segunda-feira, 7 de julho de 2025

Estado brasileiro não é grande nem pequeno, é desigual - Preto Zezé

O Globo

No Brasil, a cada R$ 1 de renúncia fiscal dado aos grandes, não há exigência proporcional de geração de empregos

Há quem defenda um “Estado mínimo” para justificar cortes de serviços e direitos sociais. Curiosamente, essa visão raramente se aplica aos grandes grupos econômicos, que continuam sendo generosamente amparados por isenções, subsídios e desonerações bilionárias. Para os pequenos e médios empresários — especialmente aqueles que empreendem nas favelas e periferias —, sobram burocracia e crédito caro, e falta apoio. É uma contradição que mostra o verdadeiro problema do Estado brasileiro: ele não é grande nem pequeno — é desigual.

O Brasil deixa de arrecadar mais de R$ 500 bilhões por ano em isenções fiscais e subsídios, segundo a Receita Federal (2023). Desse total, quase 60% beneficiam os setores da indústria e agropecuária de grande porte — empresas já capitalizadas e internacionalizadas. Só o agronegócio recebeu mais de R$ 90 bilhões em subsídios em 2023, enquanto a indústria automobilística embolsou mais de R$ 20 bilhões em desonerações ao longo da última década. Ao mesmo tempo, micro e pequenas empresas, que respondem por 30% do PIB e 54% dos empregos formais, tiveram acesso a menos de R$ 10 bilhões em crédito subsidiado no mesmo período.

Nas favelas, a distorção é ainda maior. Os pequenos negócios movimentam cerca de R$ 220 bilhões por ano, segundo a Data Favela — mais que o PIB do Uruguai. São empreendedores da economia popular que sustentam suas comunidades, geram renda local e resistem à falta de políticas públicas. Mesmo assim, menos de 20% conseguem acesso a linhas de crédito formais, e praticamente nenhum conta com isenção fiscal — mesmo empregando milhares de pessoas informalmente.

O problema não é o tamanho do Estado, mas para quem ele trabalha. O Estado brasileiro é enorme quando se trata de garantir margens para os grandes — e mínimo para os pequenos, que deveriam ser a base de um modelo de crescimento inclusivo.

Exemplos internacionais mostram caminhos alternativos. Nos Estados Unidos, programas públicos de compras e crédito priorizam pequenas empresas para garantir diversidade econômica. Em países nórdicos, mesmo grandes empresas só recebem benefícios em troca de contrapartidas sociais e ambientais. Em Cingapura, políticas habitacionais e de estímulo produtivo priorizam o microempreendedor local.

No Brasil, a cada R$ 1 de renúncia fiscal dado aos grandes, não há exigência proporcional de geração de empregos, inovação ou desenvolvimento territorial. Enquanto isso, cada R$ 1 investido em negócios periféricos retorna até R$ 3 para a economia local, segundo estudos do Sebrae.

Chegou a hora de redimensionar o Estado — não para ser menor ou maior em abstrato, mas para ser justo. Para parar de sustentar os já consolidados enquanto sufoca os emergentes. Para trocar privilégios por oportunidades reais para quem carrega o país nas costas: o pequeno empresário, o ambulante, a empreendedora da favela.

Se o Estado brasileiro quiser ser relevante no século XXI, deve parar de premiar quem já está no topo e começar a apostar em quem ainda tem muito a crescer.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.