Folha de S. Paulo
Resposta do ministro à defesa do
ex-presidente foi sobretudo política ao evitar esticar a corda e deixar
entendido o que espera
Alexandre
de Moraes tornou-se figura central na cena política brasileira –e tem
incomodado poderosos dentro e fora do país. Sua tenacidade no combate ao
golpismo e às ciladas da extrema direita para corroer o Estado de Direito, por
meio de redes sociais e outros estratagemas, merecem o aplauso dos democratas
que não vivem no mundo da lua.
São conhecidos os motivos que têm levado ao ativismo do Legislativo. Não se resumem a casos específicos como foi a flagrante omissão da PGR no governo Bolsonaro. Dizem respeito a uma nova configuração do mundo pós-moderno, na qual a revolução tecnológica, a crise das promessas liberais o desequilíbrio da economia de mercado convivem com a ascensão internacional de um tipo de ultradireita nacionalista e extremada que usa os espaços da democracia para miná-la.
Nesse quadro, o STF assumiu no
Brasil papel fundamental na contenção do golpismo e da sabotagem do governo de
Bolsonaro contra as instituições republicanas —da saúde pública ao processo
eleitoral, passando pelo próprio Judiciário. Nesses embates, o ministro Moraes
assumiu a frente com o inquérito sobre as fake news e a tentativa de golpe e
supressão do Estado de Direito tendo em vista a máxima "a Justiça é cega,
mas não é tola".
Foi este mais uma vez o
alerta que fez à defesa de Bolsonaro no debate sobre a extensão das medidas cautelares
que aplicou ao ex-presidente. Bem, há certa margem discricionária em "não
ser tolo". Nossa língua registra, inclusive, provérbios sobre eventuais
alargamentos do uso da esperteza. Há quem considere que Moraes, na condução de
inquéritos e em decisões monocráticas, se exceda e cometa censura. São críticas
feitas em alguns casos com pertinência, embora em outros com mera candura
escolar, formalismo liberal anacrônico ou, o que é pior, ânimo fascista.
No esforço elogiável de mostrar-se
equilibrado em momento político especialmente delicado e explosivo, o ministro
preferiu evitar a prisão preventiva de Bolsonaro, decisão que seria
perfeitamente justificável, e dar preferência a medidas cautelares.
Ocorre que não tardou para se evidenciar um
problema nas prescrições, referendadas pela Primeira Turma do Supremo. Nem tudo
estava tão nítido sobre o que poderia ou não poderia ser feito. Bolsonaro, que
não sofreu nenhuma condenação, perderia seu direito de manifestação? Não
poderia falar? Não poderia dar entrevistas? Teria que controlar terceiros
divulgando suas palavras nas redes sociais?
Em
maior ou menor grau, especialistas viram aspectos questionáveis nas restrições,
não apenas do ponto de vista dos direitos, mas da própria natureza da
comunicação contemporânea, na qual não há como controlar a fluidez e o trânsito
entre plataformas. Instada por Moraes, que viu abuso em atitudes do
ex-presidente, a defesa respondeu e pediu esclarecimentos.
Pessoas mais gabaritadas em temas jurídicos
poderão analisar melhor, mas a resposta do ministro não foi límpida, foi
sobretudo política. Evitou o erro de determinar a proibição de entrevistas e
falas. Eu interpretaria assim o recado a Bolsonaro e seus advogados: a Justiça
não é tola, então não sejam tolos. Não é difícil entender. Mas se os radicais
quiserem, sempre poderão forçar uma prisão preventiva.
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