. Cerca de 45% dos entrevistados consideram que o governo Lula
está pior do que o esperado, e 61% avaliam que o Brasil está na direção errada.
De todas as análises que li sobre os
resultados da pesquisa, a mais instigante é a do sociólogo e cientista político
carioca Paulo Baía, professor aposentado da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), que recorre à antropologia e à psicologia de massas para
analisar a situação do governo, num artigo intitulado O espelho estilhaçado: a
rejeição como sintoma político, psicológico e social no terceiro mandato de
Lula, no site Agenda do Poder.
"A política, como espelho das emoções
coletivas, vive de afetos. E um deles, talvez o mais avassalador dos nossos
tempos, é a rejeição. Não se trata apenas de um juízo racional sobre um governo
ou um presidente. A rejeição, como fenômeno psicológico e social, é um campo de
forças invisível, mas devastador, que atravessa o corpo coletivo da sociedade
como uma febre que não se explica somente pela temperatura externa. Ela
condensa frustrações acumuladas, desilusões difusas, sentimentos de traição, desencanto
e medo", enuncia Baía.
Fadiga emocional
"A rejeição não apenas se mede nas
porcentagens de uma pesquisa, mas também nos silêncios, nas ausências, nas
palavras não ditas e nas indignações gritadas", destaca. Para o cientista
político, esse sentimento, com tudo o que ele carrega em sua complexidade
afetiva, começa a definir o clima político do Brasil neste 2025. "O
governo parece afundar num pântano de ceticismo que vai além da política
institucional. O que os números revelam, com o rigor de quem coleta dados e a
frieza de quem os interpreta, é um país emocionalmente fatigado, dividido e
cada vez mais desconectado do pacto simbólico que elegeu o líder petista pela
terceira vez", conclui.
Baía recorre à alegoria do "espelho
estilhaçado", em que os fragmentos de aprovação que ainda resistem são
ofuscados por múltiplas faces da rejeição, para explicar como o sentimento que
se espalha pelo corpo social é o de que algo se perdeu no meio do caminho,
"algo entre a esperança e a realidade, entre a promessa e a entrega, entre
a memória e o presente". Para 56% dos brasileiros, o governo atual está
pior do que os dois primeiros mandatos de Lula. Esse número, em janeiro, era de
45%.
Não se trata apenas de uma avaliação
histórica negativa, mas da sensação coletiva de decepção. "É como se o
mito fundacional do lulismo tivesse sido confrontado com uma realidade que não
suporta mais nostalgia", pondera Baía. Essa desconexão se aprofunda nas
bases sociais onde antes havia uma fidelidade quase inabalável. No Nordeste,
região que simbolicamente foi a pátria afetiva de Lula, a aprovação caiu para
54%, enquanto a desaprovação subiu para 44%.
Em outras regiões, a rejeição se impõe com
ainda mais força: no Sudeste, apenas 36% aprovam o governo, enquanto 61% o
desaprovam; no Sul, a aprovação é de 33% e a desaprovação de 65%; no Norte e
Centro-Oeste, os índices são de 45% e 52%, respectivamente.
As mulheres, que foram decisivas para a
eleição de Lula, agora desaprovam o governo em maior número (55%) do que o
aprovam (42%). Entre os homens, 59% de desaprovação, contra apenas 39% de
aprovação. A juventude também está distante: entre os que têm entre 16 e 34
anos, apenas 33% aprovam o governo, enquanto 64% o desaprovam. A desaprovação é
maioria também entre os adultos de 35 a 59 anos, 54%, e só entre os idosos com
mais de 60 anos há algum respiro: 50% aprovam, contra 46% que desaprovam.
Os católicos estão divididos ao meio: 49%
aprovam e 49% desaprovam. Já entre os evangélicos, a rejeição é um campo
consolidado: 67% desaprovam, enquanto apenas 29% ainda sustentam algum apoio.
"A fé, neste caso, parece ter se tornado menos uma promessa de salvação
política e mais um terreno de rejeição moral", destaca o sociólogo. Pela
primeira vez na série histórica da Quaest, 44% dos brasileiros consideram o
governo Lula pior que o de Bolsonaro, enquanto 39% avaliam o governo Lula como
melhor.
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