O Globo
No Brasil, a cada R$ 1 de renúncia fiscal
dado aos grandes, não há exigência proporcional de geração de empregos
Há quem defenda um “Estado mínimo” para justificar cortes de serviços e direitos sociais. Curiosamente, essa visão raramente se aplica aos grandes grupos econômicos, que continuam sendo generosamente amparados por isenções, subsídios e desonerações bilionárias. Para os pequenos e médios empresários — especialmente aqueles que empreendem nas favelas e periferias —, sobram burocracia e crédito caro, e falta apoio. É uma contradição que mostra o verdadeiro problema do Estado brasileiro: ele não é grande nem pequeno — é desigual.
O Brasil deixa de arrecadar mais de R$ 500
bilhões por ano em isenções fiscais e subsídios, segundo a Receita Federal
(2023). Desse total, quase 60% beneficiam os setores da indústria e
agropecuária de grande porte — empresas já capitalizadas e internacionalizadas.
Só o agronegócio recebeu mais de R$ 90 bilhões em subsídios em 2023, enquanto a
indústria automobilística embolsou mais de R$ 20 bilhões em desonerações ao
longo da última década. Ao mesmo tempo, micro e pequenas empresas, que
respondem por 30% do PIB e 54% dos empregos formais, tiveram acesso a menos de
R$ 10 bilhões em crédito subsidiado no mesmo período.
Nas favelas, a distorção é ainda maior. Os
pequenos negócios movimentam cerca de R$ 220 bilhões por ano, segundo a Data
Favela — mais que o PIB do Uruguai. São
empreendedores da economia popular que sustentam suas comunidades, geram renda
local e resistem à falta de políticas públicas. Mesmo assim, menos de 20%
conseguem acesso a linhas de crédito formais, e praticamente nenhum conta com
isenção fiscal — mesmo empregando milhares de pessoas informalmente.
O problema não é o tamanho do Estado, mas
para quem ele trabalha. O Estado brasileiro é enorme quando se trata de
garantir margens para os grandes — e mínimo para os pequenos, que deveriam ser
a base de um modelo de crescimento inclusivo.
Exemplos internacionais mostram caminhos
alternativos. Nos Estados Unidos,
programas públicos de compras e crédito priorizam pequenas empresas para
garantir diversidade econômica. Em países nórdicos, mesmo grandes empresas só
recebem benefícios em troca de contrapartidas sociais e ambientais. Em Cingapura,
políticas habitacionais e de estímulo produtivo priorizam o microempreendedor
local.
No Brasil, a cada R$ 1 de renúncia fiscal
dado aos grandes, não há exigência proporcional de geração de empregos,
inovação ou desenvolvimento territorial. Enquanto isso, cada R$ 1 investido em
negócios periféricos retorna até R$ 3 para a economia local, segundo estudos do
Sebrae.
Chegou a hora de redimensionar o Estado — não
para ser menor ou maior em abstrato, mas para ser justo. Para parar de
sustentar os já consolidados enquanto sufoca os emergentes. Para trocar
privilégios por oportunidades reais para quem carrega o país nas costas: o
pequeno empresário, o ambulante, a empreendedora da favela.
Se o Estado brasileiro quiser ser relevante
no século XXI, deve parar de premiar quem já está no topo e começar a apostar
em quem ainda tem muito a crescer.
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