O Globo
Em cruzada contra "ideologia
imprópria", republicano busca reescrever história dos EUA
Deu no Wall Street Journal: a Casa Branca
quer obrigar os museus americanos a se
alinharem às ideias de Donald Trump.
A ofensiva começou pela Smithsonian
Institution. A entidade recebeu ordens para exaltar os “ideais americanos” e
eliminar o que o governo classifica como “narrativas divisivas ou partidárias”.
A diretriz vale para exposições, materiais educativos e publicações na
internet.
Em março, Trump já havia editado decreto para enquadrar os museus de Washington. Determinou a remoção do que chamou de “ideologia imprópria”, além do cancelamento de mostras que, na visão dele, “degradem os valores” do país. O republicano manifestou o desejo de banir qualquer referência que “deprecie inapropriadamente os americanos do passado” — especialmente os fazendeiros escravocratas. Quer reescrever a história do país omitindo conflitos de classe e questões de raça e de gênero.
Trump não inventou a roda. “Uma lição que o
século passado nos ensinou é que, frequentemente, os regimes autoritários
consideram a história uma grande ameaça”, afirma Jason Stanley em “Apagando a
história: como os fascistas reescrevem o passado para controlar o futuro”.
Recém-lançado no Brasil, o livro foi escrito antes da nova posse do republicano.
Mas já delineava seus planos para sufocar o pensamento crítico e os movimentos
que questionam o status quo.
Professor de filosofia na Universidade de
Toronto, Stanley mostra como os autocratas usam o ensino para demonizar
dissidentes e vender o mito de um passado glorioso. A história é contada como
uma obra de heróis emoldurados, livres de conflitos ou contradições. Quem
questiona a pregação nacionalista é tachado de subversivo — o que leva o autor
a comparar os dias de hoje com o período do macartismo, na década de 1950.
“Estamos incontestavelmente voltando a algo
parecido com a era da ameaça vermelha. Políticos e ativistas de direita estão
mirando educadores em todos os níveis de ensino por suas supostas ideologias de
esquerda, com o objetivo de eliminar qualquer ensino que questione a hierarquia
racial ou o patriarcado”, anota Stanley, autor do best-seller “Como funciona o
fascismo”, de 2018.
O obscurantismo não campeia só nos Estados
Unidos. Na Hungria de Viktor Orbán e na Turquia de Recep Erdogan, o poder
também fecha o cerco sobre a educação. O premiê húngaro forçou a Universidade
Centro-Europeia a se mudar para a Áustria. O presidente turco ordenou a revisão
de livros didáticos e baniu a teoria da evolução do currículo do ensino médio.
“Faz muito tempo que os autoritários entenderam que, quando querem mudar a
cultura política, precisam começar tomando o controle da educação”, escreve
Stanley.
Antes da cruzada contra os museus, Trump
atacou as universidades, ameaçadas de asfixia econômica se não reprimissem
protestos contra o governo de Israel e encerrassem programas de diversidade e
inclusão. Neto de judeus que fugiram da Alemanha nazista, Stanley farejou o
perigo e não quis pagar para ver. Em abril, deixou a cátedra em Yale, cruzou a
fronteira e foi trabalhar no Canadá.
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