domingo, 1 de junho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Revisão completa de renúncias fiscais se tornou mais urgente

O Globo

Estimativa da Receita eleva em 47%, para R$ 800 bilhões, o total de isenções de impostos federais em 2025

Têm sido recorrentes, desde o início do atual governo, as tentativas do Ministério da Fazenda de cobrir rombos fiscais com aumento de impostos, num esforço por ampliar a arrecadação, em vez de promover um programa de controle de gastos confiável. A alta no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é apenas a última medida num rol extenso que inclui taxas sobre importações via internet, gasolina e etanol, diesel e biodiesel, exportações de petróleo, apostas esportivas, armas e munições, painéis solares, veículos elétricos e híbridos, fundos exclusivos e offshore, além de medidas para aumentar a base de cobrança de impostos sobre o lucro das empresas. A lista é longa, não para de crescer — mas, curiosamente, não inclui a oportunidade mais óbvia diante do governo: uma revisão exaustiva das renúncias e isenções fiscais que beneficiam toda sorte de setor da economia.

Conhecidas como “gastos tributários”, tais isenções apresentam duas características nefastas. Primeiro, não param de crescer. Segundo, não são submetidas a avaliações periódicas para verificar se funcionam. Basicamente, os grupos que obtêm benefícios usufruem uma benesse vitalícia — daí o apelido “bolsa empresário”.

Apenas as renúncias fiscais do governo federal somam 4,8% do PIB. Levando em conta estados e municípios, o total chega a 7,2%, segundo estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). A Constituição determina que não passem de 2% do PIB, mas o último ano em que isso aconteceu foi 2005. A situação pode ser ainda mais dramática, de acordo com números da própria Receita Federal noticiados pelo jornal Valor Econômico. Com base numa documentação recém-criada obrigando empresas a declarar quanto usufruem de benefícios fiscais, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estimou que apenas as renúncias federais alcancem R$ 800 bilhões em 2025, em vez dos R$ 544,5 bilhões previstos no Orçamento. “Se a informação prestada pelas empresas for fidedigna, o custo dessa política é muito maior”, diz o economista Manoel Pires, do Ibre/FGV.

Por esse cálculo, só as renúncias da União passam de 7% do PIB. Só para a Zona Franca de Manaus, as isenções somam R$ 54,8 bilhões, em vez dos R$ 29,9 bilhões previstos no Orçamento. No caso do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), R$ 18 bilhões, em vez de R$ 5,7 bilhões; do Regime Especial de Incentivos ao Desenvolvimento de Infraestrutura (Reidi), R$ 5,8 bilhões, e não R$ 1,1 bilhão. Há isenções para profissionais liberais que recebem por meio do Simples, indústria automotiva, farmacêutica e dezenas de outros setores.

Todo país concede benefícios tributários a setores considerados estratégicos. Mas é preciso avaliá-los periodicamente para cortar o que é desperdício ou injustiça. Em 2019, foi instaurado o Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas com esse objetivo. Desde então, ele realizou diversas avaliações, mas nenhuma resultou em revisão das renúncias.

“Não se pode achar que a redução de gastos tributários será a chave para o equilíbrio fiscal”, afirma o economista Marcos Mendes. O desequilíbrio, diz ele, vem sobretudo do crescimento já contratado nos gastos primários. Mas é evidente que o país só teria a ganhar deixando de subsidiar atividades que não dão retorno e derrubam a produtividade. E não apenas em arrecadação.


Operação em Mato Grosso revela desafio de coibir ‘cyberbullying’

O Globo

Enfrentar crimes em que vítimas e algozes são menores exige ação de autoridades e plataformas digitais

O êxito da operação da Polícia Civil de Mato Grosso na desarticulação de um grupo suspeito de praticar violência contra crianças e adolescentes pelas redes sociais expõe a dimensão do desafio diante de autoridades, plataformas digitais e famílias para coibir o crime de cyberbullying.

A Operação Mão de Ferro 2 cumpriu mandados de busca e apreensão em 12 estados, fez três prisões preventivas e apreendeu seis menores de idades, um deles de 15 anos, acusado de comandar ações criminosas nas redes sociais, entre elas indução à automutilação e ao suicídio. Havia produção, armazenamento e distribuição de pornografia infantil, apologia ao nazismo, além de invasão de sistemas digitais. O mais velho dos adolescentes tem 17 anos de idade.

Aquele que é considerado líder do grupo foi detido em Rondonópolis (MT) e já era conhecido da polícia. De classe média, é estudante de escola estadual. Uma adolescente de 16 anos, moradora de Sinop (MT), era usada para instruir vítimas sobre técnicas de automutilação sem deixar marcas ou causando menos dor. Todos são acusados de extorquir as vítimas depois de acessar seus dados pessoais. Ganhavam a confiança de outros adolescentes para receber fotos com nudez, depois usadas para forçá-los, mediante chantagem, a praticar atos degradantes. A uma mãe que ameaçou denunciá-los, o jovem criminoso disse saber a idade dela e onde a família morava.

Há poucas semanas, morreu uma menina de 8 anos no Distrito Federal por ter aspirado desodorante num “desafio” repugnante, disseminado pelo TikTok, a quem inalasse a maior quantidade do produto químico no menor tempo. Outros “desafios” do mesmo tipo circulam nas redes sem que as plataformas digitais assumam suas responsabilidades para coibi-los.

Em janeiro, entrou em vigor a lei que proíbe celulares e aparelhos eletrônicos portáteis nas escolas, a não ser para uso pedagógico. Mas as ameaças que chegam às telas de crianças e adolescentes circulam no meio digital 24 horas por dia, não só no horário escolar. No início do ano passado, o governo sancionou lei que incluiu no Código Penal os crimes de bullying e cyberbullying contra menores. Se cometidos pela internet, a pena pode chegar a quatro anos de prisão.

Como mostra o caso de Mato Grosso, esse tipo de crime envolve crianças e adolescentes como vítimas, mas também como algozes. É essencial que as plataformas digitais sejam corresponsabilizadas pelo conteúdo que fazem circular em suas redes. Só assim tomarão as medidas necessárias para desestimular a criminalidade juvenil que cresce de forma dissimulada atrás das telas.

Ataques populistas ressaltam importância da ordem liberal

Folha de S. Paulo

Trump investe contra o poder do Congresso na definição das tarifas e pôe-se a restringir vistos com ânimo persecutório

A importância da ordem liberal para a estabilidade política e o avanço econômico passou mal percebida por várias décadas, até que o tufão nacional-populista dos últimos anos a escancarou por contraste.

O respeito às regras do jogo institucional e a fragmentação do poder de Estado entre atores que se complementam e se limitam configuram dois pilares daquele ordenamento ora sob ataque de políticos como o presidente dos Estados UnidosDonald Trump.

No espírito liberal que inspirou a evolução de quase 250 anos de história nacional independente, um tribunal dos EUA especializado em comércio externo julgou na quarta-feira (28) ilegais os poderes invocados por Trump para tributar a seu bel-prazer as importações de outros países.

O mandatário republicano vociferou e acusou os juízes de parcialidade, mas só conseguiu evitar o vexame de ver derrubada a sua plataforma regressista de fechar a economia americana recorrendo ao mesmo Judiciário.

Já na definição de que cidadãos estrangeiros podem entrar e permanecer nos Estados Unidos, o Executivo federal tem, por desenho legal, maior arbítrio. Não por acaso, nesse terreno Trump pratica alguns de seus maiores desatinos, ao perseguir estudantes de certas nacionalidades e penalizar em especial os que tentam ingressar na Universidade Harvard.

Na mesma quarta, o Departamento de Estado anunciou que passará a negar vistos de entrada no país a autoridades estrangeiras que tiverem contribuído para "censurar" cidadãos ou empresas em solo norte-americano. Pareceu à primeira vista sobretudo uma medida para auxiliar as grandes plataformas de internet dos EUA, que sofrem pressões regulatórias em outras nações.

Há quem também tenha entendido tratar-se de retaliação aos ministros do Supremo Tribunal Federal brasileiro, que têm tomado decisões, como a de suspender perfis em redes sociais, atingindo direta ou indiretamente as big techs. Será difícil esclarecer a dúvida, dada a natureza opaca do sistema de decisão sobre vistos.

De todo modo, se foi apenas isso que o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) conseguiu com suas perambulações no trumpismo, ele se mostrou mais eficiente como preparador de hambúrgueres do que como lobista nos Estados Unidos.

Esse desfecho prosaico torna ainda menos compreensível a abertura de inquérito, a pedido da Procuradoria-Geral da República, para investigar sabotagens antidemocráticas que o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teria praticado em território americano. É dar importância demais a um político infantiloide.

Na ordem liberal, cada um deveria ater-se a seu papel. Da mesma forma que o presidente dos EUA não deveria pôr-se a definir sozinho tarifas comerciais —um poder que lá pertence ao Congresso—, não cabe ao Judiciário brasileiro fazer política externa. Essa é uma tarefa precípua do Palácio do Planalto e do Itamaraty.

Putin redobra aposta militar para negociar com a Ucrânia

Folha de S. Paulo

Rússia eleva ataques e ameaça ofensiva visando posição favorável em conversas de paz, mas rumo da guerra depende dos EUA

Já contando três anos e três meses, a Guerra da Ucrânia chega a mais um incerto e perigoso ponto de inflexão com as truncadas tentativas de negociação entre Moscou e Kiev.

Por óbvio, o simples fato de haver conversas já é um avanço, dado que elas haviam sido abandonadas oficialmente após março de 2022, pouco depois da invasão promovida por Vladimir Putin contra seu vizinho.

É forçoso reconhecer que Donald Trump, a despeito de todo o voluntarismo e falta de substância, foi o artífice do momento atual ao retirar o apoio incondicional dado pelos EUA aos ucranianos e aproximar-se do Kremlin.

A defesa de Kiev é moralmente correta, mas no grande jogo da geopolítica nem sempre o que é certo funciona. A guerra havia chegado a um ponto de atrito insuperável: nem Putin nem o ucraniano Volodimir Zelenski tinham condições de impor uma derrota decisiva ao adversário.

Assim, que as partes conversem é alvissareiro. A má notícia é que a falta de um plano coerente por parte de Trump jogou a condução da negociação no colo de Putin, que a protela ou avança a seu bel-prazer. Com isso, em vez de uma paz justa, caminha-se para justificação do uso da força.

Os dois beligerantes entendem isso. A Ucrânia passou duas semanas na mais intensa campanha de guerra aérea com drones contra alvos russos. Recebeu da sempre recalcitrante Alemanha a promessa da construção conjunta de mísseis de longo alcance.

Só que, se não conseguiu conquistar Kiev, Putin tem a mão mais forte. Assim, o russo redobrou a aposta na violência, executando no fim de semana passado os maiores bombardeios da guerra, com efeitos devastadores.

Mais importante, concentrou cerca de 50 mil soldados junto à fronteira nordeste da Ucrânia e já começou ataques exploratórios na região de Sumi, telegrafando uma grande ofensiva no verão do Hemisfério Norte, que começa agora em junho.

Pego em sua ingenuidade, Trump reagiu. Chamou Putin de louco e disse suspeitar que o russo o estava enganando. Ao dar uma semana para a Rússia provar boa vontade, deu a senha ao Kremlin, que sugeriu uma nova rodada de conversas com os ucranianos e transferiu o ônus da intransigência aos ucranianos.

Se isso seria ruim para uma Rússia atrás de normalização econômica caso Trump apele para novas sanções, pode ser fatal para Kiev, que depende da ajuda militar dos Estados Unidos para sobreviver.

Do limão, uma limonada

O Estado de S. Paulo

Ao reconhecer o desequilíbrio estrutural da peça orçamentária, o presidente da Câmara dá passo essencial para corrigir a rota e discutir reformas que tragam racionalidade ao gasto público

Se há um aspecto positivo a ser destacado na crise do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é a admissão da inviabilidade do Orçamento Geral da União pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Após se reunir com os líderes da Casa na quinta-feira passada, o deputado afirmou haver uma consciência no Legislativo de que o Orçamento “não sobreviverá da forma que está”.

Na noite anterior, ele expressou ao governo a insatisfação da Casa com a publicação do decreto presidencial. Após ouvir as explicações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobre as razões que motivaram a edição do ato, ele se comprometeu a não pautar, de imediato, projetos para sustá-lo. Ainda na reunião, ficou acertado que todos, inclusive a Câmara, vão trabalhar na construção de alternativas que tragam mais racionalidade ao gasto público.

“Estamos defendendo que venham medidas mais estruturantes, que o Brasil possa enfrentar aquilo que é preciso”, afirmou Motta, citando a revisão de isenções fiscais, a desvinculação das receitas e a necessidade de uma reforma administrativa, temas que até então eram “proibitivos” na Câmara, segundo ele. “Só isso irá ajudar a melhorar o ambiente econômico para que o Brasil possa ter cada vez mais a condição de explorar o seu potencial e ser o País que cresce e se desenvolve com justiça social, geração de empregos e renda”, acrescentou.

A admissão da existência de um desequilíbrio estrutural entre gastos e despesas pelo presidente da Câmara é um passo necessário rumo à correção dessa rota. Como o próprio governo já admitiu ao enviar ao Legislativo o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) deste ano, faltará dinheiro para manter a máquina pública já em 2027. A continuar no ritmo atual, os gastos obrigatórios devem tomar o espaço das despesas discricionárias, nas quais se incluem, além de emendas parlamentares e investimentos, dispêndios tão diversos como bolsas para estudantes, pesquisadores e atletas, o Farmácia Popular e faturas de energia de edifícios públicos, entre outros.

Por óbvio, rever a dinâmica do gasto público não é fácil. As tentativas da equipe econômica de acabar com benefícios fiscais, como o fim da desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia, foram mal recebidas pela maioria dos parlamentares, enquanto as poucas iniciativas para dar mais racionalidade a despesas com trajetória explosiva, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), foram dinamitadas por deputados do próprio PT, partido do presidente Lula da Silva.

Seria ingenuidade esperar que algo dessa natureza possa avançar no Legislativo a menos de um ano e meio das eleições, mas o calendário eleitoral não é um impeditivo para a construção de uma agenda para o futuro do País. Prova disso foi a promulgação das reformas da Previdência, em 2019, e tributária, em 2023. A primeira foi aprovada na administração Jair Bolsonaro, mas apresentada na gestão Michel Temer. A segunda foi fruto de propostas de emenda à Constituição da Câmara e do Senado protocoladas em 2019, mas só foi apreciada no governo Lula da Silva após ser endossada pela equipe econômica.

Projetos de cunho estrutural têm um tempo próprio de amadurecimento no Congresso. O fato de uma proposta não ser votada não necessariamente significa a ausência de discussões profícuas sobre ela, mas sim a falta de consenso e, consequentemente, de votos suficientes para aprová-la naquele momento. Passaram-se anos até que fosse possível aprovar, por exemplo, o Marco do Saneamento e a autonomia do Banco Central.

Motta frisou que o País não aceita mais aumento de impostos. Isso é indiscutível, mas é preciso ir além. Na semana passada, ele criou formalmente um grupo de trabalho para debater a reforma administrativa e sinalizou a possibilidade de criar, também, um grupo de trabalho para rever as isenções fiscais. Em ambos os casos, este jornal espera que haja ambição. Essas discussões provavelmente não resultarão em corte imediato de gastos, mas é evidente que uma reforma, para ser digna do nome, precisa almejar um Estado mais eficiente no longo prazo – ou seja, um Estado que respeita o dinheiro do contribuinte.

A crise crônica das universidades federais

O Estado de S. Paulo

MEC dá algum alívio a institutos e universidades federais, mas cenário reforça a necessidade de algo maior: criar um modelo que garanta sustentabilidade orçamentária às instituições

O ministro da Educação, Camilo Santana, anunciou um cardápio variado para tentar aplacar a asfixia financeira de institutos e universidades federais: a recomposição de R$ 400 milhões no Orçamento deste ano, a liberação de outros R$ 300 milhões referentes a repasses de custeio, que estavam retidos por decreto, e a promessa de voltar ao ritmo de repasse mensal às instituições. Tudo somado, trata-se de algum alívio, sobretudo para aquelas financeiramente à míngua, mas nem de longe resolve o problema mais grave, a partir do qual se produzem muitos outros: a sustentabilidade. Algo que garanta o elementar de qualquer gestão – a previsibilidade, o planejamento, a eficiência e a qualidade, sem o que as universidades públicas não produzirão ensino e pesquisa qualificados, como se espera delas.

O que é imprescindível, portanto, ainda segue apenas como compromisso para o futuro, reafirmado pelo ministro aos reitores e entidades que assistiram ao seu anúncio: a construção de um projeto que garanta sustentabilidade ao ensino superior, da mesma forma que a educação básica tem com o Fundeb. Enquanto esse futuro não chega, será imprescindível voltar ao passado: hoje as universidades e institutos federais pagam, em grande medida, o preço da política de expansão desenfreada promovida pelos governos lulopetistas, empenhados em espalhar câmpus sem condições materiais e financeiras para seu funcionamento e manutenção.

No caso das federais, muitos dos novos câmpus nasceram da transformação de unidades de ensino em “novas universidades”. Uma faculdade de Medicina no interior, por exemplo, foi transformada em universidade, obrigando a criação de mais cursos, burocracia e infraestrutura, gerando mais despesas de custeio. Com isso aprofundou-se um déficit acumulado de muitos anos, que se traduz em dificuldades perversas, sobretudo no chamado orçamento discricionário, que paga o custeio das instituições, incluindo despesas rotineiras como água, luz, internet, limpeza, vigilância e manutenção predial.

Na ânsia de anunciar cifras e obras, os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff deixaram em segundo plano questões essenciais como o modelo de ensino e os papéis que universidades federais e institutos federais de educação, ciência e tecnologia têm para a formação de estudantes, a pesquisa e a qualificação profissional. Também menosprezaram a necessidade, já tardia, de atualizar currículos e propósitos e aperfeiçoar a trajetória de jovens que saem de um ensino médio deficiente para uma formação superior em grande parte obsoleta. E assim o Brasil seguiu com três cacoetes históricos: a crença num modelo único para a educação superior, o devaneio de que a universidade é para todos e o preconceito contra a educação profissionalizante.

Por óbvio em razão das umbilicais ligações do PT com o sindicalismo, seus governos também jamais enfrentaram o corporativismo de professores e servidores públicos em geral, que costumam sentir urticária com qualquer tentativa de debate sobre produtividade e eficiência. Os dados mais recentes do Censo da Educação Superior, de 2023, mostram, por exemplo, que cada professor das universidades e institutos federais forma, em média, apenas 1,26 aluno por ano. O leitor não leu errado: naquele ano, cerca de 147 mil estudantes concluíram cursos de graduação, com 117 mil docentes em atividade. Embora muitos desses professores também deem aulas na pós-graduação, a grande maioria ainda dedica boa parte de sua carga horária à graduação, onde há números preocupantes de evasão e baixa taxa de formatura. A relação entre o custo das instituições e o número de alunos também é desabonadora.

O fato é que, sob qualquer ótica, a eficiência nessa área é baixíssima, problema que se torna ainda mais agudo porque desde 2014 o Estado brasileiro vive em crise fiscal permanente – o que amplia a pressão para cortes no Orçamento, realimenta a penúria já existente e exige ainda mais disciplina fiscal e capacidade de gestão e manejo dos recursos, atributos em falta no nível federal. Um ciclo de desserviço contra o ensino superior público. Se há instituições federais “respirando por aparelhos”, como disse uma delas, ainda estamos longe de ver um tratamento definitivo para eliminar a insegurança orçamentária e tirá-las de fato da UTI.

Mais gás para o rombo fiscal

O Estado de S. Paulo

Lula insiste em triplicar distribuição de botijões, mesmo sem ter de onde tirar recursos

Sem saber de onde tirar dinheiro para bancar a ampliação da distribuição gratuita de botijões de gás de cozinha (GLP), uma das apostas de Lula da Silva para angariar simpatia – e o voto – na campanha presidencial de 2026, técnicos do governo buscam restringir a cerca de 16 milhões de famílias o público a ser atendido, como noticiou o Estadão. Já equivaleria ao triplo das 5,5 milhões do catálogo atual do benefício. Mas Lula continua a anunciar que o programa chegará, ainda neste ano, a 22 milhões de famílias, incluídos aí todos os beneficiários do Bolsa Família.

O descrédito fiscal do governo vem tão somente de suas ações. Ao mesmo tempo que apela a gambiarras tributárias, como a proposta de aumento do IOF, para tentar conter o déficit público no limite permitido pelo arcabouço, a gestão lulopetista abraça o propósito de multiplicar a distribuição de auxílios. Note-se que o esforço atual da equipe econômica não é para entregar um resultado positivo em 2025, mas para confinar o prejuízo a 0,25% do PIB, ou R$ 31 bilhões. No ano passado, o déficit nas contas públicas foi de R$ 43 bilhões.

Mas isso não parece alarmar Lula da Silva, mais preocupado em posar de distribuidor de benesses assistenciais que criam a imagem ilusória de combate à desigualdade social. Na verdade, agigantados por Lula, esses programas tendem a criar uma dependência exagerada da população ao governo sem atacar as causas da desigualdade, fincadas em questões há muito conhecidas, como os investimentos insuficientes em saúde, educação, qualificação e, claro, a má gestão de recursos públicos.

Para promover de forma competente a igualdade social seria preciso uma visão de longo prazo que Lula não quer ter. Sua mira está focada nos efeitos imediatos de um Estado provedor, embora não haja recursos públicos que banquem seu instinto gastador. Em evento numa cidade do Mato Grosso no dia 24 passado, por exemplo, anunciou que todos os beneficiários inscritos no Cadastro Único não precisariam mais precisar pagar pelo gás.

Em março, 40,8 milhões de famílias estavam registradas no CadÚnico, a porta de entrada da população de baixa renda aos programas sociais do governo. Pelos dados oficiais, são 93,7 milhões de brasileiros beneficiados por algum tipo de auxílio, ou seja, em torno de 45% de toda a população, estimada pelo IBGE em 212 milhões.

Não há definição sobre a fonte dos recursos para o programa “Gás para Todos”, que o governo pretende lançar até setembro. O Ministério da Fazenda defende a inclusão do programa no Orçamento, enquanto o Ministério de Minas e Energia defende o uso do Fundo Social do Pré-Sal. Lula tem pressa em publicar a medida provisória que instituirá as novas regras. Quer que seja um dos cartões de visita na série de viagens que fará pelo País para, segundo afirmou, combater a desinformação sobre seu governo – desculpa esfarrapada para fazer campanha eleitoral fora de hora.

País deve reagir ao avanço do cigarro

Correio Braziliense

Há um inimigo nos pulmões dos brasileiros, especialmente dos jovens. Urge resgatá-los do vício devastador e fazer o possível para mantê-los afastados dessa ameaça

Na última quinta-feira, uma adolescente de 15 anos morreu no Distrito Federal em consequência de um perigo cada vez mais ameaçador: os cigarros eletrônicos. A jovem estava internada em estado grave havia praticamente um mês, com severas complicações pulmonares e uma tosse persistente que a acometia desde o início do ano. A dependência deixou marcas devastadoras na vítima. A estudante veio a óbito com o pulmão esquerdo em colapso, após um quadro inflamatório avançado.

O episódio na capital da República ocorreu na véspera do Dia Mundial sem Tabaco, lembrado ontem. E o Brasil enfrenta um momento muito preocupante em relação ao consumo do cigarro. Dados do Ministério da Saúde alertam para um aumento de 25% no número de fumantes entre 2023 e 2024. É o pior registro feito pelas autoridades sanitárias em quase duas décadas.

"Pela primeira vez desde 2007, nós temos um ponto que está ascendente na curva. Isso nunca foi visto. Esse é um dado muito, muito preocupante. Então, é urgente que a gente volte a intervir mais duramente sobre as ações que a gente já sabe que dão certo, e especialmente se comunicando com os jovens", alertou a diretora de Análise de Doenças Não Transmissíveis do ministério, Letícia de Oliveira Cardoso, em entrevista à Agência Brasil.

O aumento expressivo de fumantes indica um claro retrocesso na política antitabagismo. A cada dia, 477 brasileiros morrem por consequência do tabagismo. Por ano, seria possível evitar 174 mil mortes provocadas pelo consumo de cigarro. As doenças ligadas ao fumo custam R$ 153 bilhões por ano ao país, entre atendimento a pacientes e outras consequências. Em contraponto, a arrecadação de impostos federais sobre os cigarros, uma forma de conter a escalada tabagista, totalizou R$ 8 bilhões em 2022 - apenas 5,2% dos custos provocados pelo cigarro. 

A situação é alarmante em relação aos dispositivos eletrônicos. Apesar da venda proibida no Brasil, estão disseminados. Pelo menos 4 milhões de brasileiros são consumidores desses equipamentos, que concentram toda sorte de substâncias, muito mais perigosas do que as conhecidas nos cigarros convencionais.

Na guerra contra o tabagismo, seja o tradicional, seja a versão eletrônica, é preciso uma ação ampla e firme do poder público, somada à adesão da sociedade. Em abril do ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) endureceu as medidas restritivas ao cigarro eletrônico. A Organização Mundial da Saúde, por sua vez, em documento divulgado na sexta-feira, emitiu alerta para a necessidade de proibir sabores artificiais em produtos de tabaco e nicotina, presentes em cigarros, sachês de nicotina, narguilés e cigarros eletrônicos.

Há um inimigo nos pulmões dos brasileiros, especialmente dos jovens. Urge resgatá-los do vício devastador e fazer o possível para mantê-los afastados dessa ameaça.

A população precisa se vacinar

O Povo (CE)

Iniciativas diversas têm ocorrido na Saúde da Capital e do Estado a fim de convencer a população a tomar os imunizantes que protegem contra as doenças. É preocupante saber que o percentual de pouco mais de 10% da população total se vacinou contra a influenza na capital cearense entre 1º e 25 de maio, por exemplo. Neste período, com chuvas na região, aumentam-se os casos virais de gripes e resfriados, que podem ser agravados para quadros como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) se a proteção não for realizada.

Neste fim de semana, a Prefeitura de Fortaleza promove uma força-tarefa a fim de aumentar a cobertura vacinal, com a finalidade de ampliar o acesso ao atendimento e reduzir a circulação de vírus respiratórios. Há vacinação em postos de saúde, que abrem excepcionalmente neste fim de semana, e em três shoppings da Capital. Também houve vacinação no sistema "drive-thru", sem que a pessoa precise sair do veículo, durante a semana. Além da vacina contra a influenza, estão sendo ofertados outros imunizantes do calendário de rotina.

A falta de informação que leva à não imunização é um problema que atinge outros locais do Estado. Em artigo publicado no O POVO (23/5/2025), intitulado "Sem vacina para a epidemia da desinformação no Cariri", o jornalista Luciano Cesário chama atenção para a baixa cobertura da vacinação na Região do Cariri. De acordo com ele, no Crato, até a primeira quinzena de maio, menos de 30% do público-alvo da vacina contra a gripe recebeu a imunização, o que seria um reflexo de um desinteresse e descrédito crescentes da população em relação à eficácia dos imunizantes.

Ainda no artigo, Luciano Cesário comenta que, conforme a coordenadora de Vigilância em Saúde do Crato, Evanúsia Lima, "as mentiras espalhadas nas redes sociais são o ponto nevrálgico da baixa procura" e, em entrevista à rádio O POVO CBN Cariri, ela manifestou preocupação com a epidemia da desinformação, que acomete principalmente os mais pobres, ou seja, aqueles que mais precisam das vacinas pela vulnerabilidade a que estão expostos.

É preciso que esse chamamento à população para que se vacine contra a gripe seja feito de modo contínuo. Essa descentralização dos postos móveis de atendimento à vacinação tem sido feita como reflexo do fato de as pessoas não estarem indo às unidades de saúde buscar imunização. A resistência à vacina tem sido um problema agravado desde a pandemia de covid-19, pelos fantasmas que o "discurso antivacina e anticiência" criou.

É sabido que, quando uma pessoa na sociedade é vacinada, atinge-se um efeito coletivo ao minimizar a circulação do agente infeccioso. As evidências científicas mostram a eficácia e a segurança dos imunizantes e um dos grandes desafios da Saúde é combater esse movimento. Vacinar-se não deve ser tão somente uma decisão baseada em interesses pessoais, mas deve ser entendida, sobretudo, como uma responsabilidade social de uma questão maior - a saúde pública. 

 

 

 

 

 

 

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