segunda-feira, 14 de julho de 2025

As lições do tarifaço - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Tarcísio demorou para entender o significado da medida de Trump e de suas motivações

Sempre existiu incompatibilidade entre a pretensão de se mostrar um gestor pragmático e o papel de fiel escudeiro de Jair Bolsonaro, mas Tarcísio de Freitas costumava agir como se fosse possível conciliar as duas coisas. Até que, na semana passada, a realidade cobrou o seu preço.

O “gestor pragmático” descobriu — surpresa! — que as empresas, os agropecuaristas e os trabalhadores de São Paulo, o Estado que ele tem a responsabilidade de governar, serão os mais afetados pelo tarifaço de Donald Trump, a punição coletiva aos brasileiros pela qual a família do seu padrinho vinha trabalhando ativamente.

Sanções para o Brasil “de Lula”, esse era o desejo declarado dos Bolsonaro, a ponto de um deles ter se instalado nos Estados Unidos para realizá-lo.

Tarcísio demorou para entender o significado da medida e de suas motivações. Seu primeiro impulso, depois do ataque à economia e à soberania brasileiras, não foi criticar o presidente americano, mas novamente exibir sua lealdade a Bolsonaro, dizendo que o ex-presidente não tinha culpa de nada e endossando uma das justificativas usadas por Trump para as sanções: a acusação de que o governo brasileiro apoia censura. Poucos dias antes, Tarcísio havia comemorado postagem em que Trump se imiscuía em assunto interno do Brasil. Pegou muito mal no dia, ficou ainda pior em retrospecto.

“A responsabilidade é de quem governa”, escreveu Tarcísio, numa tentativa de atribuir a Lula, e a Lula apenas, a culpa pela praga tarifária de Donald Trump.

O presidente brasileiro de fato errou em cutucar a colmeia de idiossincrasias do ocupante da Casa Branca, ao criticar seu protecionismo e ao defender alternativas ao dólar durante cúpula do Brics realizada no Brasil. (Este colunista bem que alertou, há uma semana, que antagonizar com os Estados Unidos para injetar ânimo no Brics não era uma boa ideia.)

Ainda assim, o golpe comercial de Trump foi totalmente desproporcional a qualquer coisa que Lula possa ter dito. Em relações exteriores, discurso se combate com discurso, e ações com ações. Trump, porém, não funciona sob a lógica normal da diplomacia.

Lula deveria saber disso. E Tarcísio, se possui pretensões presidenciais, também. Se a responsabilidade é de quem governa, como ele mesmo disse, uma delas é não colocar interesses estrangeiros — ou individuais, no caso do objetivo de Jair Bolsonaro de escapar da cadeia — acima do bem-estar da população do seu Estado.

 

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