Folha de S. Paulo
Impostos maiores não explicam queda de vendas
para os Estados Unidos no mês
Causou alarde que o valor das exportações
para os Estados
Unidos tenha caído 18,5%
em agosto de 2025, ante agosto de 2024, primeiro mês quase inteiro
de vigência do tarifaço de Donald Trump.
Hum. Vai ser ruim, claro, vai ter perda de faturamento, demissão. Mas o assunto
é mais enrolado.
Há desde estimativas de queda de US$ 10 bilhões a US$ 15 bilhões, em um ano, no valor total de US$ 40 bilhões de exportações para os EUA. Mas um mês e um mercado apenas não ajudam a pensar o problema.
Primeiro, o equivalente a 43% dessa queda do valor de exportações para os EUA veio de vendas menores de "aeronaves e outros equipamentos, incluindo suas partes" e "óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos", produtos que escaparam do tarifaço.
"Equivalente" não quer dizer
"causa", mas deu para ter ideia do que se passa. De resto, incertezas
podem ter prejudicado o comércio de produtos que não levaram o tiro do tarifaço
na testa.
Segundo, considere-se o caso das vendas
brasileiras para o mundo, EUA inclusive, dos produtos que entraram na lista do
tarifaço. Quanto à "carne bovina
fresca, refrigerada ou congelada", o valor de vendas passou de US$ 954,3
milhões em agosto de 2024 para US$ 1,5 bilhão em agosto de 2025, aumento de
56%, explicado por crescimento de 23,5% na quantidade exportada e de 26,3% no
preço dos produtos.
No que diz respeito ao "café não
torrado", houve aumento de 1,1% no valor de vendas. Safou-se? Não. A
quantidade exportada caiu 31%, o que já pode ser efeito da pancada trumpiana,
em parte compensada pelo aumento de preço do produto.
Mesmo no caso do "mel natural",
muito afetado pelo tarifaço, houve aumento de 48,5% do valor exportado, que é
relativamente pequeno, US$ 12,1 milhões.
Em agosto, o valor das vendas para o Canadá
caiu 10,7%. Para o Oriente Médio, 20,9%. Para a União Europeia, com quem
estamos à beira de assinar acordo de comércio, 11,9%. Tarifaço?
Deu para perceber que o problema é mais
enrolado.
Muito empresário, industrial em particular,
diz que o valor de vendas vai despencar a partir de setembro. Pode ser também
que algum produto brasileiro muito mais caro seja aceito por empresas e
consumidores dos EUA.
É preciso ponderar que exportações dependem
também do ritmo de crescimento das economias —a Argentina voltou a comprar mais
do Brasil porque saiu do fundo do buraco recessivo e por causa da taxa de
câmbio (mas pode ir à breca até 2026).
Muito importante, é preciso analisar a
reconfiguração do comércio mundial, de mercados além dos EUA —pode aparecer
oportunidade ou mais dificuldade. Produtos americanos podem tomar lugar dos
brasileiros em países que se abriram sob a ameaça do porrete de Trump.
Isto é, perderíamos clientes não por efeito
direto do tarifaço. Um caso de risco é o da soja. Não se pode descartar a
hipótese de que um acordo envolva a venda de mais soja americana para a China.
Boas empresas, das melhores, serão
prejudicadas, firmas que têm bons produtos, bom preço, organizadas o bastante
para vender seu peixe lá fora, o que é difícil. Sim, o comércio vai padecer por
causa da agressão de Trump-Bolsonaro, que ainda pode piorar, afetando bancos,
finança e investimento
E daí? Temos de repensar política e promoção comercial de modo muito mais amplo, temos de repensar política econômica, diplomacia e o que fazer de sabotadores golpistas do país. O desgosto de agosto pode ser fichinha.
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