Trump abriu brecha para Lula reverter declínio de popularidade
O Globo
Pesquisa revela que reprovação caiu depois do
tarifaço, mas estratégia ‘ricos contra pobres’ tem limites
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva encontrou na chantagem feita ao Brasil pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, uma brecha para reverter sua acentuada queda de popularidade, como mostra pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira. Depois do anúncio do tarifaço de 50% para as exportações do Brasil, a desaprovação ao governo Lula recuou de 57% (resultado obtido em maio) para 53% . A aprovação subiu de 40% para 43%. Embora as variações estejam dentro da margem de erro, a distância entre reprovação e aprovação caiu de 17 para 10 pontos percentuais. É a primeira recuperação desde julho de 2024, quando a popularidade de Lula começou a esfarelar em meio à sucessão de crises.
A inflexão foi puxada principalmente pelo
Sudeste, onde estão os estados mais afetados pelo tarifaço de Trump. Na região,
a aprovação do governo Lula subiu de 32% para 40%, e a desaprovação recuou de
64% para 56%. No Nordeste, bastião eleitoral de Lula, a aprovação oscilou de
54% para 53%, e a desaprovação se manteve em 44%. “A recuperação aconteceu na
classe média, com maior escolaridade, no Sudeste”, diz o cientista político
Felipe Nunes, diretor da Quaest. “São os segmentos mais informados da população,
que se percebem mais prejudicados pelas tarifas de Trump e consideram que Lula
está agindo de forma correta até aqui.”
Ao mesmo tempo, a pesquisa sugere que a
estratégia do governo para surfar a onda de insatisfação com Trump tem limites.
O discurso que opõe “ricos contra pobres” incensado pelos petistas não encontra
eco na população: 53% disseram que ele “não está certo”, pois “cria mais briga
e polarização no país”. Apenas 38% o consideram correto. O resultado põe em
xeque as ações dos marqueteiros do PT que têm pautado influenciadores para
disseminar conteúdo baseado nesse discurso.
Desde o anúncio do tarifaço de Trump, Lula
tem demonstrado comedimento em declarações e atos. O governo criou um grupo,
liderado pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo
Alckmin, para discutir com empresários dos setores mais afetados as medidas
a adotar. Lula tem dito que tentará negociar com os Estados Unidos, deixando a
retaliação como último recurso. O próprio setor produtivo brasileiro sabe que a
legítima aplicação da Lei da Reciprocidade traria perdas para todos.
A leve recuperação da popularidade de Lula
segue a dinâmica verificada noutros países, onde líderes avaliados
negativamente pelo eleitorado conseguiram reverter a situação desfavorável com
a ajuda improvável de Trump. As próximas pesquisas dirão se o acerto na defesa
da soberania nacional, da independência do Judiciário e da democracia diante
dos arroubos trumpistas será suficiente para transformar os rumos de um governo
impopular, mergulhado em sucessivas crises. De acordo com a Quaest, 59% não se
sentem representados pela nova agenda do governo. Para consolidar sua
recuperação, portanto, Lula precisará atuar também fora do ringue armado por
Trump.
Texto da reforma do IR deve excluir
multinacionais
O Globo
Mecanismo criado para reter impostos na fonte
pode contribuir para afugentar investimentos
O Projeto de Lei que altera o Imposto de
Renda (IR) apresentado pelo governo sem dúvida tem méritos. A tributação da
renda no Brasil é cheia de distorções, em geral resultado de exceções e regimes
especiais. Quem ganha menos paga proporcionalmente mais. O percentual calculado
depois dos descontos permitidos — ou “alíquota efetiva” — pago por advogados,
médicos ou contratados como pessoa jurídica é bem inferior ao de quem tem renda
mais baixa. A principal qualidade do PL é tentar sanar essa injustiça tributária.
O governo propôs isentar quem ganha até R$ 5 mil mensais e reduzir alíquotas
para a faixa até R$ 7 mil. Na outra ponta, impôs uma alíquota efetiva mínima a
quem tem renda superior a R$ 50 mil mensais.
Mas o PL ainda tem problemas que precisam ser
corrigidos. Em seu parecer, o relator do projeto na Comissão Especial da
Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL),
decidiu elevar a faixa de redução de alíquotas para quem ganha até R$ 7.350.
Mas manteve para as empresas multinacionais regras de taxação na fonte que
podem contribuir para afugentar investimentos.
Quem recebe seu rendimento na forma de
dividendos de empresas sujeitas a regimes especiais hoje paga menos imposto —
em média 3,3% de alíquota efetiva no caso do Simples e 10,6% no do Lucro
Presumido, ante até 27,5% para os assalariados. Para corrigir isso, o PL impõe
uma alíquota efetiva mínima de até 10% para as rendas altas e um desconto na
fonte de 10% sobre os dividendos distribuídos.
Na proposta original do governo, havia a
possibilidade de restituição desse imposto retido na fonte quando a alíquota
efetiva ultrapassasse 34%, considerando o imposto pago pela empresa e pelo
sócio (ou 45% para instituições financeiras). Tal limite faz sentido, porque
esse é o patamar de taxação das empresas sujeitas ao regime de Lucro Real, um
dos mais altos do mundo. Na primeira versão de seu relatório, porém, Lira
eliminou o teto para a alíquota efetiva, elevando a taxação dos sócios a até
40,6% (ou 50,5% no caso das empresas financeiras). Se aprovado, esse patamar
configuraria uma carga de impostos ainda maior, criando desincentivo aos
investimentos. A versão aprovada pela Comissão Especial felizmente restaurou o
teto. É uma taxação alta para padrões internacionais, mesmo assim a decisão foi
um avanço em relação à primeira proposta de Lira.
No caso das multinacionais, porém, a
distorção foi mantida. Pelo texto, empresas estrangeiras que detêm
participações acionárias no Brasil passam a sofrer retenção na fonte de 10% dos
dividendos que recebem, mas sem que haja restituição, tanto no Brasil quanto no
exterior. A medida consolidaria o país como o primeiro no ranking mundial das
maiores cargas tributárias sobre lucros empresariais. Para afugentar ainda mais
o capital estrangeiro, o governo também mirou nas multinacionais no embate em
torno do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Ao analisar o PL, os deputados devem excluir
as empresas estrangeiras da taxação adicional. Na melhor das hipóteses, elas
repassariam o custo dos tributos ao consumidor, gerando mais inflação. Na pior,
simplesmente desistiriam de investir no Brasil. “Com esse trecho do PL, o
governo dá um tiro no próprio pé, porque todos os brasileiros perdem”, diz
Romero Tavares, líder de Tributação Internacional na consultoria PwC. Sem essa
correção, o PL afastará investidores estrangeiros.
Investigação contra o Brasil prolonga ameaça
tarifária
Valor Econômico
A investigação tem objetivo claro de atacar a
legislação brasileira e os atos do Supremo Tribunal Federal em relação às Big
Techs
Enquanto a imposição de tarifas de 50% para
exportações do Brasil foi baseada ineditamente em argumentos políticos — a
suposta perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro — a investigação aberta
pelo Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR na sigla em inglês) para
apurar políticas, atos e práticas que prejudicam as empresas americanas
procurará dar bases econômicas à investida do presidente Donald Trump contra o
Brasil. O processo durará um ano e por um bom tempo servirá como uma ameaça
para a decretação de mais tarifas ou outros meios de reduzir o acesso de
mercadorias brasileiras ao maior mercado do mundo.
A investigação, que se inicia hoje, tem
objetivo claro de atacar a legislação brasileira e os atos do Supremo Tribunal
Federal em relação às gigantes empresas de TI americanas, já na campanha
presidencial alinhadas aos desígnios do republicano. É o primeiro ponto da
lista de itens a serem questionados.
Nela é ressaltada a votação recente do STF
que tornou as empresas “responsáveis por postagem ilegais dos usuários, mesmo
sem autorização judicial para remover o conteúdo”. Para o governo dos EUA, os
conteúdos definidos como ilegais incluem grande variedade de discursos,
inclusive o político e “aumenta significativamente o risco de prejuízo para as
empresas de mídia social americanas”. O USTR autoridade americana assume como
fato a lenda de que o STF emitiu “ordens secretas” para censurar empresas de
mídia nos EUA e retirar das plataformas “dezenas de críticos políticos,
inclusive americanos”. Além disso, suspeita de “práticas desleais” de serviços
de pagamento eletrônico, entre elas os serviços desenvolvidos pelo governo —
referência ao Pix.
Trump não aceita que outros países tenham
legislação diferente da totalmente permissiva dos EUA. Esse é um ponto central
de sua guerra tarifária, para o qual é quase impossível uma solução de
compromisso. Os EUA não têm o direito de interferir em regras decididas
democrática e legalmente pelas instituições do país.
Nos outros pontos prevalecem motivações
econômicas polêmicas. Os EUA reclamam que acordos comerciais parciais feitos
pelo Brasil dão tratamento tarifário preferencial em detrimento das empresas
americanas. O documento da USTR cita especificamente os acordos com o México,
que tem milhares de linhas tarifárias com baixa ou nenhuma tarifa, e Índia, com
centenas delas, abrangendo produtos agrícolas, motores e autopeças,
equipamentos, produtos minerais e químicos.
O órgão aponta que enquanto US$ 1,7 bilhão em
motores e autopeças do México foi importado quase sem tarifas, as empresas dos
EUA têm de pagar de 14% a 35%, mesmo sendo o México um dos maiores produtores
mundiais do setor. Não há menção ao fato de que essa legislação protege também
empresas americanas, como a General Motors, a terceira maior em vendas de
automóveis no Brasil e nos EUA.
O governo americano desconfia também que a
leniência da aplicação da legislação anticorrupção brasileira pode estar
prejudicando empresas e investidores americanos no país e pode ferir protocolo
específico assinado pelos dois países como parte de convenção internacional
para combater corrupção. Paradoxalmente, o próprio Trump sinalizou que obedecer
às regras anti-corrupção pode ser uma desvantagem competitiva. Em 10 de
fevereiro de 2025, ele suspendeu a legislação americana pertinente (Foreign
Corrupt Practices Act) por 6 meses e postergou a abertura de investigações e
ações judiciais.
O USTR aponta ainda que o insucesso do Brasil
no combate ao desmatamento pode prejudicar os interesses dos EUA. Não porque
esteja preocupado com o aquecimento global — o país retirou-se novamente do
Acordo de Paris e está desmantelando a legislação de proteção ambiental —, mas
porque o desflorestamento ilegal serve à produção mais barata de carne e soja,
produtos em que os dois países são concorrentes diretos e competitivos. Além
disso, prejudicam as madeireiras — o documento especifica que um terço da madeira
da Amazônia tem origem ilegal.
O USTR corrige a carta de Trump, ao
reconhecer que os EUA têm superávits comercial e de serviços com o Brasil. Mas
quer mais — reclama que o déficit específico em produtos agrícolas aumentou de
US$ 3 bilhões em 2020 para US$ 7 bilhões em 2024. Não menciona que os EUA
sempre subsidiaram sua produção do campo e que, em 2025, para fazer frente à
própria guerra tarifária, fará pagamentos diretos aos agricultores de US$ 42,4
bilhões, mais de quatro vezes os US$ 9,3 bilhões de 2023, segundo a Dow Jones.
A investigação iniciará audiências públicas
em 3 de setembro e pode ser uma porta para que o governo brasileiro possa ser
bem-sucedido em postergar as tarifas americanas. Elas foram impostas antes de
que as acusações dos EUA sejam provadas, já que um processo de consulta foi
iniciado para isso. Até agora, o Planalto agiu corretamente, ao não fazer
bravatas com retaliações e ao reunir os empresários para decidir o melhor
caminho para barrar a ação de Trump, que torna inviável boa parte das
exportações brasileiras para o país.
PGR mostra que não cede à tramoia dos
Bolsonaro
Folha de S. Paulo
Apesar das pressões de Eduardo, Gonet ignorou
as ameaças de Trump nas alegações finais do processo sobre trama golpista
A Procuradoria-Geral da República (PGR) entregou na
segunda-feira (14) as alegações
finais do processo em que acusa o ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL)
e outros sete réus pela trama golpista de 2022-2023. Como seria de esperar, a
agressão comercial perpetrada por Donald Trump,
presidente dos Estados
Unidos, em nada influenciou o documento.
Assinada pelo procurador-geral, Paulo Gonet,
a peça mostra que o Brasil, uma nação soberana, democrática e dotada de Poderes
independentes entre si, não se curva às pretensões tirânicas de quem quer que
seja.
Ignorando a pressão representada pelo
tarifaço de 50% sobre as exportações brasileiras, Gonet manteve o tom
contundente que marcou suas demais manifestações nos mesmos autos. Com
sobriedade, não se desviou um milímetro da linha de raciocínio que já vinha
sendo construída.
De acordo com ele, para além de testemunhos e
delações premiadas, um amplo conjunto probatório demonstra a conspiração contra
as instituições democráticas, caracterizando crimes como organização criminosa
armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe
de Estado, entre outros.
Claro que Gonet não usou suas conclusões como
resposta à estapafúrdia manobra que uniu Trump aos Bolsonaro, mas a
assertividade da peça processual evidencia a distância que existe entre a
realidade factual e o mundo delirante em que parecem viver o ex-presidente e
sua família.
E, dentro do clã, tudo indica que ninguém é
mais refém das próprias ilusões do que Eduardo
Bolsonaro. Refugiado nos EUA, o deputado federal pelo PL-SP dedica-se a
elaborar tramoias contra o Brasil, na vã esperança de influenciar o julgamento
de seu pai no Supremo Tribunal Federal.
Não que o senador Flávio
Bolsonaro (PL-RJ) e o próprio ex-presidente deem sinais de entender
como funciona uma república moderna ou de aceitar suas regras, mas, pelo menos,
esboçaram um cálculo racional ao se posicionarem a favor de Tarcísio
de Freitas (Republicanos)
na pendenga com Eduardo.
O governador de São Paulo, claudicante
e inábil em meio à guerra comercial deflagrada por Trump, perdeu
cacife político entre direitistas moderados e se tornou alvo dos mais radicais,
capitaneados pelo deputado brasileiro em solo americano.
O fato de Flávio e Jair Bolsonaro terem saído
em defesa de Tarcísio indica que nem eles se dispõem a escudar um
sonho presidencial de Eduardo —e sugere que o governador de São Paulo, afinal,
pode ser o plano B nesse campo político, agora chamuscado pelo disparate
antipatriótico.
Se estivessem prejudicando apenas a si
mesmos, pouco haveria a acrescentar, mas é o país quem sofrerá as consequências
econômicas de mais essa irresponsabilidade bolsonarista. O bordão "Brasil
acima de tudo", logo se vê, não passa de demagogia barata a serviço de
interesses exclusivamente pessoais.
Inteligência artificial e pirata
Folha de S. Paulo
É preciso contemplar a sustentabilidade da
atividade jornalística, cujos textos usados por IA são obtidos sem autorização
Ainda não se sabe qual será a dimensão do
impacto da inteligência
artificial (IA) sobre a sociedade, mas já é certo que essa tecnologia será cada
vez mais utilizada em diversos setores. Também é certo que seus sistemas
precisam ser treinados com gigantescas bases de dados e que a qualidade desses
dados tem efeito significativo sobre a performance das ferramentas.
Nesse contexto, produtos jornalísticos, sobre
os quais há controle de qualidade, tornam-se insumo importante para
desenvolvedores de IA, sobretudo quando lidam com modelos de linguagem capazes
de responder a questões da atualidade.
O problema é que, em vez de pagarem pelo
direito de utilizar esses textos, como qualquer fabricante honesto faz quando
compra matérias-primas, vários optam por piratear sites e arquivos de veículos
de imprensa.
A prática é disseminada e inclui desde
desenvolvedores de fundo de quintal, cujas ferramentas não tão inteligentes se
limitam a reproduzir trechos inteiros de reportagens e colunas, até gigantes do
setor, como a Open AI, que criou o popular ChatGPT.
Há casos de robôs que são ensinados a driblar
as barreiras tecnológicas instaladas por sites jornalísticos para tentar
impedir a entrada desses autômatos, algo análogo ao furto qualificado.
As regras de direitos autorais já vedam esse
tipo de uso de dados, mas seria importante criar uma legislação mais
específica, que coíba o treinamento de ferramentas com dados adquiridos sem
autorização expressa.
Há projetos com esse teor em tramitação, no
Brasil e em outras países, e julgamentos que deverão estabelecer paradigmas
globais. Um
deles envolve o The New York Times, que processou a Open AI e sua sócia,
a Microsoft.
O prejuízo para a imprensa é duplo. Além de
não ser devidamente remunerada pelo seu trabalho, também perde tráfego —e,
portanto, faturamento— com a concorrência
desleal colocada pelos resumos gerados por IA.
Tais resumos hoje aparecem no alto da maioria
dos mecanismos de busca da internet.
Muitos usuários se satisfazem com eles e deixam de acessar os sites que
originaram o conteúdo.
Os desenvolvedores que acreditam que suas ferramentas se firmarão no mercado deveriam ser os mais interessados em criar um ambiente sustentável em que a imprensa siga existindo e produzindo o material que lhes servirá como fonte de alto valor agregado —dada a maior confiabilidade dos textos jornalísticos, em comparação com opiniões despejadas em redes sociais.
Farisaísmo no Supremo
O Estado de S. Paulo
Afetando garantismo, Toffoli volta a se
apoiar em provas ilegais para livrar mais um condenado na Lava Jato – desta vez
o decano dos delinquentes, o doleiro Youssef – e desmoraliza o Judiciário
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Dias Toffoli fez o impensável até para quem eventualmente já havia se
acostumado com seu fervor farisaico para arrancar a Operação Lava Jato dos
anais da história nacional. Na terça-feira passada, o sr. Toffoli anulou todos
os atos processuais praticados por integrantes da força-tarefa da Lava Jato e
pelo então juiz Sergio Moro contra o notório doleiro Alberto Youssef. Já seria
gravíssimo caso estivéssemos tratando apenas de um ministro do STF que
orgulhosamente debocha do Brasil decente. Mas é pior: sozinho, o que é outro
problema, o sr. Toffoli emporcalhou a história republicana do Supremo e, como
se isso não bastasse, degradou ainda mais a confiança dos brasileiros no
sistema de Justiça deste país.
A fundamentação de Toffoli para livrar a cara
de Youssef, um criminoso confesso condenado a mais de 120 anos de prisão, foi a
mesma empregada em outros processos envolvendo a nata da corrupção apanhada
pela Lava Jato que, desgraçadamente, foram parar no seu gabinete: o tal
“conluio” entre a força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba
(PR) e Moro. Para chegar a essa conclusão, Toffoli baseou-se nas investigações
da Operação Spoofing, que apurou a captura ilegal de conversas entre procuradores
da República por um aplicativo de mensagens.
“Sob objetivos aparentemente corretos e
necessários, mas sem respeito à verdade factual, magistrado e procuradores de
Curitiba desrespeitaram o devido processo legal, agiram com parcialidade e fora
de sua esfera de competência” contra o doleiro, escreveu Toffoli em sua
decisão. O ministro apegou-se a uma suspeita, fruto de um ato criminoso (o
hackeamento de mensagens dos integrantes da Lava Jato), para jogar no lixo um
robusto conjunto probatório fornecido às autoridades, pasme o leitor, pelo
próprio condenado. Ao firmar seu acordo de colaboração premiada – acordo este,
convém lembrar, homologado pelo próprio STF –, Youssef forneceu evidências
materiais de que lavava dinheiro de empreiteiras contratadas pela Petrobras que
era usado para pagar propina a próceres do PT, PP e MDB.
Se estamos no campo do rigor processual, para
começar, Dias Toffoli deveria se declarar impedido de julgar quaisquer dos
processos de revisão da Lava Jato. Afinal, ele foi identificado por outro
criminoso confesso, Marcelo Odebrecht, como sendo “o amigo do amigo de meu
pai”, uma referência, respectivamente, a Toffoli, a Lula da Silva e a Emílio
Odebrecht. Ademais, não há pureza processual quando se ignora a origem ilegal
do material usado por Toffoli para destruir a Operação Lava Jato e livrar todos
os seus condenados, inclusive os que confessaram os crimes e devolveram o
dinheiro roubado.
Sabe-se que o MPF e a Justiça Federal
cometeram erros na condução da maior operação de combate à corrupção de que o
País já teve notícia. Este jornal não cansou de apontá-los nesta mesma página.
O que Dias Toffoli tem feito, porém, não é corrigir erros mantendo íntegras a
defesa do melhor interesse público, a responsabilização daqueles que
confessaram uma pletora de crimes em troca de benefícios penais e a
credibilidade do STF. O sr. Toffoli está empenhado em escarnecer do próprio
ideal de justiça e do dever do Estado em provê-la aos cidadãos.
Com uma caneta solitária e uma retórica para lá de falaciosa, o ministro Dias Toffoli transformou o STF, sob o beneplácito de seus pares, numa vergonhosa ermida para os que se beneficiam desse revisionismo no qual criminosos confessos se veem reabilitados à custa da desmoralização do sistema de Justiça. Ao se valer de provas que em qualquer circunstância deveriam ser consideradas nulas para reverter condenações que decorreram de extensas investigações policiais, foram homologadas por diversas instâncias e ratificadas pelo mesmo Supremo do qual ele faz parte, o sr. Toffoli incorre numa contradição inaceitável e corrosiva para o Poder Judiciário. O prejuízo para o País é imenso.
Antes Trump fosse o único problema
O Estado de S. Paulo
Ampliar as exportações depende do
enfrentamento de problemas domésticos que antecedem a ascensão do presidente
americano, entre eles o protecionismo comercial e o desequilíbrio fiscal
Se a tresloucada política comercial de Donald
Trump fosse o único obstáculo às exportações brasileiras, o País teria muito a
comemorar. A julgar pela ciclotimia do presidente dos Estados Unidos e pelo
profissionalismo de nossa diplomacia, seria mera questão de tempo até que tudo
se resolvesse – não pela boa vontade de Trump, mas pelo reconhecimento da
dificuldade da indústria e do consumidor norte-americanos em substituir
produtos brasileiros como aço, café, carne bovina e suco de laranja.
Tais itens ressaltam a notável capacidade do
agronegócio e de alguns poucos segmentos da indústria de produzir itens de alta
qualidade e baixo custo, especialmente commodities agrícolas e minerais. Mas
enquanto algumas companhias de grande porte se destacam nessa seara, a maioria
das pequenas e médias empresas brasileiras não têm condições de vencer os
inúmeros entraves que se interpõem entre a produção e a exportação de um item
ou serviço. E isso não se deve a Trump, mas a problemas domésticos cuja origem antecede
em décadas a ascensão do republicano.
Juros elevados, protecionismo, alta carga
tributária, infraestrutura decadente, excesso de burocracia, falta de políticas
de pesquisa e inovação e educação de baixa qualidade explicam muitas das
dificuldades que o Brasil tem para inserir seus produtos no exterior com
competitividade. São questões que se retroalimentam e que, em conjunto, pesam
mais que medidas pontuais para favorecer um determinado setor escolhido a dedo
pelo governo de turno. Não faltam experiências a mostrar que isso não funciona,
mas o Brasil persiste com os mesmos erros na expectativa de obter resultados
diferentes.
O Brasil faria muito bem se reduzisse
consideravelmente as tarifas de importação de forma geral, em especial para
compra de máquinas e equipamentos. O grau de abertura da economia – medido pela
soma das exportações e importações de bens e serviços na proporção do Produto
Interno Bruto (PIB) – foi de 34,3% nos últimos cinco anos, segundo estudo do
Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP). Já foi pior, de 24,5% entre 2010
e 2014, mas o índice permanece inferior ao de países emergentes como México, Índia
e Indonésia, de, respectivamente, 80%, 43,8% e 39,5%.
A despeito de ser a 11.ª maior economia do
mundo, o Brasil está no 23.º lugar no ranking de maiores exportadores e em 25.º
na lista dos maiores importadores. Há muito espaço para avançar, mas
protecionismo e políticas de conteúdo nacional, nesse caso, são
contraproducentes. Grandes exportadores costumam ser grandes importadores, e o
Brasil já deveria ter compreendido isso há tempos com o exemplo da Embraer, que
importa grande parte dos componentes de aviões, e de países como Alemanha e
Itália, que figuram entre os maiores exportadores de grãos de café torrados sem
abrigar plantações.
Não bastassem as elevadas alíquotas de
importação, o Brasil pratica taxas de juros que inviabilizam financiamentos e
investimentos na infraestrutura necessária para escoar a produção. A culpa não
é do Banco Central, mas do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, que,
juntos, gastam mais do que arrecadam há mais de uma década. E a solução não são
linhas de crédito direcionado e subsidiado. A redução estrutural da Selic
depende de superávits primários consistentes ao longo de anos, capazes de arcar
com os juros e assim estabilizar a trajetória da dívida na proporção do PIB.
A aprovação da reforma tributária sobre o
consumo, ao simplificar o sistema e criar uma alíquota padrão, foi um passo
importante rumo à correção de ineficiências. Mas o País ainda tem muito a
avançar na redução de burocracias que facilite a vida de potenciais futuros
exportadores.
O País ainda não aproveitou oportunidades para se integrar a cadeias produtivas que foram desestruturadas pela pandemia de covid-19 e, na educação, ainda patina para melhorar a qualidade do ensino e formar mão de obra apta para assumir os empregos do futuro. Quem sabe agora, com a criação de novos entraves por Trump, o País se veja obrigado a rever as barreiras que criou em torno de si mesmo.
O registro da barbárie
O Estado de S. Paulo
Não fossem as câmeras nos uniformes de PMs,
brutalidade policial em Paraisópolis sairia impune
As câmeras acopladas às fardas levaram à
prisão e ao indiciamento por homicídio doloso de dois policiais militares de
São Paulo. Esse foi o desfecho de uma operação realizada na Favela de
Paraisópolis, na zona sul da capital paulista, quando os agentes foram à favela
para averiguar uma denúncia de tráfico de drogas, mas, em vez de prenderem os
criminosos, decidiram executar um suspeito no local.
A morte de Igor Oliveira de Moraes Santos, de
24 anos, no dia 10 passado, foi o estopim para uma noite de terror na favela.
Bandidos se aproveitaram da comoção popular para fechar ruas, erguer barricadas
e atacar ônibus, assustando trabalhadores e forçando motoristas a abandonarem
seus carros, que foram virados. Veículos da imprensa também foram encurralados.
A versão inicial era a de que Santos, que era
um dos suspeitos do crime de tráfico de drogas, não havia obedecido à ordem de
rendição. Porém, no dia seguinte, o comando da Polícia Militar (PM) chamou
jornalistas para explicar o que de fato ocorrera na favela. Segundo o porta-voz
da corporação, coronel Emerson Massera, as imagens das câmeras nas fardas dos
policiais mostraram que dois agentes haviam rendido Santos dentro de uma casa.
O jovem já estava no chão, com as mãos na cabeça, quando outros dois policiais
entraram no local atirando.
Nas palavras de Massera, foi uma “ação
ilegal, não legítima” e “não havia nada que justificasse o disparo”. Revelada
graças às câmeras, a execução fez o coronel reconhecer os “erros” dos agentes
da PM e lamentar o crime. Já o governador Tarcísio de Freitas afirmou que
policiais que infringirem a lei serão “sempre” punidos de forma rigorosa e
disse que não serão tolerados “desvio”, “ilegalidade” e “abuso”.
É bom saber que as autoridades do Estado
consideraram inaceitável o que ficou registrado de forma cristalina nas imagens
das câmeras nos uniformes. Afinal, não é possível tergiversar diante da
barbárie. Mas é preocupante que o governador ainda classifique como “desvio” um
comportamento que tem se repetido com inquietante frequência na polícia
paulista. Em 2024, policiais civis e militares mataram 814 pessoas, um aumento
de incríveis 61% em relação ao ano anterior. Além da evidente escalada da
violência policial, multiplicam-se casos de brutalidade gratuita e que ganham
evidência graças a imagens de celular de testemunhas, horrorizando os cidadãos.
Desde que a PM paulista adotou as câmeras nos
uniformes, em 2020, no governo de João Doria, ficou mais difícil para os maus
policiais esconderem sua violência alegando que suas vítimas eram “bandidos”
mortos em “confronto”. Por isso mesmo, a sociedade reagiu com firmeza à
tentativa do governador Tarcísio e de seu secretário de Segurança, Guilherme
Derrite, de desidratar o programa de câmeras corporais.
Tarcísio teve de voltar atrás e reconhecer que as câmeras são necessárias. Mas só isso não basta. É preciso também melhorar urgentemente o treinamento dos policiais e acabar com a mentalidade de que é aceitável atirar em quem o policial julga ser bandido, mesmo que esteja rendido. Isso não é segurança pública.
Lei de manejo do fogo precisa ser cumprida
Correio Braziliense
Não à toa, o debate sobre as mudanças
climáticas estão na pauta mundial e chegam ao país, por meio da COP30
A riqueza do patrimônio ambiental do Brasil é
invejável. Mas, ao longo dos anos, tem sido explorada de modo equivocado, com
perdas expressivas e prejudiciais à vida humana, à cobertura vegetal, à fauna e
à economia nacional. Isso sem contar o impacto nos regimes climáticos. Em 2024,
um quarto do território nacional foi destruído pelo fogo, uma área equivalente
à soma dos estados do Pará e do Mato Grosso. Segundo a primeira edição
do Relatório Anual do Fogo, do MapBiomas, 30 milhões de hectares foram
afetados, ou seja, 62% acima da média histórica, iniciada em 1985, de 18,5
milhões de hectares por ano.
Em julho do ano passado, o presidente Lula
sancionou a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (Lei nº
14.944/2024), que em 31 de julho completa um ano. A proposta, construída no
governo de Michel Temer, permaneceu adormecida nos escaninhos do Congresso e
mostrou-se evidente diante dos incêndios florestais de grandes proporções
ocorridos no ano passado, a pior temporada de queimadas em sete décadas.
A política de manejo do fogo tem relação com
o aumento do número de brigadistas florestais que atuam com orientação do Corpo
de Bombeiros neste ano. Em maio último, por meio da Portaria nº 60, o Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) autorizou o Centro
Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) a contratar
2.227 brigadistas para atuarem em 17 unidades da Federação, onde as queimadas
são mais recorrentes. Esse quantitativo deverá ser elevado por meio de
iniciativas dos governos estaduais, a fim de conter tragédias semelhantes às do
ano passado.
Diferentemente de 2024, no primeiro semestre
de 2025, foi registrada uma queda de 65,8% nas áreas queimadas na comparação
com igual período do ano passado. Entre janeiro e junho, foi queimado 1 milhão
de hectares, contra os 3,1 milhões em igual período de 2024, segundo o
Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima (MMA), com base nos dados do
Laboratório de Aplicações de Satélites Ambiental (Lasa) da Universidade Federal
do Rio de Janeiro.
O Pantanal Mato-Grossense foi um dos mais
afetados pelo fogo, em 2024, com a perda de 93% da vegetação nativa, sobretudo
as formações campestres e campos alagados. Em algumas partes, os incêndios se
repetiram. No total, foram queimados mais de 100 mil hectares, o que
representou um aumento de 157% de área afetada pelo fogo. Nos primeiros seis
meses deste ano, houve uma queda de 97,9% das queimadas.
Como sempre, a Amazônia e o Cerrado seguem
como alvo predileto dos incendiários. A maior floresta tropical do planeta teve
cerca de 15,6 milhões de hectares destruídos pelo fogo, em 2024, o que equivale
a 117% a mais do que média histórica. Mas não só isso, o relatório do MapBiomas
revela que ocorreu uma inversão nas queimadas entre as florestas e as áreas de
pastagem. Dessa vez, o fogo atingiu 6,7 milhões de hectares (43% do bioma) de
florestas, e 5,2 milhões (33,7%) de hectares de pastagem, fugindo do modelo
recorrente. O Cerrado teve 10,6 milhões de hectares queimados no ano passado,
um aumento de 10% em comparação com a média histórica de 9,6 milhões de
hectares/ano.
Não bastam recursos financeiros para fortalecer e capacitar brigadistas no manejo do fogo e no combate dos incêndios nas florestas. A política de manejo do fogo tem de ser cumprida como determina a lei. Não à toa, o debate sobre as mudanças climáticas estão na pauta mundial e chegam ao país, por meio da COP30. Evitar o avanço do aquecimento do planeta é responsabilidade humana para estender a vida do planeta e de todos os seres que nele habitam.
Estados Unidos quer investigar negócios no
Brasil
O Povo (CE)
Com essas medidas, o presidente americano,
Donald Trump, tenta justificar que o problema com o Brasil não é político,
porém econômico, mas o truque tornou-se muito evidente
Em mais um ataque ao País — depois da
imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros —, os Estados Unidos se
deram o direito de abrir uma investigação sobre práticas comerciais do
Brasil. Segundo o representante de Comércio dos EUA, Jamieson Greer, o processo
visará condutas consideradas "desleais" no comércio.
Logo, é de se adiantar que o critério de
injustiça do governo americano é bastante tortuoso e criado sob medida
para chantagear outros países. O presidente Donald Trump, por
exemplo, diz que o ex-presidente Jair Bolsonaro está sofrendo uma "caça às
bruxas". Mas, na realidade, ele está submetido ao devido processo legal,
respondendo pelos crimes pelos quais foi denunciado pelo Ministério Público
Federal, com a garantia de amplo direito de defesa.
Não é de se esperar, portanto, coerência
dessa nova investida de Washington para investigar o comércio no
Brasil. A iniciativa vai muito além da economia, com a pretensão de interferir,
novamente, em assuntos internos, que dizem respeito unicamente ao Brasil, como
o julgamento de Bolsonaro.
Trump trava uma guerra comercial, com fortes
tinturas políticas, com praticamente todos os parceiros de negócios dos Estados
Unidos, aplicando tarifas exorbitantes em produtos importados. Entre seus
objetivos declarados está a "reindustrialização" dos Estados Unidos,
forçando empresas americanas a voltarem a se instalar no país.
O presidente americano ainda age para demolir
os organismos multilaterais e ataca qualquer iniciativa que, na visão dele,
represente uma ameaça à prevalência dos EUA no mundo, como é o caso
do Brics.
Agora, Trump lança mão de uma nova arma,
nessa espécie de reconfigurada guerra fria, movida contra o Brasil. Nas
palavras do representante dos EUA, Jamieson Greer, a investigação vai
avaliar se é "insensato ou discriminatório e onera ou restringe" os
negócios dos Estados Unidos, quanto ao comércio digital, serviços de pagamento
eletrônico, empresas de mídia social, entre outros setores.
Até a rua 25 de Março, em São Paulo,
conhecido polo de comércio popular, foi listada como prejudicial aos interesses
americanos. Segundo os EUA, o local seria um centro de vendas de produtos
falsificados, sem a proteção de direitos de propriedade intelectual. A questão
é que ruas desse tipo existem em praticamente todas as grandes cidades do
mundo, com as mesmas características e problemas, inclusive em Nova York.
O pix, sistema de pagamento que atinge a
marca de mais de 200 milhões de transações por dia, também entrou na
mira de Trump, muito possivelmente por ser gratuito e, por isso, seria uma
"concorrência desleal" com os bancos.
Com essas medidas, Trump tenta justificar que
o problema com o Brasil não é político, porém econômico, mas o truque
tornou-se muito evidente.
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