Supremo tem dever de impor a lei às redes sociais
O Globo
Artigo do Marco Civil que as exime de
qualquer responsabilidade é flagrantemente inconstitucional
É notório que as plataformas digitais têm dado abrigo a toda sorte de aberração. Têm sido frequentes casos de crianças e adolescentes incentivados a participar de “desafios” letais; estímulos à automutilação e suicídio; articulação para violência em escolas ou contra moradores de rua; apologia a maus-tratos de animais; leniência com discursos de ódio e preconceito, celebração de ataques à democracia e às instituições. Não é possível ficar apenas assistindo a esse descalabro. Nesta semana, mais uma vez o Supremo Tribunal Federal (STF) terá oportunidade de pôr alguma ordem nessa terra sem lei. Na próxima quarta-feira, a Corte deverá retomar o julgamento de processos que discutem a responsabilidade civil das plataformas digitais.
Está em jogo a constitucionalidade da regra
que estabelece quando elas devem ser consideradas responsáveis por conteúdos
publicados por seus usuários. O artigo 19 do Marco Civil da Internet afirma que
são passíveis de punição somente se receberem decisão judicial determinando a
remoção do conteúdo e se negarem a obedecer. Mais de uma década depois da
criação da lei, o critério se revelou inadequado ante a realidade. O
salvo-conduto dado pelo artigo 19 é flagrantemente inconstitucional, uma vez
que fere direito fundamental dos brasileiros, incapazes de obter reparação na
Justiça — quando sai a decisão, o estrago já está consumado. Na prática, ele
atribui o ônus à vítima. É o alvo de crimes perpetrados nas redes que tem de
buscar ajuda legal, enquanto as plataformas, coniventes, continuam faturando
com audiência e engajamento.
No lugar do artigo 19, deve ser estabelecido
um sistema de retirada do conteúdo do ar mediante notificação das partes
afetadas, conhecido como “notice and take down”. Era o que previa o texto
original do Marco Civil, lamentavelmente modificado no Congresso. Por meio
desse sistema, qualquer um notifica conteúdo ilícito às plataformas e, caso
elas comprovem a denúncia e nada façam, são responsabilizadas judicialmente
pela omissão. A União Europeia adotou norma semelhante. A maior parte das
plataformas tem se mostrado eficiente na retirada de conteúdo protegido por
direito autoral, privacidade e outras violações. Não há, portanto, dificuldade
técnica.
Não faz sentido o argumento segundo o qual as
plataformas, temendo o custo de processos na Justiça, passariam a remover
conteúdo preventivamente, cerceando a liberdade de expressão. Um espaço para
livre expressão não pode ser confundido com um espaço sem lei. “É como se a lei
tivesse permitido que, em ambientes específicos, diversas atividades ilícitas
pudessem ser praticadas livremente e sem qualquer consequência”,
escreveu no GLOBO o jurista Gustavo Binenbojm.
No julgamento, suspenso em dezembro de 2024
por um pedido de vista do ministro André Mendonça, até agora votaram os
ministros Dias
Toffoli, Luiz Fux e Luís
Roberto Barroso. Todos defenderam responsabilização parcial ou total das
plataformas. Na ausência de iniciativa do Congresso, onde o Projeto de Lei das
Redes Sociais não avançou, um primeiro passo para disciplinar as redes seria o
Supremo invalidar o artigo 19 do Marco Civil. Não há dúvida de que as
plataformas teriam plenas condições de se adaptar a um sistema de retirada do
ar mediante notificação. Não fazer nada equivale a prorrogar o vale-tudo nas
redes sociais, abrindo espaço ao ódio e à barbárie.
Novo Código Civil poderá reduzir
judicialização em condomínios
O Globo
Com poderes ampliados, assembleia será foro para resolver disputas, desestimulando recurso à Justiça
A atualização do Código Civil em tramitação
no Senado aumenta o poder das assembleias de condomínios. É uma medida que
poderá reduzir a judicialização das disputas entre vizinhos. A assembleia
passará a ser um instrumento de gestão com mais poderes, em que desavenças
poderão ser resolvidas sem a necessidade de recorrer aos tribunais. As
convenções de condomínios que atenderem aos dispositivos do Código Civil
tenderão a desestimular a abertura de processos judiciais.
Empresas de administração de imóveis
costumavam resumir as reclamações em condomínios a cinco cês: cachorro,
criança, cano d’água, conserto e calote. Hoje há outras questões. Se o projeto
atual for aprovado pelo Congresso, assembleias poderão expulsar moradores de
comportamento antissocial ou vedar o aluguel por temporada, fonte de renda para
proprietários, mas de discórdia entre os moradores. Outra alteração será o
aumento da multa por inadimplência de 2% para 10% da taxa de condomínio.
O aluguel por temporada explodiu com o
surgimento de plataformas como Airbnb ou Booking. Ele exige a adaptação das
regras de condomínios à rotatividade de estranhos no prédio. O projeto do novo
Código Civil proíbe “hospedagem atípica”, a não ser que o condomínio estabeleça
permissão explícita em sua convenção. A formalização da permissão — ou
proibição — tende a desestimular ações na Justiça.
As cidades continuaram a crescer, mais
prédios têm sido construídos, e uma regulação eficaz do convívio entre
moradores é necessária para preservar a harmonia entre vizinhos. A pandemia
também forçou a população a ficar mais em casa, e os conflitos aumentaram. Em
alguns casos, o convívio se torna impossível, e a única saída é a expulsão. É
certo que essa deve ser uma resposta adotada em casos excepcionais. “Às vezes
temos pessoas com condições especiais, não podemos sair tirando elas de casa”,
diz Daniel Cervasio, professor de Direito Civil da Uerj. Mesmo assim, moradores
antissociais são mais comuns do que se costuma imaginar.
A aposentada Elisabeth Morrone proferia
insultos racistas contra o humorista Eddy Jr., seu vizinho em São Paulo. O
próprio condomínio moveu ação para expulsá-la. Depois de recurso, ela continuou
morando no prédio — nem sempre a Justiça atende ao pleito dos moradores. Agora,
quando a expulsão constar na convenção de condomínio, não será mais necessário
recorrer a uma ordem judicial.
Claro que a briga de vizinhos continuará a
existir, e seria ilusório acreditar que juízes deixarão de ser acionados. Mesmo
assim, com os poderes ampliados pelo novo Código Civil, a assembleia se tornará
o principal foro para resolução dos conflitos. É bom que seja assim.
PIB e proximidade da campanha não facilitam a
vida do BC
Valor Econômico
A economia está mais aquecida do que seria
desejável para que a inflação recue para a meta
A economia brasileira reacelerou no primeiro
trimestre do ano e cresceu 1,4%, depois da estabilidade no fim do ano (0,1%).
Apesar dos juros muito elevados, o destaque para o Produto Interno Bruto (PIB)
veio dos investimentos, pelo lado da demanda, com avanço de 3,1% agora e de
exuberantes 9,1% em relação ao mesmo período do ano passado. Na oferta, como
era esperado, a agropecuária cresceu 12,2%. O desempenho geral veio
marginalmente abaixo da mediana das expectativas das consultorias pesquisadas
pelo Valor, de
1,5%, mas acima do que sugeriria uma taxa de juros alta e ainda em elevação
naquele período. Com juros entre os três maiores do mundo, o Brasil teve a
quinta melhor performance no início do ano de 48 países, à frente até da China
(1,2%). A oposição entre política monetária contracionista e estímulos do
governo, agora mais voltados ao crédito, explica a contradição e sugere que a
desaceleração prevista para o segundo semestre pode ocorrer com menos
intensidade do que se a política econômica estivesse alinhada com a monetária.
Essa situação não facilita a tarefa do Banco Central (BC) e ratifica a direção
por ele dada de manter juros altos por tempo prolongado.
O impulso da economia no primeiro trimestre
em 2025 foi igual ao de 2023 (alta do PIB de 1,4% sobre o trimestre anterior),
e o de ambos superior ao dos demais inícios de ano da década. Sua composição,
no entanto, indica que haverá um esfriamento, com alguns indícios visíveis. As
expectativas da maioria das consultorias se deslocaram para acima de 2% no ano,
mas não se descarta que o resultado possa ficar mais perto de 3%. Apesar de a
agropecuária ter dado um salto de 12,2%, ele foi menos vigoroso que os 13,8% de
2023, pois a base de comparação anterior é mais baixa (-4,4% no último
trimestre). Se o comportamento de 2023 é parâmetro, as atividades do campo se
tornarão negativas nos três trimestres restantes.
Sempre em relação ao período imediatamente
anterior, a indústria estagnou no início do ano (-0,1%), e, mais importante
para o desempenho futuro, o setor de serviços (68,8% do PIB) mal cresceu em
relação ao último trimestre de 2024 (0,3% ante 0,2%), mesmo quando se considera
que seu “espelho” pela demanda, o consumo das famílias, havia se tornado
negativo (-0,9%) no fim do ano e agora tenha evoluído 1%.
Na ponta, todos os subcomponentes de serviços
estão desacelerando, com exceção do desempenho notável de informação e
comunicação (3% nos primeiros três meses). Mantêm-se próximas do nível de
atividade no primeiro trimestre de 2024 outras atividades de serviços (0,8%
ante 1,1%), que têm o maior peso relativo no setor e guardam relação mais
direta com a renda do trabalho, que continua aumentando acima da inflação. A
Pnad Contínua de abril mostrou elevação de 3,2% reais em 12 meses, a massa de
salários bateu recorde no período e o desemprego caiu a 6,6%. O comércio, por
seu lado, perde fôlego desde o segundo trimestre de 2024, assim como
transporte, armazenagem e correios.
Os investimentos deslancharam, mas esse
movimento será contido pelo custo do capital em elevação. Apesar do forte
crescimento, que puxou a produção doméstica de máquinas e as importações, ele
não veio acompanhado de boa performance da construção civil (recuo de 0,8% no
trimestre). A formação bruta de capital fixo deu um salto de 16,7% do PIB no
fim de 2024 para 17,8%, ampliando a distância da taxa de poupança, que cresceu
para 16,3% do PIB. Ainda assim, a FBCF ainda está 6,3% abaixo de seu pico
recente, do segundo trimestre de 2013.
Nas contas nacionais, a variação dos
investimentos é somada à dos estoques, que atingiram no primeiro trimestre do
ano o maior valor, R$ 66,4 bilhões, desde o primeiro trimestre de 2021. Segundo
a Secretaria de Política Econômica, os estoques contribuíram com 1,2 ponto
percentual para o PIB. Quando forem consumidos, subtrairão pontos do PIB, o que
deve ocorrer nos próximos trimestres. Por outro lado, o setor externo retirou
0,7 ponto do PIB. As exportações cresceram 2,9%, enquanto as importações
subiram o dobro disso, 5,9%, e nada menos de 15,6% em quatro trimestres.
O andar da economia dependerá do consumo por
um lado, e dos serviços, por outro. Rendimentos e massa salarial estão em
crescimento e sendo ajudados até agora pela expansão do crédito, que deve
arrefecer, embora o governo continue criando linhas para manter a rota de
expansão. O consumo do governo no primeiro trimestre foi de modesto 0,1%, em
boa parte devido à contenção de gastos executada com a ausência de orçamento
aprovado.
Os números do PIB não tornam a vida do BC
mais confortável. A economia está mais aquecida do que seria desejável para que
a inflação recue para a meta, o que exigirá mais juros ou juros altos por mais
tempo. Esta última parece ser a inclinação do BC. Se a alta do IOF for mantida,
com maior custo de empréstimos, o BC poderá pensar em manter os juros em 14,75%
até que as atividades e a inflação refluam. Não poderá contar para isso, como
deveria, com a ajuda do Planalto, que entrou em campanha eleitoral.
Mercado de crédito desafia juros escorchantes
Folha de S. Paulo
Novos financiamentos avançam com taxas de 26%
para empresas e 57,4% para famílias; fenômeno contribui para vigor do PIB
Ainda impressiona o vigor da economia
brasileira, demonstrado pelos dados
mais recentes de Produto Interno Bruto e emprego. As razões para tal
desempenho continuam motivo de discussão, mas um vetor parece especialmente
relevante: o mercado de crédito, que se mantém robusto mesmo diante de juros escorchantes.
De um lado, há crônicos empecilhos, hoje
agravados, para o financiamento a famílias e empresas. A taxa média no segmento
livre (não direcionado por determinação legal) ficou em nada menos que 45,3% ao
ano em abril, segundo o Banco Central.
Foram 26% para pessoas jurídicas e estratosféricos 57,4% para físicas.
As explicações para os juros tão acima da
Selic de 14,75% se dividem entre baixa retomada de garantias em créditos
inadimplentes por ineficiência legal e processual, custos de transação e
impostos elevados, ainda mais com a alta recente do IOF sobre novos
financiamentos.
Também é negativo que o número de pedidos de
recuperação e falências tenha batido recorde em 2024, embora nos primeiros
meses deste ano a tendência de alta pareça ter sido estancada.
É fato, entretanto, que a fragilidade se
concentra nas pequenas e médias empresas, mais dependentes dos bancos. As
maiores têm mais acesso a emissões de papéis no mercado de capitais.
No quadro geral, as concessões continuam a se
expandir. Em abril, houve alta de 3,7%, ajustada pela sazonalidade do período,
sendo 12,5% a mais para empresas e 0,4% para famílias. Em 12 meses, a expansão
dos novos financiamentos é boa —17,8% e 11,3%, respectivamente.
Até o final de 2024, ademais, o indicador de
impulso de crédito calculado pelo BC era positivo e mostrava aceleração em
relação ao ano anterior. Não há sinais de perda de ritmo até aqui. Por ora, o
aumento da inadimplência parece modesto, de apenas 0,3% nos últimos 12 meses,
para 4,8% da carteira total do segmento livre.
Ao contrário do que houve no período 2014-16,
quando a taxa básica de juros não era muito distante da atual, desta vez as
maiores empresas têm sido receptoras líquidas de recursos, não pagadoras —sinal
de que não há um ambiente recessivo no qual precisam restringir seu balanço.
O ambiente também conta com avanços
regulatórios no mercado de capitais. O peso das emissões diretas de títulos,
inclusive debêntures de infraestrutura, tem crescido. Com expansão de 22,6% nos
últimos 12 meses, essa categoria já representa montante comparável ao dos
créditos concedidos pelo sistema financeiro.
Esses papéis são adquiridos principalmente
por pessoas físicas, atraídas por juros altos e incentivos tributários.
Tudo considerado, o impulso do crédito se
mostra maior do que seria de esperar. Há o lado positivo, mas também riscos, em
particular pelo peso maior das dívidas para famílias e empresas menores, algo
que pode ter impacto doloroso mais à frente.
A honra e o direito à crítica
Folha de S. Paulo
STF julga dispositivo legal que eleva penas
para ofensas a servidores e agentes do Estado; norma deveria ser revista
Qual honra vale mais, a do servidor público
ou a dos demais cidadãos? O plenário do Supremo Tribunal Federal discute caso
em que se analisa a constitucionalidade do aumento
de um terço da pena para quem cometer crime contra a honra de funcionário ou
agente público em razão de suas funções.
O tema, que levanta questões delicadas sobre
liberdade de expressão e proteção da honra, tem dividido a opinião dos
magistrados da corte. Até maio, 5 ministros votaram, e 2 deles (André Mendonça
e Luís Roberto Barroso) defenderam não haver necessidade de punir mais
severamente ofensas a servidores.
Outros 3 (Flávio Dino, Alexandre de Moraes e
Gilmar Mendes) discordaram, argumentando que a pena maior se justifica por
proteção adicional ao órgão público —tese que une a honra do servidor à da
instituição.
Ao STF cabe evitar que a proteção legal seja
mal utilizada para coibir o dissenso e a crítica com os quais servidores
deveriam, por ofício, estar acostumados. Os próprios ministros do tribunal,
cumpre lembrar, envolvem-se costumeiramente em embates duros, em certas
ocasiões chegando a ataques pessoais.
Na relatoria, Barroso buscou uma saída ao
limitar o aumento da punição aos casos de calúnia (que corresponde a imputar a
alguém o cometimento de um crime), excluindo os de difamação (atribuir fato
ofensivo à reputação) e injúria (ofensa a dignidade ou ao decoro de alguém).
O tribunal deveria também refletir sobre a
necessidade de uma norma especial para agentes do Estado —que já seriam
protegidos pela legislação penal que tipifica os crimes contra a honra de todos
os cidadãos. Reforçar uma diferenciação legal parece colocar uns em posição
hierarquicamente superior à de outros.
O debate já teve momentos de veemência no
Supremo. "Eu não admito que ninguém me chame de ladrão. Porque essa tese
da moral flexível que inventaram é a tese que degrada o serviço público e
desmoraliza o Estado", disse Dino, ao discordar de Mendonça. O cuidado a
ser tomado aí é com a extensão desse entendimento, ainda mais em julgamentos
afetados por corporativismo.
Na prática, a pena adicional pode vir a ser empregada com o intuito nefasto de dissuadir cidadãos de se manifestarem criticamente sobre servidores. Na legislação (artigo 141, inciso II, do Código Penal), são citados especificamente os presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado e do Supremo, o que tem o potencial de dificultar até o exercício da liberdade de imprensa.
Profeta de araque
O Estado de S. Paulo
Como não governa, Lula da Silva faz comícios,
caçando votos antes da hora e posando de messias – como na Paraíba, onde se
apresentou como um enviado de Deus para levar água ao sertão
Água é vida, mas no mundo de Lula da Silva,
água é, acima de tudo, voto. Convicto dessa certeza, e demonstrando que pensa e
trabalha com a cabeça exclusivamente na próxima disputa eleitoral, o
presidente, já naturalmente em estado permanente de campanha, deflagrou a
temporada populista de caça ao voto, surpreendendo até mesmo quem se acostumou
ao seu modo palanqueiro de governar: em discurso durante um evento na região de
Cachoeira dos Índios, no sertão da Paraíba, onde entregou um trecho da obra que
integra o projeto de transposição do Rio São Francisco, o demiurgo petista se
apresentou como um enviado de Deus para salvar os pobres da seca. “Graças a
Deus, descobri uma coisa”, anunciou Lula, qual um profeta, para uma plateia
selecionada. “Deus deixou o sertão sem água porque Ele sabia que eu ia ser
presidente da República e que eu ia trazer água para cá.”
Em tom de quem tem poderes quase divinos, o
presidente-candidato pregou seu evangelho – a crença de que, não obstante a
reconhecida mediocridade do seu terceiro mandato, é o responsável pela redenção
nacional. Lula lembrou à plateia dócil de militantes e moradores escolhidos a
dedo que a obra em questão é esperada há 179 anos como forma de trazer água
para a região, e precisou que ele chegasse à Presidência para garantir tal bem
àqueles castigados pela escassez. “Essa obra é a redenção de um povo”, afirmou,
triunfante.
Antes do discurso na Paraíba, Lula esteve em
Salgueiro, interior de Pernambuco, onde assinou ordem de serviço para a
duplicação da capacidade de bombeamento de água do eixo norte da transposição
do São Francisco e, não satisfeito, citou realizações do seu governo e fez
promessas a esmo. Nos dois palanques, prometeu crédito para moradia, preço
baixo para o gás de cozinha e financiamento de motocicletas, além de informar,
para a surpresa de rigorosamente ninguém, que viajará o Brasil inteiro após
anunciar programas de crédito. É o roteiro habitual de quem governa sem pensar
em outra coisa senão no próprio poder, na recuperação da popularidade perdida e
na próxima eleição.
É Lula em estado bruto: enquanto o seu
governo está fazendo água por todos os lados e amarga a impopularidade
inclusive no eleitorado mais fiel ao presidente – a população mais pobre e os
nordestinos –, ele só tem o palanque para recorrer. Engolfado pela
incompetência do seu governo e pressionado pela proximidade do ciclo eleitoral
de 2026, Lula acelera o populismo. Convicto de que é o pai dos pobres, ignora
que, a despeito dos méritos de iniciativas como oferta de crédito e gás de
cozinha mais barato para os mais pobres, nada, na prática, é de graça – e o
País paga a conta de sua habitual demagogia.
O presidente e seus arcontes têm a mais plena
certeza de que o Brasil gira em torno de Lula. Na teoria lulocêntrica, só ele é
capaz de livrar o País e os brasileiros do mal maior – o bolsonarismo. Como,
para o presidente, Deus só existe porque o diabo também existe, a seita
lulopetista, também para existir, requer a existência de um inimigo tinhoso. No
palanque pernambucano, Lula recorreu, como de praxe, à sua marotagem
preferencial de justificar as falhas do seu governo ao passado, citando obras
de casas e creches que teriam ficado paralisadas na gestão de Jair Bolsonaro.
E, com seu linguajar próprio, concluiu, apontando para 2026: “A gente não pode
votar em qualquer tranqueira para governar este país”.
Esse vício palanqueiro se mostra agora
invariavelmente adornado pelas referências religiosas. Há alguns meses, em
outra viagem a Pernambuco, Lula já havia transformado o palanque em missa de
quermesse, usando, num só discurso, inacreditáveis 27 vezes “Deus” e “milagre”.
Disse ter sido escolhido pelo “homem lá de cima” e definiu como um “milagre de
fé” a obra que levará águas do Rio São Francisco ao agreste pernambucano. Lula,
diria Santo Tomás de Aquino, quer fazer crer que seu governo está no terreno do
mistério, isto é, que não se explica por meios racionais. Mas não há mistério
nenhum: o PT de Lula, que esteve no poder em 15 dos últimos 22 anos, já se
provou simplesmente incapaz de realizar os milagres que seu profeta de fancaria
anuncia.
Oportunidades no Nordeste
O Estado de S. Paulo
Região retoma a segunda posição no ranking de
consumo no País, uma evidência do potencial e dos desafios de Estados que ainda
podem crescer muito mais
Um levantamento da consultoria IPC Maps,
divulgado pelo Estadão há poucos dias, revelou que as famílias da
Região Nordeste consumirão R$ 1,5 trilhão em 2025, ficando atrás apenas das
famílias da Região Sudeste. Se isso se confirmar, o Nordeste trocará de posição
com a Região Sul, que no ano passado respondeu por 18,57% do consumo
brasileiro, ante 18,06% dos nove Estados nordestinos. Estima-se que neste ano o
Nordeste responderá por 18,59% do consumo no País, e o Sul, por 18,51%.
Mais de um fator explica o aumento do consumo
no Nordeste. E não se pode esquecer as trágicas enchentes que vitimaram o Rio
Grande do Sul no primeiro semestre de 2024, reduzindo porcentualmente o consumo
da Região Sul como um todo. Ainda assim, é positivo que o Nordeste, que
concentra o segundo maior contingente populacional do País – 54,6 milhões de
habitantes, segundo o IBGE, atrás apenas dos 84,8 milhões que vivem no Sudeste
– seja também a segunda maior região consumidora do Brasil.
Dado que a população nordestina é
praticamente o dobro da sulista (29,9 milhões), seria natural que o segundo
lugar em gastos fosse registrado por margem bem mais ampla. Não o é porque,
como atestam diversos indicadores socioeconômicos, o Nordeste está em
desvantagem em relação às outras regiões. A boa notícia é que a desvantagem
relativa pode se converter em oportunidades. O saneamento básico é exemplo
disso. De acordo com o IBGE, em 2023 apenas 50,8% dos domicílios do Nordeste
estavam conectados à rede de coleta de esgoto sanitário. Investimentos nesse
setor, bem como no de energia, devem fazer com que a região cresça a taxas
superiores às das demais (3,2% entre 2027 e 2034, segundo a consultoria
Tendências).
O Marco Legal do Saneamento Básico
estabeleceu a universalização da oferta de serviços de água e esgoto tratados
em todo o Brasil até 2033. Ainda que a esta altura já se saiba que a meta
dificilmente será cumprida, é mais do que desejável não se afastar em demasia
desse patamar civilizatório.
No caso do Nordeste, bastante atrasado nessa
área, a universalização é fundamental não só porque estudos comprovam que a
falta de saneamento básico prejudica indicadores de escolaridade e saúde das
populações que não contam com esse serviço, o que prejudica a produtividade e
onera o sistema público de saúde, como também porque a região tem enorme
potencial turístico.
Dados do Ministério do Turismo mostram que,
nos quatro primeiros meses de 2025, quase 160 mil estrangeiros desembarcaram
nos aeroportos nordestinos, bem mais que os cerca de 100 mil turistas do
exterior que visitaram a região no mesmo período no ano passado. Embora
variáveis flutuantes, como o câmbio, desempenhem papel relevante nas escolhas
turísticas, visitantes retornam ou recomendam destinos que ofereçam boa
infraestrutura, para além de belos atrativos.
Infelizmente, algumas capitais do Nordeste,
famosas por paisagens naturais exuberantes, têm índices de saneamento bastante
baixos, o que, mais do que afugentar turistas, mantém a população local presa
em um ciclo de subdesenvolvimento, o que é significativamente pior.
Esse ciclo torna a região bastante dependente
de programas de assistência social, que, como os investimentos em projetos de
energia, saneamento e o aumento do fluxo turístico, contribuíram para que o
consumo das famílias da região superasse o das do Sul do País. Mais de um terço
dos lares do Nordeste recebe Bolsa Família – a média nacional é de 19%.
Importantes e necessários, os benefícios sociais cumprem o papel de atender a
uma população que, por décadas, foi completamente negligenciada.
Remediar, contudo, não basta. É preciso
mapear as deficiências da região, bem como as potencialidades não só em
turismo, mas também em serviços, infraestrutura e tecnologia, entre outras,
para que o aumento do consumo da população não seja apenas consequência de
circunstâncias transitórias.
Rico em potencial, o Nordeste também tem
ampla representatividade política. O atual presidente da Câmara dos Deputados e
seu antecessor são nordestinos, assim como três dos últimos presidentes da
República desde a redemocratização, o que só comprova que a região não apenas
merece, como pode muito mais.
Desejo e realidade
O Estado de S. Paulo
Criado para dar votos a Lula, ‘Crédito do
Trabalhador’ estreia com juros altos
Em busca da popularidade perdida, e com os
olhos cada vez mais postos nas eleições de 2026, o governo Lula da Silva lançou
em março uma nova modalidade de crédito consignado que, muito se alardeou,
baratearia o custo do dinheiro para a população.
No entanto, dados recém-divulgados pelo Banco
Central demonstram que, por ora, o crédito a juros baixos para o brasileiro
“sair da mão do agiota” ou “resolver grande parte dos seus problemas”, como
enfatizou Lula da Silva, está longe de ser realidade.
De acordo com o mais recente relatório Estatísticas
monetárias e de crédito, do Banco Central (BC), os juros anuais do crédito
consignado para trabalhadores em regime CLT subiram 15,1 pontos porcentuais
(p.p.) em abril em relação a março, chegando a 59%.
Abril foi o primeiro mês cheio de operação do
novo consignado, lançado oficialmente no final de março sob o nome de “Crédito
do Trabalhador”.
O chefe do Departamento de Estatísticas do
BC, Fernando Rocha, afirmou que a alta nos juros do consignado “provavelmente”
está relacionada com uma avaliação de crédito pior, por parte das instituições
financeiras, do perfil de endividamento dos novos clientes da modalidade.
Faz todo sentido, já que, ao expandir a base
potencial de clientes do consignado de 4 milhões para até 47 milhões de
pessoas, expandem-se também os perfis de risco, que são determinantes para que
os bancos estabeleçam as taxas de juros.
Desde o lançamento, em março, mais de R$ 13
bilhões do novo consignado já foram concedidos a cerca de 2,3 milhões de
trabalhadores. As estimativas do potencial pleno dessa modalidade de crédito
variam entre R$ 120 bilhões e R$ 300 bilhões.
Embora o “Crédito do Trabalhador” tenha
arrancado com juros mensais médios de 3,6%, governo e bancos estão otimistas em
relação ao recuo futuro dessas taxas porque, a partir de julho, parte dos
recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) poderá a ser utilizada
como garantia na contratação do consignado CLT.
Inicialmente, o governo quis usar o FGTS, que
o trabalhador acumula compulsoriamente com remuneração irrisória, para forçar
os bancos a aceitarem um teto nos juros do consignado – uma total aberração,
tanto porque os juros, como comprovam os dados recentes, variam de acordo com o
perfil de risco do tomador, como porque não faz sentido algum que o trabalhador
não possa decidir como usar um fundo que lhe pertence.
A grita foi tanta que o governo teve de
recuar. Ainda assim, caso não haja mudanças, em breve o trabalhador poderá
utilizar 10% do saldo do FGTS, ou 100% da multa rescisória em caso de demissão,
como garantia para a contratação do novo consignado.
Residem aí as esperanças do governo de que o juro para os endividados se livrarem dos agiotas ficará mais baixo. Se assim será, só o tempo dirá. A realidade, porém, é de juros reais elevadíssimos e de um governo que superestima os efeitos benéficos de suas medidas, enquanto a população recorre ao crédito para lidar com a realidade de um cotidiano caro e cada vez mais incerto.
Festas que formam a identidade nacional
Correio Braziliense
Muito além de entretenimento, a riqueza
produzida pelas festividades tem alcance social e financeiro
Junho está começando e, com ele, tradição,
arte, turismo e economia movimentam o país por meio de eventos populares. As
festas juninas, o Bumba meu boi e o Festival de Parintins são exemplos de
celebrações que unem folclore, crenças e atividades sociais, mobilizando
multidões onde são realizadas. Ao longo da história do Brasil, essas
festividades foram construindo um importante patrimônio e movimentando diversos
setores. Muito além de entretenimento, a riqueza produzida por elas tem alcance
social e financeiro.
Com raízes regionais, os festejos mantêm viva
a essência do povo brasileiro, resgatando e transmitindo costumes e saberes.
Músicas, danças, trajes e comidas típicas divertem e conquistam o público, mas
também carregam valores que devem ser preservados. Essa tradição vibrante e
emblemática enaltece a vida em comunidade, reunindo pessoas de diferentes
classes sociais.
Na Região Norte, onde desde 1965 acontece o
Festival Folclórico de Parintins, milhares de espectadores acompanham a disputa
entre Boi Garantido e Boi Caprichoso, inspirada em lendas amazônicas, rituais
indígenas e aspectos da vida ribeirinha.
No Nordeste, o Bumba meu boi do Maranhão é
reconhecido como Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e também como Patrimônio Cultural
Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (Unesco). Já na Paraíba, o São João de Campina Grande,
famoso por sua grandiosidade, oferece uma maratona de atrações — este ano
distribuídas em 38 dias.
No Sudeste, as festas juninas são amplamente
comemoradas. O Minas Junina 2025, de acordo com o governo do estado, terá a
participação de mais de 400 municípios, com a expectativa de envolver 3 milhões
de pessoas e movimentar cerca R$ 20 milhões. Em São Paulo, no ano passado,
cerca de 500 mil visitantes participaram da programação.
Fato é que os arraiais pelo país são um dos
maiores impulsionadores do turismo interno, estimulando o setor com geração de
receita para hotéis, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais. A
criação de empregos diretos e indiretos é outro efeito importante das
celebrações. A relevância é tanta que, este ano, o governo federal desenvolveu
o "Conheça o Brasil Junino", programa com diversas ações para
incentivar e dar maior visibilidade aos festejos.
Ampliar o alcance das festas populares é uma iniciativa que deve estar na pauta dos atores do Legislativo e do Executivo. Pensar a valorização dessas manifestações é refletir sobre a memória brasileira e, ao mesmo tempo, promover a interação social e a economia. Os impactos positivos que esses eventos causam são oportunidades de desenvolvimento da sociedade de uma forma diversa e enriquecedora. Expressões da identidade nacional, elas precisam ser, cada vez mais, respeitadas e apreciadas pela população.
Os jardins de Fortaleza pedem por zelo
O Povo (CE)
Um jardim pode ter vários propósitos: relaxar
e apreciar a natureza; cultivar plantas; atrair pássaros, borboletas e abelhas;
decorar; abrigar práticas educacionais e recreativas; receber família e
visitantes. Há quem os guarde como espaços queridos da infância e quem projete
construí-los em seu lar como maneira de estar perto da natureza em meio a
prédios e avenidas.
Fortaleza tem seus jardins, particulares e
públicos — estes em forma de parques e praças. Uns são bem cuidados, outros
clamam por zelo e atenção. Entre eles, o Jardim Japonês, formalmente nomeado
praça Jusuka Fujita e idealizado para entretenimento, lazer, meditação e
atração de turismo.
Hoje é um adolescente, aos seus 14 anos, e
quase um "ponto cego" em meio à principal via turística da Cidade, a
avenida Beira Mar. Luminárias com defeito, paisagismo descaracterizado,
estruturas degradadas, sujeira. Seus 1.900 m² tornaram-se inseguros.
O cenário foi exposto por mais de uma vez nas
páginas, online e físicas, do O POVO; a mais recente em reportagem publicada na
última semana. Em resposta, a Prefeitura, por suas diversas secretarias,
informou: serviços de melhoria na infraestrutura serão realizados "o mais
breve possível", com limpeza e checagem da necessidade de manutenção.
A obra visava comemorar o centenário da
imigração japonesa, em 2008, e homenagear o primeiro imigrante japonês no
Ceará, de quem recebeu o nome. Com atraso e quase R$ 1,9 milhão investido, a
construção integrou as comemorações dos 285 anos da Capital, em 2011. E agora,
faz parte do quê?
Consta em variadas divulgações entre os
"lugares indispensáveis para conhecer em Fortaleza". No dia-a-dia,
estão por ali pessoas em situação de rua. Turistas e moradores da Capital,
quando muito, passam rapidamente.
Em seu tempo de existência, temos registro de
duas interdições temporárias para revitalização — uma ainda em 2011 e outra em
2013. Possui, como descreve a gestão municipal, simbologias nipônicas: nascente
d'água e lagos para acúmulo de experiência da vida; uma cascata para força e
juventude; e a ponte, ligação entre a terra e o paraíso. Reverências a uma
comunidade e a valores importantes na construção da Cidade.
Praças e parques urbanos podem ser
importantes locais de interação social, promovendo bem-estar e qualidade de
vida para visitantes e moradores. Havendo programações e manutenção, são
potentes locais para formar e fortalecer laços comunitários, o que contribui
também para a segurança pública.
Há tempo de mudar a história de abandono do Jardim Japonês, bem como de outros locais semelhantes em Fortaleza. Recursos para o cuidado adequado, garantindo múltiplos usos, devem ser buscados. Todo jardim demanda zelo cotidiano, bem sabe quem pode tê-los privadamente; o mesmo vale para os jardins da casa de todos os fortalezenses.
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