Valor Econômico
Orçamento deixa pouca margem de manobra para responder a emergências
Medida das mais aguardadas pelas indústrias
atingidas pelo tarifaço, o aumento da alíquota do Reintegra de 0,1% para 3,1%
entrou e saiu do Plano Brasil Soberano várias vezes na reta final de fechamento
do pacote. “No fim, foi reintegrado”, brincou um membro do governo.
Mas, para isso, foi preciso pedir ao
Congresso Nacional uma dispensa em relação às regras fiscais, o que mostra o difícil
convívio do governo com um Orçamento que deixa pouca margem de manobra para
responder a emergências.
O Reintegra dá um crédito tributário às empresas exportadoras, para compensar resíduos de impostos que ficam no preço da mercadoria. Era de 0,1%.
Como antecipado neste espaço, havia uma
discussão sobre elevar a alíquota para 3% para as médias empresas, como um
reforço a elas frente ao tarifaço. A medida não só se concretizou, como foi
ampliada, abarcando também as grandes. Além disso, o Reintegra para micro e
pequenas, que já estava em 3%, chegará a 6%.
Essa bondade tem um custo, que foi limitado a
R$ 5 bilhões em 2025 e 2026. A equipe econômica não viu como compatibilizá-la
com as metas de resultado das contas públicas, por isso, propôs tratá-la fora
das regras fiscais. O pedido de dispensa se estende aos R$ 4,5 bilhões em
aportes que serão feitos em fundos garantidores de crédito aos exportadores.
Até a véspera do anúncio das medidas, o plano
era outro: o Reintegra não seria aumentado num primeiro momento e os aportes
nos fundos caberiam nas projeções de receitas e despesas do ano. Tanto era
assim que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que não haveria pedido
de “waiver”. Mas houve.
A mudança ocorreu nas poucas horas passadas
entre a declaração de Haddad e a cerimônia de anúncio do plano no Palácio do
Planalto, contou o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario
Durigan. Segundo informou, na última hora o governo chegou a um consenso quanto
à importância de elevar as alíquotas do Reintegra de imediato.
O tratamento do pacote fora das regras
fiscais dividiu os holofotes com as próprias medidas de apoio às empresas
prejudicadas pela tarifa de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump.
O impacto fiscal desse conjunto será pequeno,
avaliaram especialistas. O problema é que, segundo disse Haddad no lançamento
do plano, medidas adicionais poderão ser adotadas.
Caso isso ocorra, será num cenário difícil
para as contas públicas. Em julho, o Relatório de Avaliação de Receitas e
Despesas Primárias (RARDP), mais conhecido como “bimestral”, trouxe uma
projeção de déficit de R$ 74,9 bilhões. Apesar do rombo bilionário, o número
indicava o cumprimento da meta de déficit zero, por causa dos descontos de
gastos com precatórios e da margem de tolerância de R$ 31 bilhões na meta.
Agora, o déficit poderá chegar a R$ 89,1
bilhões e a meta zero terá sido formalmente cumprida. Se o modelo de adotar
medidas fora das regras fiscais for repetido, o quadro pode piorar. Porém,
seria muito difícil acomodar mais medidas dentro do Orçamento e das metas do
arcabouço.
“Para termos capacidade de propor pacotes
que, de fato, tragam esse alívio e expressem essa soberania nacional, será
preciso olhar para o que já está na mesa e gerar espaços e alívios ali”, disse
à coluna o secretário de Monitoramento, Avaliação de Políticas Públicas e
Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, Wesley Matheus de Oliveira.
“Se não, não conseguiremos ser soberanos quando precisarmos.”
A pasta do Planejamento divulgou ontem o
Orçamento de Subsídios da União (OSU) com dados de 2024. Mostra que a conta dos
subsídios tributários, que são isenções e descontos em impostos e
contribuições, subiu a 4,8% do Produto Interno Bruto (PIB). A Constituição diz
que deveriam ser reduzidos a 2% do PIB.
Nesse bolo, explicou o secretário, estão
benefícios fiscais que foram importantes na época em que foram criados, mas
hoje já perderam o sentido. A eliminação deles abriria espaço para, por
exemplo, mais medidas do tipo do Reintegra como resposta ao tarifaço.
Os benefícios tributários criados em resposta
a crises também deveriam ser limitados no tempo, além de observar metas,
defendeu.
O tarifaço não é a única emergência com a
qual o governo precisa lidar. “Em emergência climática, temos que ter
capacidade de resposta”, disse. “O problema é que hoje estamos muito
alavancados e, se precisarmos responder a novas crises, teremos dificuldade.”
O secretário destacou duas propostas de
redução de gastos tributários que tramitam no Congresso Nacional: um de autoria
do senador Esperidião Amin (PP-SC) e outro, do deputado Mauro Benevides
(PDT-CE). O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), defende a redução
de gastos tributários como compensação ao aumento da isenção do Imposto de
Renda da Pessoa Física (IRPF) para R$ 5 mil.
Mas é difícil acreditar, a essa altura do
calendário eleitoral, que o Congresso vá avançar de forma significativa nessa
agenda.
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