Folha de S. Paulo
Hugo Mota, presidente da Casa, não atuou com
o vigor necessário contra bolsonaristas que fazem chantagem parlamentar
Achei o Hugo Motta bem frouxo.
A resposta adequada da Presidência da Câmara à tomada da
Mesa por parlamentares bolsonaristas teria sido mandar a
polícia legislativa retirar os insurrectos do local, recorrendo à força se
necessário. Se há alguém que não pode reclamar de autoridades usarem o poder de
polícia para fazer cumprir a lei é justamente um deputado bolsonarista —ou
estariam legitimadas todas as ações do MST.
Congressistas podem valer-se de todas as medidas regimentais para obstruir trabalhos do Parlamento, mas apenas das regimentais. Não podem impedir fisicamente o presidente da Casa de sentar-se em sua cadeira. Isso não é só jogo feio, é falta mesmo. Motta precisaria remeter os casos dos deputados amotinados ao Conselho de Ética, para decidir se a falta é para cartão vermelho.
Um leitor esquerdista pode ficar tentado a
concluir que invasões de Mesa são uma tática da extrema direita que precisa ser
extirpada "incontinenti". Nesse caso, vale lembrar que parlamentares
do chamado campo progressista recorreram ao
mesmíssimo expediente em 2017 para tentar impedir a votação
da reforma
trabalhista.
Os paralelos incômodos não acabam aí.
Bolsonaristas hoje se queixam de que o poder de pautar projetos de lei
(anistia) e de iniciar processos de impeachment (o de Moraes) esteja
concentrado nas mãos de autoridades individuais (os presidentes da Câmara e
do Senado).
Eles se esquecem de que foi esse tipo de arquitetura institucional que protegeu
Bolsonaro de processos penais (sob Aras) e de mais de uma centena de pedidos de
impeachment (sob Lira).
É da natureza humana recorrermos, quando nos
interessa, a expedientes que antes condenávamos e perdermos providencialmente a
memória para evitar sermos confrontados com nossas contradições. A democracia
tenta lidar com essa inconsistência humana estabelecendo regras abstratas
prévias que precisariam ser sempre seguidas por todos.
Já não foi assim, mas, hoje, é muito mais a
direita do que a esquerda que sabota o arranjo democrático.
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