quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Fux sacudiu o Supremo. Por William Waack

O Estado de S. Paulo

Voto no julgamento de Bolsonaro expõe a questão de legitimidade da Corte

Não se pode cometer crimes para combater crimes. Com essa famosa frase justificou-se no Supremo a anulação da Lava Jato. Os ecos dessa mesma frase voltaram para assombrar o mesmo Supremo.

Vieram pela boca do ministro Luiz Fux, no julgamento de Bolsonaro que, segundo ele, nem sequer deveria ser matéria para o Supremo. Em outras palavras, o julgamento tem um vício de origem que já está sendo amplamente explorado pelos réus e seus movimentos políticos.

Fux fez mais do que estragar uma festa da “lição de democracia” pelo julgamento de Bolsonaro. Arrebentou a imagem da própria instituição com a afirmação de que “papel do julgador não pode ser confundido com ator político”.

O problema na divergência aberta por ele na Primeira Turma não é apenas a meritória discussão jurídica sobre provas, cerceamento ou não da defesa, normas internas do STF (no caso de turma ou plenário) e entendimento de foro privilegiado. Involuntariamente ou não, o que Fux levantou foi o papel político que o STF assumiu.

Ele expôs uma rachadura perigosa para a instituição, que já teve embates violentos entre seus integrantes (por exemplo, no mensalão). A diferença fundamental em relação ao episódio de 20 anos atrás é o fato de o STF ser visto hoje por parcela substancial da sociedade como parte do embate político, não como instituição que apenas cumpre seu papel constitucional.

A rachadura é séria, pois não se registrou nada parecido quando o Supremo assumiu, na prática, o papel de “ministro da Saúde” informal durante o governo Bolsonaro, por exemplo. Ou quando seus integrantes, por meio de conversas coordenadas, se mobilizaram para colocar freios institucionais no próprio Bolsonaro.

O “pecado original” desta vez não está apenas na gradativa transformação do STF em mais uma instância da política brasileira. Refletindo o que ocorre em outros setores, também a Corte perdeu figuras de projeção e liderança – ou as que ainda existem internamente perderam a capacidade de “dirigir” informalmente a conduta do conjunto.

Perdeu-se o controle sobre um de seus principais integrantes, o ministro Alexandre de Moraes, cuja conduta já vinha causando sensível irritação entre alguns dos colegas. Isso viria à tona mais cedo ou mais tarde, mas explodiu com virulência num momento de circunstâncias particularmente difíceis.

Elas são a brutal pressão política da Casa Branca sobre o Brasil, exatamente pela atuação do STF, e a articulação de anistia que é uma afronta declarada à própria Corte. A questão de legitimidade do STF é o problema que o voto de Fux levantou. 

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