Folha de Paulo
Presidencialismo de coalizão morreu, mas
ainda não surgiu nada para substituí-lo
Para não passar recibo de vencido, o governo Lula precisa fingir que tem opções para reagir às derrotas que sofreu no Congresso. A verdade, porém, é que a administração está mais ou menos limitada a uma reação retórica, insistindo num discurso eleitoreiro de defesa de pobres contra ricos. É que, se Lula decidir peitar o centrão, perde. E ele sabe disso.
Até não muito tempo atrás, partidos mais
dados à fisiologia precisavam apostar no cavalo certo para ampliar seu poder.
Quem se aliasse antes ao candidato que venceria a eleição presidencial teria
mais acesso a cargos e verbas.
Não é mais assim. Agora, o centrão pode se
dar ao luxo de não apoiar ninguém no pleito para o Executivo —ou mesmo opor-se
a todos— e esperar que o vencedor tome posse e peça socorro ao bloco. Qualquer
governo depende do centrão para sobreviver.
Basta ver que, em 2022, Lula venceu com uma
coalizão composta exclusivamente por siglas de esquerda. A base que
nominalmente o apoia hoje formou-se após o pleito.
Em 2018, Bolsonaro ganhou com um discurso
francamente hostil ao centrão. O leitor se lembrará do general, ex-ministro e
agora réu Augusto Heleno entoando uma paródia musical que equiparava os
parlamentares do bloco a ladrões. Mas o Bolsonaro que governaria em contato
direto com o povo precisou tão desesperadamente do centrão que teve de
entregar-lhe o orçamento secreto.
A correlação de forças entre Executivo e
Legislativo mudou. O velho presidencialismo de coalizão morreu e ainda não
surgiu algo para substituí-lo.
O atual arranjo em que o centrão manda e
desmanda não é estável no longo prazo. Órgãos coletivos tendem a ser péssimos
zeladores de contas públicas. Sem uma arrumação, virá uma crise fiscal que
forçará mudanças.
O trágico é que os principais atores anteveem
esse cenário mas não têm incentivos para mudar seu comportamento. Em português
popular, é a sinuca de bico. Em linguagem mais técnica, é um equilíbrio de Nash
de baixa eficiência. Não importa qual termo você prefira, passaremos por
apertos.
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