O Estado de S. Paulo
Tarcísio demorou para entender o significado da medida de Trump e de suas motivações
Sempre existiu incompatibilidade entre a
pretensão de se mostrar um gestor pragmático e o papel de fiel escudeiro de
Jair Bolsonaro, mas Tarcísio de Freitas costumava agir como se fosse possível
conciliar as duas coisas. Até que, na semana passada, a realidade cobrou o seu
preço.
O “gestor pragmático” descobriu — surpresa! —
que as empresas, os agropecuaristas e os trabalhadores de São Paulo, o Estado
que ele tem a responsabilidade de governar, serão os mais afetados pelo
tarifaço de Donald Trump, a punição coletiva aos brasileiros pela qual a
família do seu padrinho vinha trabalhando ativamente.
Sanções para o Brasil “de Lula”, esse era o desejo declarado dos Bolsonaro, a ponto de um deles ter se instalado nos Estados Unidos para realizá-lo.
Tarcísio demorou para entender o significado
da medida e de suas motivações. Seu primeiro impulso, depois do ataque à
economia e à soberania brasileiras, não foi criticar o presidente americano,
mas novamente exibir sua lealdade a Bolsonaro, dizendo que o ex-presidente não
tinha culpa de nada e endossando uma das justificativas usadas por Trump para
as sanções: a acusação de que o governo brasileiro apoia censura. Poucos dias
antes, Tarcísio havia comemorado postagem em que Trump se imiscuía em assunto interno
do Brasil. Pegou muito mal no dia, ficou ainda pior em retrospecto.
“A responsabilidade é de quem governa”,
escreveu Tarcísio, numa tentativa de atribuir a Lula, e a Lula apenas, a culpa
pela praga tarifária de Donald Trump.
O presidente brasileiro de fato errou em
cutucar a colmeia de idiossincrasias do ocupante da Casa Branca, ao criticar
seu protecionismo e ao defender alternativas ao dólar durante cúpula do Brics
realizada no Brasil. (Este colunista bem que alertou, há uma semana, que
antagonizar com os Estados Unidos para injetar ânimo no Brics não era uma boa
ideia.)
Ainda assim, o golpe comercial de Trump foi
totalmente desproporcional a qualquer coisa que Lula possa ter dito. Em
relações exteriores, discurso se combate com discurso, e ações com ações.
Trump, porém, não funciona sob a lógica normal da diplomacia.
Lula deveria saber disso. E Tarcísio, se
possui pretensões presidenciais, também. Se a responsabilidade é de quem
governa, como ele mesmo disse, uma delas é não colocar interesses estrangeiros
— ou individuais, no caso do objetivo de Jair Bolsonaro de escapar da cadeia —
acima do bem-estar da população do seu Estado.
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