sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Condenação de Bolsonaro é marco da história republicana. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Centrão volta a articular anistia. Para o Executivo, a prioridade é evitar um "perdão legislativo" que desautorize o Supremo e comprometa a governabilidade

A condenação de Jair Bolsonaro pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) já projeta seus efeitos jurídicos, políticos e diplomáticos. Pela primeira vez na história do Brasil, um ex-presidente e quatro oficiais da mais alta patente — três generais e um almirante — são condenados por tentativa de golpe de Estado. Bolsonaro recebeu a pena de 27 anos e três meses no julgamento da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.

As razões históricas são conhecidas. Desde a Proclamação da República, fruto de um golpe militar, o Brasil viveu dois longos períodos ditatoriais, após a Revolução de 1930 e o golpe de 1964, ambos precedidos por várias tentativas de golpe de Estado. Sucessivas anistias permitiram que os conspiradores obtivessem êxito nos dois casos.

A pena contra Bolsonaro é duríssima: dos 27 anos e três meses, 24 anos e nove meses são de reclusão (ou seja, pena para crimes que preveem regime fechado). E dois anos e seis meses de detenção (pena para crimes de regime semiaberto ou aberto). Como a pena total é superior a oito anos, Bolsonaro terá de começar a cumpri-la em regime fechado.

Depois do longo voto divergente do ministro Luiz Fux, na quarta-feira, que encampou as principais teses das defesas de Bolsonaro e demais réus, houve, ontem, uma aceleração do julgamento, a partir dos votos da ministra Cármen Lúcia, decana da Turma, e do seu presidente, ministro Cristiano Zanin. Passou-se imediatamente à definição da dosimetria das penas e à proclamação do resultado do julgamento, que deveriam ocorrer hoje.

Todos os demais réus da ação penal foram condenados a penas duríssimas, com exceção do tenente-coronel Mauro Cid, que fez delação premiada: foi condenado a dois anos de prisão em regime aberto. Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a 16 anos, um mês e 15 dias de prisão; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, a 24 anos de prisão; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal, a 24 anos de prisão; Augusto Heleno, a 21 anos; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, a 19 anos; e Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil, a 26 anos, sendo 24 anos de reclusão (pena para crimes de regime fechado) e dois anos de detenção (pena para crimes de regime semiaberto ou aberto), a segunda maior punição.

Quem imagina que se trata de assunto resolvido, porém, deve pôr as barbas de molho. Esse curto período entre o julgamento e a execução da pena abre uma janela para a retomada das articulações para aprovação de uma anistia pelo Congresso, embora todos os atores políticos saibam que seria inconstitucional, pois o Parlamento não é uma casa revisora das decisões do Supremo.

Reação política

O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcanti (RJ), diz ter apoio para pautar uma anistia ampla com adesão de segmentos do Centrão. Na próxima semana, as pressões para obrigar o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), a pôr o projeto em votação, recrudescerão. A palavra de ordem é "pacificação", mas o alvo é reorganizar a base para 2026, mirando o apoio do ex-presidente, que está inelegível, à candidatura de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) à Presidência. O governador de São Paulo já anunciou a ida ao Congresso na próxima semana, para articular a aprovação da anistia.

Tarcísio também sabe que a anistia é inconstitucional, mas, ao mesmo tempo, será uma bandeira eleitoral para mobilizar o apoio dos aliados de Bolsonaro. Não foi à toa que prometeu indulto ao ex-presidente como "primeiro ato" de seu eventual governo.

presidente Luiz Inácio Lula da Silva também se deu conta que está em curso um cerco eleitoral, unidos os partidos de extrema-direita e setores conservadores, a partir de um arranjo eleitoral em São Paulo, no qual o prefeito Ricardo Nunes (MDB) disputaria o Palácio dos Bandeirantes e o clã Bolsonaro herdaria a prefeitura da capital, por meio do vice-prefeito Mello Araujo, um coronel bolsonarista da Polícia Militar paulista.

A linha de defesa do governo contra a anistia está organizada no Senado, cujo presidente, Davi Alcolumbre (União-AP), articula um projeto de redução das penas sem apagar as responsabilidades. Se prevalecer, esvaziaria a anistia geral. Se fracassar, a Câmara pode impor uma versão maximalista e tensionar a separação de Poderes, abrindo uma crise de natureza institucional. O vetor de maior ou menor adesão à anistia é orçamentário e eleitoral.

O Centrão negocia espaço no Orçamento, posições eleitorais e uma narrativa moderada. Para o Executivo, a prioridade é evitar um "perdão legislativo" que desautorize o STF e comprometa a governabilidade. No plano jurídico, a dosimetria ganha centralidade como sinal de firmeza diante das pressões do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Entretanto, as penas duríssimas reforçam o apelo emocional do perdão.

No tabuleiro diplomático, a Casa Branca aumentará a pressão econômica e na opinião pública. A condenação reacendeu holofotes em Washington. Com a retórica de perseguição, Trump voltou a sair em defesa de Bolsonaro e já anunciou que haverá novas retaliações.

 

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